Escritores e poetas, pelo Brasil afora, cantaram seus rios e riachos. Agora vou cantar os meus.
Serviram-me de mote para esta conversa três assuntos que têm tudo a ver com rios, riachos e meio ambiente. De uma forma ou de outra, interligados, comunicantes, eles me fizeram lembrar o riacho da minha infância no Sítio Gravatá, no interior do município de Santana do Ipanema, onde nasci.
O primeiro assunto foi encontrado em recente artigo publicado em informativo institucional do Banco do Brasil, segundo o qual “termo frequente na atualidade, economia de baixo carbono significa aliar preocupações ambientais ao desenvolvimento econômico de empresas e países”. Mais adiante, o editorialista acrescenta os termos “racionalização no uso de recursos naturais como a água, por exemplo”.
O segundo, também considerado de significativa abrangência e de interesse de todos os povos, ressalta o plantio de mais de 10 milhões de árvores, como resultado de vitoriosa campanha de âmbito mundial, promovida no ano passado por Lions Clubes Internacional, a título de contribuição para a preservação do meio ambiente.
Finalmente, o terceiro mote refere-se à leitura do livro Veredas – Caminhos e Riachinhos, de autoria de Lúcia Nobre, em que, “lembrando o seu sertão”, a escritora santanense comenta a grande obra literária de João Guimarães Rosa, sobretudo o livro Grande Sertão: Veredas, com seus personagens Riobaldo, Raymundão, Manuelzão, Miguilim, entre outros.
Disse Lúcia Nobre: “Cada um tem um rio em sua vida.”
Verdade. Também tenho o meu, e muito saudosamente o meu riacho Gravatá, afluente do rio Ipanema. Guimarães Rosa tinha o seu, ou os seus como os das histórias de Manuelzão e Miguilim. José Lins do Rego tinha o seu rio Paraíba, eternizado com a antológica crônica A Enchente, do romance Menino de Engenho. E tantos outros que exaltaram seus rios como fonte de vida e de inspiração para suas obras literárias. Escritores santanenses – e muitos – também assim o fizeram, a exemplo de Oscar Silva, com seu romance intitulado Águas do Ipanema, José Marques de Melo, Tobias Medeiros, José e Raul Pereira Monteiro, entre outros. O poeta Remi Bastos, também conterrâneo, não esqueceu o seu riacho Camoxinga: “Lá vem o velho riacho/descendo de água abaixo/fazendo carneirinho/no caminho por onde passa...”
Pois bem. O riacho Gravatá é o riacho do meu tempo de menino. Fascinava-me com suas enchentes, remansos, cachoeiras, com o seu murmúrio. Lembro-me, com saudade, das enchentes que chegavam de surpresa, do banho e do mergulho em suas águas furiosas. Dizia minha avó, referindo-se à enchente que vinha vindo: “O riacho vem soprando.” Nele, acompanhado da travessa meninada do lugar, aprendi a nadar.
De sua nascente na serra dos Meninos, no limite do município de Águas Belas, Pernambuco, com Santana do Ipanema, até chegar à barra do rio Ipanema, onde encerra seu curso, lá se vão 34 quilômetros.
Coisas do passado não muito distante. Mandis e traíras, ali pescados, complementavam a alimentação dos ribeirinhos. Poços e cacimbas, de águas turvas e salobras, abasteciam o gado que, por sua vez, aproveitava, como nativa forragem, o verde capim que aflorava nos baixios e nas margens do riacho.
Infelizmente, o desmatamento desordenado, entre outros problemas, tem sido o principal causador do deplorável estado de conservação do riacho, outrora reconhecidamente importante para a vida daquela gente. Bem que o riacho poderia ser incluído no Programa de Revitalização da Bacia Hidrográfica do São Francisco, a ser implantado pela Codevasf. Ao longo de quase 3 mil quilômetros de extensão, 168 afluentes deságuam no Velho Chico, entre os quais o rio Ipanema.
O riacho Gravatá está para morrer, degradado, poluído, seco, pedindo socorro aos ambientalistas. Que pena! Já não se houve mais o barulho das enchentes de outrora, o seu murmúrio, nem a musicalidade de suas águas revoltas que fazia bem aos nossos ouvidos de meninos, noite adentro.
Maceió, outubro de 2012.
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