POR LINHAS TORTAS

Djalma Carvalho

Ao término de cada capítulo, o leitor se depara com mais uma surpresa, com novas emoções, e há sempre o desejo de ir adiante, sem demora. Assim, concluí a leitura de Por Linhas Tortas, romance de autoria de Denis Portela de Melo, talentoso escritor da querida Viçosa de Alagoas.
Não poderia ser diferente. O saudoso romancista José Maria de Melo deixou com seu ilustre filho o legado de também escrever bons romances. Deixou-lhe, também, para ser utilizado nesta primorosa produção literária, o bucólico e inspirador cenário do engenho Baixa-Verde, com toda a exuberante paisagem dos vales úmidos adjacentes, serpenteada pelo caminho natural do riacho Pirangi.
Nascido nesse ambiente de cultura da cana-de-açúcar, o escritor conheceu a casa-grande, o coronel autoritário, as sinhás, os colonos, a bagaceira. Conheceu também a opulência e a decadência dos engenhos e bangüês. Usando a mesma temática, a mesma paisagem social e econômica, Denis repete, com o livro Por Linhas Tortas, o sucesso de Os Canoés, romance escrito em 1971 por José Maria de Melo, seu pai, ex-presidente da Academia Alagoana de Letras. Além de cidadão gentil, de finíssimo trato, sempre solícito, Denis também dele herdou a qualidade de excelente escritor.
Embarquei no lirismo, na poesia, no colorido das paisagens, na trama e nas histórias incidentais do livro, a partir, principalmente, do temporal que desabou sobre a Baixa-Verde e da procela que quase afundou o vapor Ita na entrada da barra de Porto Grande, imaginária cidade da costa baiana. As histórias se entrelaçam e se completam na bem trabalhada fabulação. Quase todas elas foram ambientadas em Viçosa, Salvador e Rio de Janeiro. Fascinante passeio faz o leitor ao longo das 459 páginas do livro, escrito em linguagem fluente, denso em reflexões e em análises psicológicas, com tragédias, paixões, encontros, desencontros e histórias humanas. Registre-se o drama de consciência do médico que, tendo diante de si o estuprador da filha do coronel - ela que seria mais tarde sua esposa -, não prestou assistência capaz de evitar a morte do abjeto indivíduo, acometido de gangrena.
Sem perder o fio da meada, movimenta-se o narrador, com desenvoltura e segurança, no universo de 162 personagens, aí incluídos os de papel secundário, os chamados figurantes. Soube realçar, em cada mulher bonita e sensual, “os clamores do sexo, – no seu entender – essa força indômita capaz de romper os liames da razão e de fazer explodir as mais esdrúxulas e desvairadas paixões”. Referia-se, principalmente, a Belinha, Maria Alice, Bernadete e Nina.
Entremeando cada história narrada, o autor não esqueceu cenas e histórias hilárias criadas pelo comediante Ferreirinha, a empulhar o padre Wenceslau, companheiros de viagem marítima. Também registrou as esquisitices e extravagâncias de Pedro Matos, autor das exéquias do seu cachorro Rex, velado na sala de visitas de sua casa. Não escapou da narrativa o janota Chupetinha, que vivia de cabeça virada por Gerusa Pavão.
Afinal, lendo o livro, não se pode deixar de fazer nostálgico passeio à boêmia e antiga Viçosa, cidade daqueles bons tempos que não voltam mais.

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