Em Santana, quem não conhece
a lavadeira dona Filodoxia? Que
carrega sua vida cantando loas
lá nas margens vãs do Panema
só no vazio da hipermodernidade
seu ganha-pão soa o som d'água
Mãe D'água um chuá nas pedras
em sua erudição de bela lavadeira
e coberta de figuras de linguagem
dona Filodoxia lava engoma passa
na hipermodernidade eterno vazio
com essa sua fala de tom barroco
com esse seu velho hábito lusitano
quarando sob um léxico gongórico.
Panema tomado d'água que corre
e ela vai lavando roupas de ganho
atraída pela sensibilidade aparente
dona Filodoxia ama enlouquecida
as suas próprias opiniões ignorando
pois propositalmente todos os fatos
é porque tudo nela parece irrefletido
tudo parece se opor ao que lhe traz
e tudo isto é só amor que nela sobra
alheia à verdade à ciência à escola
passam os barqueiros pescadores
e passa o ectoplasma de canoeiros
admirando o seu labor de lavadeira
presa aos fardos de roupas alheias.
Panema botou água!
grita o povo na ponte,
e apontando câmeras,
nas redes publicando.
E só no último ano na década de sessenta,
água encanada franciscana em Santana;
ancoretas na Praça do Jegue aposentadas;
só duas décadas depois, a CNH renova-se
correndo água no Panema, água no sertão
e ao riacho Camoxinga unindo-se às águas.
E barrentas águas velozes levando
ao São Francisco um carro de boi;
veloz correnteza arrasta uma casa,
uma plantação de feijão com arroz.
(Este ronco nas águas os tamancos são
levando a velha lavadeira dona Filodoxia).
Criava um ritmo próprio
dona Filodoxia cantava
o seu canto de trabalho
E bem-te-vi viu descendo
o apogeu da ignorância
nas águas velozes no rio
Não havia como entender
não havendo coesão
cantavam as pedras o rio
Não havia como ideias reunir
respondiam as corredeiras
quando a coerência não havia
Suas personagens na leitura crítica
o rio seguia a solitária jornada
nesta estrutura narrativa das águas.
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