SEM REFERENCIAIS NÃO VIVEMOS, APENAS SOBREVIVEMOS

Pe. José Neto de França

Enquanto a vida, o tempo corre no existir de cada ser do gênero humano, naturalmente como já é praxe no universo inteiro, tudo tende a harmonizar-se, isso inclui, claro, o psicológico e o intelecto humano.

Como observador, fustigador de tudo que me cerca e, também, diz respeito a mim, tenho observado essa dinâmica.

Para ajudar nessa harmonização em relação a nós mesmos e ao mundo, necessitamos de referências que pode ser física/temporais ou mística.

Sacerdote que sou, minha referência primeira é Deus! Não poderia ser outro, creio que isso seja, também, para cada pessoa que afirme crer/confiar em Deus!

Mas, em função de nossas fragilidades nas diversas dimensões de nossa vida, necessitamos das chamadas referências temporais – família (membros), amigos, metas... – hierarquizadas segundo cada pessoa.

Em relação a essa, questão, desde cedo vi-me refém dela. Aqui quero me referir as referências humanas.

Nesse caso, desde a mais tenra idade tive meus pais como primeira referência humana. Eu só me sentia à vontade quando estava próximo deles. Com o óbito de papai em 1999, tive um grande choque existencial, mas a presença de minha mãe supriu a ausência dele.

Quanto às referências humanas secundárias, elas foram variando de acordo com o tempo e as “perdas”. A cada perda eu era acometido de uma grande “solidão”, mas sempre superei.

Acontece que o tempo avança à revelia de nossa vontade. E com ele essas referências vão nos precedendo na sua viagem para o eterno, ou mesmo por razões diversas ou adversas, vão ficando para trás.

Interessante que de acordo com o individual de cada uma, essas referências estão ligadas a determinados espaços físicos.

No meu caso. Na infância e adolescência eu “rezava” para que chegasse o final de semana para eu ir passá-la na casa dos meus tios ou no Serrote dos Bois, ou no Serrote dos Franças. Não sei por qual razão, talvez faça parte dos enigmas da vida, entre meus descendentes anteriores a meus pais, não existiram nenhum referencial. Nem meus avós paterno-materno (não cheguei a conhecer minha avó paterna, pois ela falecera onze anos antes de meu nascimento). Mesmo meu avô paterno, do qual herdei algumas características. Amei/amo a todos.

Era uma “penca” de tios. Amava como amo até hoje todos eles. Porém, no Serrote dos Bois, minha referência era tia Donalva e tio Antônio. Já no Serrote dos Franças, era tio Marinho e tia Sebastiana. Isso incluía todos os seus filhos e filhas (meus primos e primas).

De pouco a pouco, com exceção de tio Luiz (hoje residindo em Santana do Ipanema), irmão de meu pai; e tia Irene (em Rio Brilhante, Mato Grosso do Sul), irmã de minha mãe, todos os outros partiram para o eterno! Esses foram “escolhidos” para “fecharem a porteira”, no momento oportuno.

No Serrote dos Bois perdi totalmente o interesse; no Serrote dos Franças, transferi meu referencial para uma grande amiga, também parente, Maria de Tobias. Acontece que, como os outros, ela também se foi. Mais uma vez, consegui transferir esse referencial para duas primas, Luzia e Gleide e um grande amigo, também parente que o considero como filho do coração, Romeu. É o que ainda me motiva para visitar aquela localidade.

Recentemente, 08 de setembro de 2022, minha mãe se foi. Ainda não absorvi direito essa “perda”. Meu saudosismo em relação a ela é diferente do que senti por meu pai. Por incrível que pareça é menos intensa. Talvez pelo fato de que Deus tenha me dado a oportunidade de ter acompanhado mais de perto seu calvário até sua Páscoa definitiva. E isso me deu uma imensa satisfação de dever cumprido.

Mamãe se foi, mas a sua casa permanece! Meu referencial agora, na cidade de Santana do Ipanema onde mamãe viveu por muitos anos são as minhas irmãs Salete, Geruza e Salomé e meus irmãos Marcelo e Marquinho. Já em Maceió, minhas irmãs Darcy e Ana. Em São Paulo, minhas irmãs Ângela e Auta e no Rio de Janeiro, Alonsinho.

Fora dos laços familiares tenho vários referenciais nas cidades de Santana do Ipanema, Minador do Negrão, Cacimbinhas, Palmeira dos Índios, Major Izidoro, Jaramataia, Arapiraca, Maceió, Rio de Janeiro e São Paulo e, fora do Brasil, na Itália. Não convém citá-los aqui, pois são muitos.

É uma sensação estranha, não ter mais os pais fisicamente na vida temporal. Ao mesmo tempo, como encaro a saudade como um sentimento que tempera a alma, isso me fortalece para que eu leve meu resto te tempo, motivado para superar todos e quaisquer obstáculos.

É certo que sem referenciais, não vivemos, apenas sobrevivemos.

Enigmas da vida!!!

[Pe. José Neto de França]

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