SEGURAR BRASAS

Crônicas

Por Alberto Rostand Lanverly Presidente da Academia Alagoana de Letras

Outro dia necessitei enfrentar fila que nunca acabava, pois nem ao menos se movia. Ao meu redor, centenas de pessoas, cada uma com sua história, todos impacientes com a lentidão que desafiava a pressa de suas vidas. O tempo que deveria ser aliado, cada vez mais tornava-se adversário, naquele ambiente fechado que fazia doer os nervos.

Ao meu lado, pessoas que ao abrirem a boca, inundavam o espaço com termos sem nenhum conteúdo, falando incessantemente, como se a quantidade de frases pudesse substituir a profundidade do pensamento, enquanto palavras fluíam como um rio caudaloso, mas ao fim restando a sensação de vazio, de algo que não foi dito ou, se foi, perdeu-se no ar abafado.

De repente, enquanto minutos mais se arrastavam, entre murmúrios e olhares impacientes, uma voz se destacava: certo homem, com o semblante carregado, desabafava sobre recente ira que sentira por um semelhante. Suas palavras vinham enegrecidas por magoas, relatando cada detalhe minuciosamente, como se reviver a experiência fosse aliviar a alma, no entanto, mal percebia que tal agir, só a ele desgastava.

Somente espiando e ouvindo, recordei quando certa vez recebi conselho de alguém bem experiente, mostrando com exemplos, como o rancor, tal veneno sutil, envenena a paz de quem a cultiva, enquanto o outro, alvo de sua fúria, talvez sequer conheça o motivo e se soubesse, já teria seguido em frente.

Notei claramente que aquela criatura, presa em teia de ressentimento, alimentava fogo que queimava apenas dentro de si, possivelmente somente ele sofria, esquecendo que a mente carregada de emoções negativas, é a maior inimiga da própria saúde.

Nesse momento, uma voz ao microfone falou que os computadores da instituição haviam sofrido uma pane no servidor principal, e com o expediente encerrado, deixando o local, sem esquecer o descontrolado senhor, lembrei de ensinamento inesquecível: “carregar raiva é como segurar brasas, esperando que o oponente queime; o único ferido é quem as segura”.

Eu próprio nessas situações procuro respirar fundo, contar até cinco e pensar naqueles que me cativam.

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