HERANÇA MALDITA

Djalma Carvalho

Em bom andamento se encontra a leitura que faço do livro intitulado 1808, de autoria do jornalista e emérito pesquisador Laurentino Gomes (Editora Planeta do Brasil, 2012). As notas introdutórias pinçadas da extensa bibliografia consultada ajudam a entender os fatos históricos tratados no livro.
Sem nenhuma relação com a recente eleição para presidente do Brasil, pleito encerrado em 26 de outubro passado, o início da leitura do livro se deu, coincidentemente, em pleno ano eleitoral. Em se tratando de História, sobretudo do Brasil e de Portugal, o assunto sempre me fascina. A leitura, na verdade, tem sido vagarosa, como se estivesse eu a saborear o acessível e coloquial estilo do autor.
Carrega o sugestivo título de capa – 1808 – a seguinte chamada ou subtítulo: “Como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a História de Portugal e do Brasil.”
Ultimamente, dividindo o disponível tempo entre a leitura do livro e a olhadela na tela do monitor, observo o desespero de um amigo em enviar e-mails a mim e a outras pessoas, dando-nos conta, diariamente, de corrupção e de fraudes em órgãos do Governo Federal. Sua neurose, desde o julgamento do processo do “mensalão” e passando pelas eleições passadas, continua direcionada para dar curso a denúncias e a mensagens sem credibilidade, postas na rede social. Pela sua visível ira, o processo do “mensalão”, por exemplo, deveria assemelhar-se ao auto de fé do tempo da Inquisição espanhola, no final do século XV, que também levava os condenados à fogueira. A esta altura da vida, com definidas convicções políticas, não devo receber lavagem cerebral de ninguém. Pedi-lhe, então, que deletasse o meu favorito dos seus arquivos.
Voltando ao assunto inicial, refiro-me, especialmente, ao capítulo O Ataque ao Cofre, página 169, e leio, a propósito, o que disse o autor: “Era uma corte cara, perdulária e voraz.” O historiador John Armitage afirmou: “Um enxame de aventureiros, necessitados e sem princípios, acompanhou a família real.” E mais, segundo Nelson Werneck Sodré: “A corrupção medrava escandalosa e tanto contribuía para aumentar as despesas, como contribuía o contrabando para diminuir as rendas.”
Pois bem. No citado capítulo há o registro da ação delituosa de dois corruptos da corte, chamados Joaquim José de Azevedo e Bento Maria Targini. O primeiro administrava a área de compras da casa real e o segundo comandava o erário real. Entretanto, pasmem os leitores: às vésperas do retorno de D. João VI a Portugal, em 1821, ambos os corruptos foram promovidos de barão a visconde!
Ressalte-se que, apesar de todas esses fatos negativos, a presença, aqui, de D. João VI por 13 anos trouxe progresso ao Brasil, como: transformação da colônia em sede do império; abertura dos portos ao comércio das nações amigas; criação da primeira escola de medicina do Brasil; concessão de licença para construção de fábricas; abertura de estradas; criação do Banco do Brasil; incentivo à cultura ao trazer para o Brasil o acervo da Biblioteca Nacional de Lisboa, entre outros.
Afinal, os casos de corrupção que permearam os debates dos candidatos durante a campanha eleitoral passada confirmaram nossa herança maldita, vinda bem de longe, desde o tempo do Brasil colônia e do Brasil império, infelizmente.
Maceió, novembro de 2014.

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