Quem destrói e quem protege as florestas e o meio ambiente em geral

Outras Peças Literárias

por Fernando Soares Campos(*)

Os países imperialistas, colonialistas, intervencionistas e golpistas criam todo tipo de manipulação midiática para demonstrar que estão preocupados com a preservação da selva amazônica. Denunciam o desmatamento “indiscriminado” da floresta, protestam contra as queimadas para criar áreas de pastagem, reclamam da caça, pesca e extrativismos predatórios e acusam os governos da região de serem condescendentes em relação aos responsáveis por essas atividades “criminosas”.

Somente na Amazônia brasileira, milhares de ONGs estrangeiras e nacionais financiadas por entidades multinacionais atuam em nome de uma suposta defesa do meio ambiente e dos povos indígenas. Nem todas as ONGs estrangeiras atuantes na Amazônia são instrumentos deliberadamente a serviço das grandes potências bélicas e econômicas, essas que visam se apoderar do imenso potencial de riquezas naturais ali existentes, porém muitas dessas entidades com placa de “santa filantropia” na fachada escondem seus verdadeiros interesses: biopirataria, lavagem de dinheiro, tráfico de drogas, de armas e de pessoas para trabalho escravo e prostituição. A espionagem, visando a preparação do terreno para futura invasão militar, sempre foi uma das tarefas de algumas dessas entidades, tudo camuflado pela suposta preocupação dos países ricos com a preservação da floresta amazônica.

Se acharem necessário, ou se as ONGs e as vias diplomáticas não estiverem produzindo os resultados desejados, deflagram atos terroristas, operações de falsa bandeira, com o objetivo de sensibilizar as comunidades internacionais e obter apoio para intensificar o domínio geopolítico, passando a intervir com maior agressividade.

Ensinando padre a rezar missa

Os interesses desses países pela Amazônia são vários e, em alguns aspectos, conflitantes entre si, porém a mais evidente de suas intenções é evitar que os povos amazônicos assumam de fato, de direito e de uma vez por todas, a posse e controle daquela região.

As potências econômicas, industriais e bélicas temem que os governos das nações que detêm fatias do território amazônico aprendam definitivamente a lidar com a complexidade dos problemas advindos das necessidades de uma sociedade moderna, os quais invariavelmente se confrontam com a exploração da biodiversidade e a preservação dos ecossistemas naturais.

Algumas ONGs “filantrópicas” se instalam na Amazônia exatamente com o objetivo de observar e aprender com os caboclos, os colonos autóctones e os índios. Estes, sim, são os verdadeiros experts em floresta tropical. Mas a presunção dos ricos e “cultos” faz com que eles patenteiem a fórmula de uma economia sustentável e venham aqui impor seus métodos de lidar com o meio ambiente. É como ateu ensinando padre a rezar missa.

Nesse contexto, o Brasil se transforma no principal alvo da rica comunidade internacional, que parece erguer a bandeira da defesa do meio ambiente em todo o mundo. A julgar pela maneira como tratam a questão, não tardará o dia em que os países imperialistas venham declarar a Amazônia como seu legítimo protetorado.

Ou alguém pensa que as bases que estão instalando ao redor da maior floresta tropical do Planeta serviriam apenas para combater o narcotráfico, ou golpear a Venezuela?

O big stick é bem mais grosso do que podemos imaginar.

Primeiro criaram a balela de que a Amazônia seria “o pulmão do mundo”. Teoria já desacreditada. Mas o fizeram exatamente para disseminar o conceito de que a floresta amazônica seria “patrimônio da humanidade”.

Até aí morreu Neves, pois a Natureza é, por si mesma, legítimo patrimônio da humanidade; a Natureza, em todas as suas formas e manifestações, com tudo o quanto nela existe ou dela provier, pertence ao ser humano de qualquer latitude. O resto é apropriação indébita.

