Da singeleza do meu quarto eu ouvia a sinfonia de tuas águas na vertente da Serra da Micro-ondas, buscando espaços entre as pedras e areias adormecidas no teu caminho. Intimidava-me com a força da tua correnteza vazando a Barragem, descendo furiosamente num passeio único, soltando espumas que se perdiam em teu leito manhoso. As velhas craibeiras que margeavam as tuas veredas, foram sufocadas pela volúpia de tuas águas barrentas, anulando os encantos das flores amarelas para nunca mais sorrir em outra primavera.
Rio Ipanema das manhãs alegres e febris do meu torrão querido. Este rio que tantas vezes desfazendo da minha timidez o desafiava, lançando-me em tuas águas cantantes, desviando-me das panelas e fervedores que se formavam nas correntezas dos Poços dos Homens e do Juá. As pescarias e os banhos dominicais nas praias originadas de tua vazão serão lembrados para sempre em memória de ti. Ah,meu rio! Foste um herói sem a insígnia das tuas proezas, apenas sorriste nas enchentes e te recolheste ao silêncio na escassez de tuas águas.
Mesmo assim, a tua valentia foi podada pela ganância do homem, que ao longo do teu álveo construiu barreiras e vomitou imundícies em teu leito vazio e sedento. Silenciosamente, minha alma triste, chora, ao ver-te desvanecido em tua própria sepultura. As lágrimas que fluem dos meus olhos escoam em minha face como um regato de sentimentos, para juntar-se ao Oásis que sobreviveu à ignorância daqueles que não entenderam o significado de tua existência, meu Rio Ipanema.
Crônica publicada no Livro Lembranças Guardadas (SWA Instituto, 2022 p.165)
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