O INVERNO

Crônicas

Por Jeno OLiveira

As nuvens densas anunciam que ele está vindo, embora os poros ainda continuem reclusos. Uma noite ou outra perdida os pelos – dos braços - timidamente se erguem. Mas só eles. O inverno é uma das quatro estações do ano, que se inicia no final do outono e termina com o início da primavera. No Brasil, ele começa no dia 20 ou 21 de junho e acaba no dia 22 ou 23 de setembro. Trata-se da estação do ano mais fria. Costumamos recebê-lo com graça, pois o trópico nos presenteia um sol enxerido pelo resto do ano. É ano demais para o calor. Primavera e outono, por aqui, são verões. Quentes verões.

Eu, particularmente, sou apaixonado por ele – o inverno. Mesmo o sem neve ou o sem gelo. Muda-se o vestuário, o perfume, o vocabulário, o ritmo, a bebida, as intenções, o charme e até mesmo a trilha sonora. No Nordeste, onde o forró já é hegemônico, torna-se praticamente gênero único, isto porque o mês de junho traz com ele a celebração de três grandes santos católicos: Antonio de Pádua, João Batista e Pedro, o apostolo de Cristo e primeiro pontífice da Igreja Una, como assim fora anunciado. É um mês esverdeado, festivo, molhado e propicio a se ganhar umas gordurinhas a mais. E quem se importa? Leia-se o bolo de milho da Luana ou a canjica da Dona Leônia – a amanhecida – ambas originais. Sempre que sou presenteado com essas iguarias, eu mesmo faço questão de passar o café, que embora tanto faça mal a minha esofagite, não passa pelo meu juízo abandoná-lo. Para mim, o inverno começa com essas singularidades, mesmo sem ter começado oficialmente.

Nesta época, toda programação, tirando o corre-corre do ganha-pão, nos impulsiona para o mato, como na lei de Arquimedes de Siracusa. É a hora que tiramos a bota do guarda-roupa, a calça jeans velha sem uso e inventamos de pescar um fidalgo na barragem com água até as ventas, quebrar um milho na roça que vingou, colocar uns bancos de angico embaixo de um juazeiro e tomar umas lapadas de misturada com um taco de cordeiro assado ouvindo umas modas antigas, de preferência, já que as novas, em sua vasta maioria, são proibidas para menores de 14 anos. Junho, verdade seja dita, combina mesmo é com a voz única e forte do Luiz, o Gonzaga. Não sei para vocês, mas para mim o Luiz tem cara de chuva, de saudade e de churrasco.

No mato, a gente fica livre das moscas que vão para as cidades se proteger do frio. Aí fica fácil de se agarrar numa coxa de galinha de capoeira ou em uma costela de uma leitoa sem ser importunado. Nessas horas o pano de prato é mais útil que um pedaço miúdo de guardanapo. Na madrugada, a insônia impropria é logo recompensada pelo barulho dos pingos que estalam no chão e, prontamente, a vontade de dormir reaparece. O inverno, pelo menos o do sertão, tem mais encantos do que julga nossa vã e modesta filosofia.

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