Claro que, do ponto de vista da Natureza, a Amazônia é patrimônio da humanidade. Assim como os Andes, o Deserto do Saara, o Ártico, a Antártida, os mares, os oceanos, toda a fauna e flora, as reservas minerais e até o produto da nossa intelectualidade. Porém o que querem sugerir com “Amazônia, patrimônio da humanidade” é a internacionalização daquela imensa reserva florestal. Parece que só nesse item (Amazônia) o capitalismo expressa ares de socialismo, pois “patrimônio” é palavra chave dos princípios capitalistas. Cercas, muros e fronteiras delimitam propriedades em todo o mundo. Propriedades privadas ou administradas pelos estados.

A nossa Amazônia Legal é patrimônio da nação brasileira, tanto quanto o Alaska passou a ser patrimônio dos Estados Unidos, depois de ter sido adquirido da Rússia por um punhado de dólares.

Planeta Frankenstein

A Amazônia seria o pulmão, a África, bem sabemos, tem sido tratada como o ânus, a Europa deve ser o pênis; o Oriente Médio, o sangue; a América Central, uma pequena artéria; mais ao sul estaria a barriga, que, por questões dietéticas, deve ser mantida quase vazia; e assim vão identificando a anatomia do Planeta. E os países imperialistas e colonialistas se consideram o “cérebro”, claro!

Mas é um cérebro estúpido, pois durante séculos acreditou que poderia sobreviver sem preservar a saúde e o bem-estar do resto do corpo. Um cérebro que só se lembra dos demais órgãos vitais quando eles estão atrofiados ou definhando, prestes a sofrer um colapso.

Acontece que as doenças podem atacar qualquer desses órgãos, e o cérebro não está imune ao câncer, por exemplo.

Esse cérebro estúpido, acondicionado numa caixa craniana conhecida como poder de fogo, tem um rosto chamado american way of life, que já sofreu inúmeras cirurgias plásticas, mas agora as pelancas estão despencando.

Esse cérebro sofreu um derrame, provocado pelo entupimento de algumas de suas artérias. Precisou de tratamento emergencial, foi para a UTI. Certamente não poderia ter sido levado sozinho.

Sabe aquela coisa de morte cerebral, quando os demais órgãos podem ser mantidos em funcionamento, mas que aparentemente o cérebro pifou? Pois é o que deveriam decretar nesse caso: “O cérebro do mundo parou de funcionar! Vamos aproveitar os demais órgãos!”.

Bem, nessas horas sempre aparecem uns economistas metidos a médico. Daqueles que, baseados na nomenclatura anatômica acima descrita, chega a sugerir: “Irriga Oriente Médio na Europa, a vazão produzirá uma ereção instantânea, aí é só introduzi-la na África!”.

Também tem aquele médico fumante que chega baforando seu marlboro, ausculta o paciente, dá uma tragada, analisa as radiografias dos pulmões, dá outra tragada, diz que o paciente está precisando respirar melhor, traga novamente e parte para fazer respiração boca a boca com o moribundo.

Minha terra tem fumaça
Onde voa o sabiá
Os gases que aqui poluem
Não poluem como lá

Nesta nossa viagem do nada a lugar nenhum do Universo, a bordo do planeta Terra, os países considerados upper first class reclamam dos gases expelidos pelos passageiros da classe econômica.

Pelo visto, a flatulência dos pobres fede muito mais que a dos ricos.

Dizem que o desmatamento e queimadas das florestas são responsáveis por aproximadamente 20% das emissões de gases que provocam o efeito estufa em todo o Planeta. Mas onde li isso não há informação de quanto o Brasil contribui para esse percentual. Os 20% referem-se ao desmatamento e queimadas no âmbito global.

Precisei de outra fonte. Fui buscar. Encontrei uma que informa: “O pesquisador do Instituto Vitae Civilis, Délcio Rodrigues, afirmou que o Brasil é o sexto maior emissor mundial de gases de efeito estufa. Segundo ele, o desmatamento é responsável por 75% da emissão de gases poluentes no Brasil”.

