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Literatura

Por João Neto Félix Mendes - www.apensocomgrifo.com.br

Naquele dia, o ponto de encontro dos meninos da rua depois do jantar foi defronte a casa de seu Jaime Costa. Todos se reuniam em volta do balaústre adornado de cobogós de cimento produzidos na fábrica de seu Zezito Tenório. O muro baixo tinha muitas utilidades: servia de banco para a maioria, outros se escanchavam e alguns desfilavam, como se fossem equilibristas das olimpíadas populares. Éramos protagonistas e espectadores de nós mesmos. O palco era o balaústre interativo. Era como se fosse uma ponte que conduzia os meninos aonde quisessem ir.

Conversa vai e conversa, indo de um lado para o outro, vi um sapo-cururu quieto num canto do jardim, entre as plantas. Fui lá reinar com o anfíbio e eis que mais rápido que o pensamento ele virou o traseiro pra mim e disparou um jato certeiro de urina nos meus olhos. Imediatamente senti-os arderem como pimenta. Pronto, o pânico se instalou e comecei a gritar:

-Vou ficar cego!!!! Vou ficar cego!!!! A meninada gritava e zombava de mim, dizendo:

-Vai ficar cego mesmo, viu!! Vai mexer com quem tá quieto!! Corre e vai lavar logo os olhos!!!!

Era o que se sabia dos sapos. Corri pra casa pra lavar o rosto, olhos e a cabeça toda. O coração batia tão forte que parecia que iria sair pela boca. A cegueira lá em casa era um tema sensível que acometera meu pai desde os seis anos de idade. Passamos muito tempo sem saber a causa real da doença. Décadas depois tomamos conhecimento de que tinha sido um irreversível acidente vascular cerebral no nervo óptico.

Naquele dia foi uma sensação terrível porque fui tomado pela estranha e cruel realidade da tiflose. Curioso é que meus pais tinham saído e eu tive que lidar com o problema sozinho. Depois da lavagem, fui revirar as gavetas de casa em busca de óculos em desuso para amenizar o trauma. Encontrei um modelo horrível, escuro e com uma armação antiquada, contudo, por precaução, passei a usá-los imediatamente.

Ao retornar à arena da meninada, a mangação só aumentou. Reconheço que os óculos eram feios, porém eram a minha garantia de que, pelo menos, poderiam aliviar o meu drama. Os meninos espantados diziam:

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