Por vezes, olho para mim mesmo e fico a imaginar quem fui a cada momento do itinerário de minha vida. Quem diria que eu fosse chegar a ser o que sou hoje: Sacerdote por ministério, graduando em Nutrição, Escritor...
Mergulhando na minha linha do tempo, vejo-me em situações diversas e/ou adversas que marcaram tais etapas. De nada reclamo ou lamento. Tanto porque, tudo o que aconteceu, positivo e/ou negativo, creio eu, foi parte de um contexto e foi fundamental na formação do meu caráter, definição de meus gostos, maturação do meu senso crítico...
Como num filme, vejo-me...
Pequenininho, talvez quatro, cinco anos – essa é minha lembrança mais distante – comendo tomates na horta do quintal de minha residência, em Carneiros/AL, assustado por eles estarem quentes, do calor do sol, além de agir às escondidas e, em seguida levando umas chineladas de minha mãe ao me pegar nessa reinação... No alpendre dessa mesma residência, no colo de meu pai, que está sentado numa espreguiçadeira, ouvindo ele com sua voz rouca – como a minha no tempo presente – cantando para mim: “Olê pai, ôle baiê / menininho do papai, / deu um pulo, foi ao chão, / acudiu três cavaleiros / todos três, chapéu na mão...” (nunca esqueci da letra dessa estrofe e a melodia)...
Criança, caçando passarinhos, com um estilingue; explorando a vegetação que havia em volta da primeira casa que residi em Santana do Ipanema, no Bairro da Floresta...
Entre cinco e seis anos, vivendo a primeira experiência paranormal que marcaria profundamente todo meu ser. Um gatilho para que outras acontecessem até o momento presente...
Nas minhas primeiras incursões ao Rio Ipanema. Em pânico”, atravessando, de canoa, esse rio, único meio de transporte no período das homéricas cheias... os passageiros, inclusive eu, mesmo pequenininho retirando a água de dentro da canoa (essa com muitos furos) e devolvendo-a ao rio, caso contrário, fatalmente, canoa vai afundar... o canoeiro, seu Domingos, visivelmente alcoolizado... Só Jesus na causa... Naquele tempo não era levado a sério a questão da segurança...
Escorregando de uma grande pedra à margem do rio Ipanema, ao lançar uma rede de pesca na água... o medo de afogamento levando-me a aprender a nadar... aprendi nesse dia.
Franzino, entre sete e nove anos sendo sequestrado (sequestro relâmpago) e, sob a mira de um canivete riscando minha garganta e peito, ouvindo meu algoz dizer que iria me sangrar e beber meu sangue... do nada, pela providência divina, sendo salvo, em seguida... meu algoz tomando o que eu tinha em mãos e me ordenando correr sem olhar para trás...
Indo para casa de meus avós e tios, hoje a maioria na eternidade; brincando de “ximbra”, dominó, esconde-esconde com meus primos e primas e inventando outras brincadeiras como pegar “catengas” nas paredes das casas velhas, com um laço feito a partir de palhas de coqueiros...
Jogando bola com amigos e primos nas areias do Rio Ipanema ou nas propriedades de meus tios e tias...
Resenhando ou fazendo minhas traquinagens de criança e adolescência junto a tantos familiares, parentes e amigos...
No meu período escolar no Grupo Pe. Francisco Correia e no Ginásio Santana, hoje Colégio Cenecista... Estudo sério, resenhas...
Trabalhando, de engraxate, vendedor de picolés, frutas/cocadas de porta em porta, carroçando, ajudante em um bar, sendo balconista na casa “O Ferrageiro”. Tudo para suprir minhas necessidades e, também, ajudar a minha família... e olha que isso nunca atrapalhou meus estudos...
Assistindo a vários filmes, shows com cantores de renomes como Jerry Adriani, Sérgio Reis, Evaldo Braga ou os shows de calouros no “Cine Alvorada”, um dos melhores “pontos de encontro” de Santana (hoje destruído) ... Admirando-me ao ver aquelas pinturas nas paredes internas, as músicas tocando antes das exibições, aquele cortinado se abrindo para o início das projeções...
Coroinha da paróquia de São Cristóvão, viajando, de jipe, com o “Pe. Alberto” para as missas e visitas às comunidades...
Alegrando-me e me decepcionando com amigos (a)...
Descobrindo não ser mais um menino...
Preparando-me para a primeira grande mudança de minha vida: minha ida para a capital paulista... Com o coração dilacerado, saindo de Santana, o “corte” do “cordão existencial” com meus pais...
Chegando à São Paulo, a conquistando novas amizades... nos acertos/desacertos, adaptando-me a nova realidade vivida... no meu primeiro trabalho com carteira assinada, na Padaria Buturussú... no Banco Econômico tratando meus/minhas colegas de trabalho como minha própria família... cursando o ensino médio e a universidade...
Ainda no sul do Brasil, viajando para a casa de minha irmã, Auta, tanto ao Paraná, quanto ao interior paulista...
Fazendo minha primeira viagem internacional, à Assunção no Paraguay, aproveitando uma carona com meu cunhado, Benedito.
Viajando a Alagoas nos meus períodos de férias... Muitas aventuras...
Em meio às minhas primeiras paixões que acabaram se esvaindo como palha ao vento...
Em crise existencial, deixando tudo que consegui para trás e tomando a decisão sobre o que sempre me instigou e até então eu tinha fugido: a vocação sacerdotal...
Já em Alagoas, no meu período de formação filosófica e teológica no Seminário Arquidiocesano Nossa Senhora de Assunção, em Maceió...
