Verão de 2006. Acordei em Maceió e antes mesmo do galo cantar, liguei para meu pai: - Deus te abençoe. Era assim que ele atendia o telefone com sua voz de âncora de telejornal. O sol estava tinindo e o sábado com a cara de ilusão de sempre. Combinei com ele de levarmos uns carangueijos para seu apartamento na Serraria, tomar umas cervejas, ouvir Nelson Gonçalves e, lógico, matar a saudade.
Depois de limpar as iguarias e colocá-las na panela com água em fogo alto, tio Marcos, que sempre fora talentoso na cozinha, perguntou-lhe pelo sal. - Onde fica o sal Jobson? Meu pai levantou-se com sua ligeireza habitual - quase derruba a cadeira - abriu o armário na cozinha e lhe entregou o bendito. Devia ter uns 800 gramas. Com o pacote na mão e o cigarro na boca, tio Marcos completou o rasgão de um canto a outro e despejou o sal na panela. Abruptamente. Não sobrou nada. Nenhum grãozinho pra contar estória.
Minutos depois, quando o cheiro já invadira o apartamento, meu pai retornou à cozinha e deu de cara com o saco vazio na pia. Feio, inútil e arreganhado. Assustou-se! Perguntou pelo companheiro de mais de uma década. - Tá na panela! - O sal todinho? Retrucou com espanto. - Hã? - Eu não acredito. Tio Marcos gargalhou de nervoso. Acendeu outro cigarro. Meu pai retornou a sala resmungando, com a camisa pendurada no ombro e emitindo estalos interruptos com a língua.
Sentou-se enlutado: - Estou incrível. Repetiu umas três vezes. - O que houve pai? Perguntamos. - Há mais de 15 anos que eu uso esse pacote de sal, o Marcos em um minuto acaba com tudo. Ou seja, havia um sentimento de afeto pelo sal. Afinal de contas, 15 anos não são 15 dias. Rimos, aproveitamos a iguaria e nos deliciamos com suas tantas tiradas cômicas pelo resto do dia. Que saudade!
Por Jeno Oliveira
Empresário
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