Outro dia necessitei enfrentar fila que nunca acabava, pois nem ao menos se movia. Ao meu redor, centenas de pessoas, cada uma com sua história, todos impacientes com a lentidão que desafiava a pressa de suas vidas. O tempo que deveria ser aliado, cada vez mais tornava-se adversário, naquele ambiente fechado que fazia doer os nervos.
Ao meu lado, pessoas que ao abrirem a boca, inundavam o espaço com termos sem nenhum conteúdo, falando incessantemente, como se a quantidade de frases pudesse substituir a profundidade do pensamento, enquanto palavras fluíam como um rio caudaloso, mas ao fim restando a sensação de vazio, de algo que não foi dito ou, se foi, perdeu-se no ar abafado.
De repente, enquanto minutos mais se arrastavam, entre murmúrios e olhares impacientes, uma voz se destacava: certo homem, com o semblante carregado, desabafava sobre recente ira que sentira por um semelhante. Suas palavras vinham enegrecidas por magoas, relatando cada detalhe minuciosamente, como se reviver a experiência fosse aliviar a alma, no entanto, mal percebia que tal agir, só a ele desgastava.
Somente espiando e ouvindo, recordei quando certa vez recebi conselho de alguém bem experiente, mostrando com exemplos, como o rancor, tal veneno sutil, envenena a paz de quem a cultiva, enquanto o outro, alvo de sua fúria, talvez sequer conheça o motivo e se soubesse, já teria seguido em frente.
Notei claramente que aquela criatura, presa em teia de ressentimento, alimentava fogo que queimava apenas dentro de si, possivelmente somente ele sofria, esquecendo que a mente carregada de emoções negativas, é a maior inimiga da própria saúde.
Nesse momento, uma voz ao microfone falou que os computadores da instituição haviam sofrido uma pane no servidor principal, e com o expediente encerrado, deixando o local, sem esquecer o descontrolado senhor, lembrei de ensinamento inesquecível: “carregar raiva é como segurar brasas, esperando que o oponente queime; o único ferido é quem as segura”.
Eu próprio nessas situações procuro respirar fundo, contar até cinco e pensar naqueles que me cativam.
SEGURAR BRASAS
CrônicasPor Alberto Rostand Lanverly Presidente da Academia Alagoana de Letras 08/12/2024 - 20h 11min
Comentários