Diante do maior milagre que já recebi da parte de Deus: sendo curado, diante do Santíssimo Sacramento, de um edema agudo pulmonar.
Escapando de um acidente que poderia ter sido fatal, caindo de uma ponte e capotando várias vezes, enquanto dirigia uma Kombi.
Imensamente feliz ´sendo ordenado Diácono, na Igreja da Imaculada Conceição, de Carneiros/AL e Sacerdote no Ginásio de Esportes Cônego Luiz Cirilo Silva, em Santana do Ipanema...
Nos primeiros meses de sacerdócio colaborando com o Pe José Augusto enquanto aguardava minha primeira paróquia...
Como primeiro pároco de Cacimbinhas e Minador do Negrão... em vários momentos da vida pastoral, fazendo o que mais gosto de fazer: celebrar a Santa Missa... acolhendo Frei Damião e Frei Fernando em minha paróquia naquela que seria a penúltima missão da vida temporal de Frei Damião... escapando de mais um acidente automobilístico, onde o carro sofreu perda total e meu acompanhante e eu saímos sem um só arranhão... envolvido nas grandes construções e reformas que fiz em Cacimbinhas e Minador do Negrão... confraternizando-me com as grandes amizades que construí nessa minha primeira paróquia... imerso na maior tristeza que já senti, que foi a perda temporal de meu pai, falecido aos 15 de abril de 1999... planejando e viajando à Itália, participando lá, de um Curso Internacional para Formadores de Seminários Diocesanos... De coração partido tendo que me despedir, temporalmente, de pessoas amigas... enfrentando poderosos, contando somente com a ajuda divina... arriscando a própria vida para ser fiel a Jesus Cristo e a Igreja... escapando de um atentado na AL 316, no trecho entre Mata Burro e Minador do Lúcio... Fazendo grandes e duradouras amizades...
Deixando Cacimbinhas e Minador do Negrão, após algumas turbulências, e assumindo a minha paróquia de origem, São Cristóvão de Santana do Ipanema...
Totalmente imerso nas diversas atividades dessa “nova” paróquia... As Vias-Sacras, os grandes retiros, como o dos Homens no Tigre e os trabalhos do mês de maio, setembro e dezembro... meu gosto pelas visitas às comunidades... interagindo com as grandes pessoas amigas daquela parcela do povo de Deus... também questionando a mim mesmo nos momentos de dificuldades, como por exemplo quando assumi a responsabilidade pelo jornal diocesano, “Igreja em Ação”... lançando-me, oficialmente, como escritor ao publicar meu primeiro livro: “Não ser... Ser! Viver: um grande desafio”, e depois o segundo, “Paróquia de São Cristóvão – Panorama Histórico Pastoral”... entristecido quando da morte de pessoas amigas...
Sendo transferido, sem vontade própria, para minha atual paróquia, mas obedecendo conforme prometi ao ser ordenado sacerdote... em meio aos grandes desafios encontrado nessa fase da vida... desbravando o novo território sob minha responsabilidade com a ajuda de um grande amigo, Damião Santos (in memoriam)... aproximando-me e conquistando a confiança de pessoas essenciais para meus trabalhos como pároco... envolvido em dois acidentes automobilísticos com a S10 da Paróquia, um em velocidade alta atropelando um cavalo e outro, tendo a S10 literalmente por um ônibus desgovernado, sendo que em ambos meu acompanhante e eu saímos ilesos... envolvido em mais um acidente, na verdade, dois na mesma noite – atropelando um cachorro e um pouco mais à frente, um cavalo, com um Gol-Volkswagen que foi-me emprestado pelo meu amigo Prefeito de Major, enquanto a S10 da paróquia estava em manutenção... Fugindo de mais um atentado, enquanto dois automóveis – um metálico escuro e outro prata, me perseguem de Dois Riachos à Major Izidoro... levando um tremendo susto ao ter a S10 da Paróquia sendo atingida por uma pedra ao passar à noite na rodovia entre Cacimbinhas e Major Izidoro... Lançando mais livros de minha autoria: “Fragmentos de mim”, “Desafios da Fé”, “Retalhos da Vida”, “Des-entraves”... “Uma amizade que se prolonga para a eternidade”, EGO, ME IPSO – Autobiografia” e “A casa, o flamboyant e eu”... participando da 7ª e da 8ª Bienal Internacional do Livro de Alagoas... muito tenso diante das incertezas da pandemia da COVID-19 que chegou de forma terrível atingindo a humanidade inteira... pensando temeroso nas quatro vezes em que fui contaminado, mesmo de forma leve, por esse vírus maldito... confuso, triste ao perder mais alguns amigos e amigas, “pedaços de mim”... Feliz da vida preparando atividades pastorais e participando delas como Vias-Sacras, Festas de Padroeiro da sede paroquial e das comunidades... envolvidos com as grandes reformas, principalmente da reforma da Igreja Matriz... Planejando a construção da nova casa paroquial... incentivando e acompanhando amigos e amigas no itinerário de vida deles, tendo em vista o futuro de cada um... iniciando o curso de Nutrição na UNINASSAU, em Maceió... dando os últimos passos para a conclusão desse mesmo curso... [...]
Incrível as surpresas que a vida nos reserva! Jamais imaginei chegar aonde cheguei. De qualquer forma, muito do que somos, foi porque planejamos e demos passos para que pudéssemos ser.
Esse sou eu, mesmo ainda em devir!
Vida que segue...
[Pe. José Neto de França]
Comentários