Trecho do discurso do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante a abertura do debate geral da 64ª Assembléia Geral das Nações Unidas, em setembro de 2009:

O Brasil está cumprindo a sua parte. Vamos chegar a Copenhague com alternativas e compromissos precisos. Aprovamos um Plano de Mudanças Climáticas que prevê a redução de 80% do desmatamento da Amazônia até 2020. Diminuiremos em 4,8 bilhões de toneladas a emissão de CO2, o que representa mais do que a soma dos compromissos de todos os países desenvolvidos juntos.

Em 2009, já podemos apresentar o menor desmatamento dos últimos 20 anos. A matriz energética brasileira é das mais limpas do planeta: Quarenta e cinco por cento da energia consumida no país é renovável. No resto do mundo apenas 12% é renovável, enquanto que nos países da OCDE essa proporção não supera 5%. Oitenta por cento de nossa eletricidade provém igualmente de fontes renováveis. Vinte e cinco por cento de etanol está misturado à gasolina que consomem nossos veículos. Mais de 80% dos carros produzidos no país têm motor flex, o que permite a utilização indiscriminada de gasolina ou álcool.

O etanol brasileiro e os demais biocombustíveis são produzidos em condições cada vez mais adequadas, sobretudo a partir do zoneamento agroecológico que acabamos de implantar, mandando para o Congresso Nacional.

Proibimos a cana-de-açúcar e as usinas de álcool em áreas de vegetação nativa. A decisão vale para toda Amazônia e nossos principais biomas.


Na mesma ocasião da 64ª Assembléia Geral das Nações Unidas, o primeiro-ministro sueco Fredrik Reinfeldt disse que "Este importante passo a ser tomado [pelo governo Lula, com o propósito de o Brasil reduzir o desmatamento em 80% até o ano 2020] vai contribuir significativamente para a redução do efeito estufa, já que o desmatamento no Brasil é responsável pela emissão de mais de 20% dos gases poluentes jogados na atmosfera do país”.

Aparentemente, os percentuais aí expostos são extremamente discordantes. Um fala em 75%, enquanto o outro diz ser de apenas 20%. Acontece que eles estão tratando a questão por diferentes ângulos. O primeiro refere-se ao que produzimos em termos de gases poluentes, o segundo trata da nossa cota de gases poluentes hoje existentes na atmosfera do Planeta, apesar de se expressar com “jogados na atmosfera do país”.

Para falar em “atmosfera do país” e “atmosfera do Planeta”, nesse caso específico de poluição, como se estivesse falando de coisas distintas, precisa ser bastante claro. Afinal, a atmosfera é do globo terrestre.

O pesquisador brasileiro disse que, do total de gases poluentes que o Brasil lança na atmosfera, 75% é proveniente do desmatamento ocorrido no nosso país. Enquanto o primeiro-ministro sueco referiu-se à nossa contribuição tomando por base o total de gases poluentes que o “desmatamento global” produz.

Pelas minhas contas, ambos estão corretos. Quer dizer, corretos matematicamente, pois o que um diz é confirmado pelo outro. Não sei se eles expressam a verdade sobre o que realmente ocorre.

Vamos pegar uma quantidade específica de gases poluentes na atmosfera da Terra. Por exemplo, uma tonelada. Dessa quantidade, pelo que nos informam, 200kg teriam origem nas questões relacionadas com os desmatamentos em geral, em todo o Planeta. O Brasil teria contribuído com 20%; portanto, com 40kg. Os demais países desmatadores e “incendiários”, juntos, contribuiriam com 160kg.

Resta ainda analisar a origem dos 800kg restantes.

