INTERIORIZAÇÃO versus METROPOLIZAÇÃO

Carlindo de Lira

INTERIORIZAÇÃO versus METROPOLIZAÇÃO
*Carlindo de Lira Pereira

Em recente discussão no CONSU-UNEAL (25.03.09) sobre a situação de preca- riedade física ( não há prédio próprio) e funcional (insuficiência no quadro de funcioná- rios, professores, administrativos e de serviços gerais) em que se encontra a extensão do Campus I em Maceió, onde funciona o curso de Administração Pública; a Câmara formada para avaliar a viabilidade da realização do Vestibular-2009 para este curso na capital emitiu o seguinte parecer: “... por não dispor de prédio próprio e ter carência de professores, nosso parecer é desfavorável à realização do vestibular 2009 para a exten-são do Campus I em Maceió, curso de Administração Pública”.
Pedi a palavra e argumentei que a história da atual Uneal, antes (1970) Funec ensino superior privado até 1989; a partir de 1990 após intensa mobilização dos alunos e alguns professores é transformada na primeira instituição de ensino superior pública e gratuita no interior do Estado de Alagoas e na sequência (1996) Funesa, ensino superior públi-co e gratuito, foi criada estrategicamente para oferecer aos alagoanos nascidos no inte- rior do estado, a oportunidade de cursarem o ensino superior (mesmo inicialmente pri- vado) sem precisarem custear despesas com deslocamento e estada na capital alagoana, onde desde o século XIX concentra privilégios. Por isso, o foco do PDI – Plano de De- senvolvimento Institucional, e o PPP – Projeto Político Pedagógico deve manter seu direcionamento estratégico no sentido de aumentar o Índice de Oportunidade Humana, com vistas a uma graduação de nível superior nas cidades do interior do estado que con-forme o economista da UFAL Cícero Perícles de carvalho, “(...) nos municípios onde há baixo índice de escolaridade, por exemplo, há também os maiores indicadores de exclusão social”,por isso, ofertar a essas populações interioranas - filhos de camponeses e pequenos proprietários que sobrevivem da agricultura familiar - condições de acesso e ingresso numa universidade pública é condição sine qua non para o real cumprimento do papel social como agente transformador da Uneal e, portanto, seu orçamento, deve ter como diretriz ética e cidadã os municípios interioranos, em vez de contemplar com uma extensão do Campus I um curso de Administração Pública em Maceió, “que apresenta uma situação espacial e de concentração de renda privilegiada em relação aos demais municípios , tendo em vista que a capital é responsável por quase metade do que é produzido em Alagoas” (CARVALHO, 2005: 28) , e que diante do aperto orçamentário da Uneal, considero “um luxo a mais” para os moradores da ci- dade mais rica do estado, presentear os filhos da burguesia maceioense e de cidades adj-jacente com mais um curso superior, em detrimento das demandas óbvias dos Campi distribuídos em regiões geoeducacionais mais carentes do ponto de vista histórico e dos recentes resultados do IDH- Índice de Desenvolvimento Humano alagoano. Carvalho:

Maceió é o retrato fiel do modelo concentrador de renda que o Brasil
conhece desde o tempo colonial, e que mantém os seus traços mais
fortes no Nordeste. (...) A capital tem, em primeiro lugar, o privilégio
de, desde o século XIX, concentrar quase toda a administração federal
e estadual, além de sua própria prefeitura. São mais de 80 mil fun-
cionários públicos vivendo na capital. Uma em cada três famílias na
capital tem um servidor público (CARVALHO, 2005:29).

