TOSTÃO, O CARTOMANTE

Djalma Carvalho

“Cada um com suas manias”, diria o filósofo de botequim sobre o dia a dia de muita gente. Talvez até o dissesse referindo-se a Wilson Silva Melo, o querido Tostão, pessoa de sorriso franco, alegre, saudável. Seu habitual modo de ser às vezes me parece transitar entre a criança em crescimento e o bondoso adulto de alma pura.
O apelido vem desde 1970. Ao participar de pelada na periferia de Maceió, Wilson marcou belíssimo gol, semelhante ao que teria marcado Tostão, jogador da seleção brasileira na Copa do Mundo daquele ano, no México.
Na festa de formandos em Odontologia, recentemente realizada, encontrei-me com familiares, irmãos, primos, sobrinhos e muita gente de minha mais estreita amizade, entre os quais Wilson. Ao abraçá-lo, lembrei-me da curiosa história de suas aventuras como cartomante, ou coisa parecida, que me foi contada há muito tempo.
Hoje aposentado, continua ele com a mania de indicar meizinha para todos os males, sem quaisquer custos e sem nada cobrar de seus eventuais “clientes”. Apenas um abraço apertado e um sorriso de quem somente deseja o bem a seus bons amigos. Carrega consigo uma pasta com livretos e receitas de chás caseiros, remédios populares, com indicações para diversos incômodos ou ligeiras doenças que atormentam a gente pobre que conhece.
De uns tempos para cá, tornou-se evangélico. Aí, sim, tem resposta para quaisquer indagações sobre Deus, sobre a religião que abraçou e sobre os caminhos para a salvação de pecadores. Não importa se paga dízimo ou não, apenas a certeza de que Jesus é o caminho, a verdade e a vida.
Todos da família, entre os quais me incluo, dedicam-lhe carinho e especial atenção, porque se trata de pessoa bondosa, servidora e educada.
No largo do mercado da carne em Santana do Ipanema, meu irmão Gileno, iniciando-se no comércio de vidros em geral, ali ocupou o prédio onde antigamente funcionava a padaria de Isaías Rego.
Ainda sem emprego formal, dois irmãos mais novos ajudavam Gileno nos serviços da vidraçaria. Ao local comparecia meia dúzia de jovens espirituosos e prontos para qualquer molecagem, também desempregados. Juntos, na ausência do proprietário da loja, eles pintavam o sete.
Certo dia, a eles se juntou Tostão com a mania de cartomante, querendo ler a mão de quem aparecesse na vidraçaria. O novo adivinhador logo foi levado para local reservado na loja. Ali, os meninos puseram-lhe na cabeça uma espécie de turbante, arrumação com a qual Tostão começou a “atender” a seus “clientes”.
Logo entrou na vidraçaria Leôncio, soldado do tempo do combate ao cangaço de Lampião, cara fechada, sério, porém conhecido brincalhão e amigo dos jovens presepeiros. Apresentaram-no ao novo e famoso cartomante da cidade.
Leôncio, percebendo a malandragem dos meninos, perguntou-lhes, meio abusado:
– “Quem é esse amarelo ai?!”
Gargalhada geral. Tostão, entendendo o pejorativo do velho soldado, não quis mais ler a mão de ninguém, e foi saindo...

Maceió, março de 2015.

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