Baseado nos dados fornecidos pelo pesquisador brasileiro e pelo primeiro-ministro sueco, no período em que o Brasil produzisse 40kg de gases poluentes atribuídos às questões do desmatamento florestal, o que corresponderia a 75% da nossa capacidade total de poluição da atmosfera, produziria, no mesmo período, apenas 13,3kg (os 25% restantes) através de todas as outras nossas fontes poluidoras. Quer dizer, a cada 1.000 kg de gases poluentes na atmosfera terrestre, o Brasil se responsabilizaria por 53,3 kg, ou 5,33%. É com essa taxa que o Brasil aparece como sexto maior emissor de gases de efeito estufa.

Isolando as emissões por questões relacionadas com o desmatamento e queimadas (na verdade, fala-se em “mau uso do solo”), o Brasil seria responsável por 1,33% dos gases poluentes na atmosfera do Planeta, emissões atribuídas às indústrias, à queima de combustíveis por veículos automotores e outras menos significativas. Em relação a estas fontes poluidoras, somente os Estados Unidos são responsáveis por cerca de 24% da emissão total de gases de efeito estufa.

As pesquisas disponíveis sobre a emissão de gás carbônico (CO2), o mais expressivo em termos de poluição atmosférica, são antigas, não se encontra praticamente nada atualizado, somente os estudos feitos no final dos anos 1990. Parece que, enquanto os pólos se derretem com o aquecimento global, congelaram as informações sobre a responsabilidade dos países poluidores. Pelo menos para o grande público, congelaram. Pode ser que tenham novas pesquisas que indiquem que os países ricos aumentaram suas cotas de sujeira na atmosfera. Mas não interessa a eles divulgar isso. O que interessa mesmo é criminalizar os "países em desenvolvimento". E, na medida do possível, congelar os seus desenvolvimentos.

Sim, o desmatamento existe, claro! Mas eles ainda conseguem outro feito: diminuir a criminalidade do desmatamento produzido sistematicamente por motosserras e tratores, transferindo a questão quase que exclusivamente para as queimadas, pois estas tornam mais evidente a poluição. Dizem que num só dia os satélites localizam milhares de focos de incêndios criminosos no Brasil. Em noites de festa junina devem ser milhões; pois, com a tecnologia avançada dessas máquinas espaciais, os satélites localizam até vaga-lume e ponta de cigarro.

Acontece que motosserras, tratores e engenharia de desmatamento para exploração de madeira são produtos de povos tidos como de civilizações avançadas, enquanto as queimadas podem ser atribuídas ao homem rústico, aos ignorantes. Tudo isso é uma grande mentira.

As queimadas de grandes extensões são, comprovadamente, realizadas por gente ignorante, sim, mas não pelo tipo a quem se costuma atribuir ignorância, o chamado homem rústico, aquele que sobrevive da pesca, da coleta ou da agricultura de subsistência, mas que lhe falta apenas instrução formal. Muito menos pelo índio. Os responsáveis pelas grandes queimadas geralmente nem conhecem as florestas e matas onde o fogo destrói a vida e abre espaço para criação de gado de corte. Nem sempre são pessoas desprovidas de saber, mas são ignorantes no sentido de serem estúpidos, gente insensível.

Ao contrário do que pregam, os países ricos e abastados receiam mesmo é que os povos da floresta mostrem ao mundo que, há milênios, aplicam conscientemente os princípios da sustentabilidade. Quem nunca se preocupou com esses princípios foram muitos governos que por aqui passaram desde o dito descobrimento.

O índio, o caboclo, o ribeirinho, o chamado homem rústico, estes exploram as matas desde o surgimento da humanidade e sempre o fizeram com parcimônia, de forma sustentável, pois sabem que suas vidas, suas sobrevivências, tudo depende da fauna, da flora, da biodiversidade, do equilíbrio da natureza.

Quem vai pra cima da floresta com muito apetite e sem medida é o homem tido como civilizado e culto. Na verdade, um ser brutalizado pela ganância e sede de poder.

(*) Fernando Soares Campos é escritor, autor de “Fronteiras da Realidade – contos para meditar e rir... ou chorar”, Chiado Editora, Portugal, 2018.

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