Em contraposição a minha fala levantaram-se argumentos dos representantes do Sindfunesa e de professores que têm ligação profissional ou residencial em Maceió, defendendo que seria um retrocesso para a Uneal não realizar o vestibular para a exten- são do Campus I na capital, porque lá também haveria filhos de pobres e favelados que precisam de ensino superior gratuito. No entanto, ao pesquisar-se a origem dos social-mente excluídos da capitalalagoana constata-se que “a falta de alternativas no interior do Estado e a dinâmica econômica municipal um pouco superior à média estadual tem penalizado Maceió com uma forte migração rural e com os deslocamentos das cidades do interior alagoano em direção à capital” (CARVALHO, 2005:30).
Portanto, se a origem dos que vivem à margem das melhores condições de vida da cidade mais rica do estado é evidentemente fruto do fenômeno migratório no sentido interior-metrópole, verifica-se que:

(...), ao longo de décadas, implantaram-se em Maceió um setor de serviços
e uma rede comercial desenhados para servir a todas as regiões do Estado
e, por isso, eles absorvem muita gente. Esses setores são os grandes empre-
gadores, tanto no setor formal, com trabalhadores de carteira assinada, como
na economia informal (CARVALHO, 2005:29).

Vê-se, então, que a Uneal ao ter sua sede situada no interior do estado e seus campi distribuídos estrategicamente em municípios pólos, descortina um horizonte promissor para a população interiorana ao possibilitar uma nova dinâmica sócioeconômicaeduca-cional nas regiões mais pobres de Alagoas, qualificando e profissionalizando a popula- ção do interior, atraindo recursos que vão circular nos comércios desses municípios, cri- ando empregos de forma direta e formal por meio de concursos públicos, e indireta e informal agregando prestadores de serviço, como transporte, restaurantes, hotéis, dor- mitórios e outros, que por conseguinte, atuando como importante fator estratégico de política pública para melhoria dos índices sociais negativos, como a recente colocação da cidade de Traípu (março 2009) entre as piores cidades do Brasil por apresentar baixíssimo índice de desenvolvimento humano – IDH; entendo que é nessa cidade ou região que o orçamento da Uneal, que é do povo alagoano, deve focar sua atuação, especialmente por razões óbvias, para que ao menos a médio prazo as condições acima suscitem uma dinâmica socioeconômica real nessa área, e a longo prazo melhore-se os indicadores sociais, que historicamente denigrem a gente do interior de Alagoas.
Diante da realidade escancarada a nossa frente, quer se apresente em números ou pela constatação da convivência cotidiana por meio de nossa prática educativa, podemos verificar que “para alagoas, isso que se diz sobre um Brasil arcaico ainda se aplica in-tegralmente até hoje (VERÇOSA, 2006:161), por isso justifica-se considerar “um luxo a mais” à classe média maceioense manter-se uma extensão do Campus I, curso de ad-ministração pública, pago com o dinheiro público, concentrando mais renda na capital, quando há inúmeros municípios que demandam investimento em caráter de emergência, mesmo que os resultados positivos somente ganhem concretude à longo prazo.
Fora a capital, Maceió, os cento e um (101) municípios alagoanos sofrem de atra- so regional e “as conseqüências diretas da combinação entre pobreza, concentração de renda e baixa escolaridade são a pouca formação-qualificação profissional da mão-de-obra e um alto grau de desinformação da cidadania devido o baixo consumo de jornais, revistas, livros, etc.” (CARVALHO, 2005:14, 15), ausentar a Uneal desse contingente humano que sobrevive, a quase dois séculos, à margem dos seus direitos constitucionais requer a imediata intervenção do Ministério Público para reclamar e exigir que a coisa pública seja tratada responsavelmente, atendendo ao interesse público do mais necessi-tado e nunca aos interesses pessoais de alguns ou de grupos “bem intencionados”.
Em face do exposto acima, nunca é demais lembrar que a democracia requer vigi- lância constante, e que o povo alagoano, principalmente, interiorano, fiel depositário do orçamento da Uneal, tem direito a informação sobre a aplicação desse recurso, e em be- nefício de quem e do que alguns conselheiros dessa instituição de ensino superior, que estão a serviço desse povo, têm defendido interesses; se da maioria marginalizada, situa-da no interior do Estado, ou das famílias burguesas da capital, abastada e cercada de be- nesses, salvo rara exceção.
*Professor Auxiliar da Uneal e sócio efetivo da ACALA.






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