Narciso Fudécio, é um sertanejo franzino, com 1, 49 metro de estatura, sapato 44 e pesa pouco mais de duas arrobas, porém, uma criatura desprovida do medo. Cabra macho, valente e ligeiro, tendo enfrentado vários perigos na vida, mas nenhum o intimidou. Era conhecido na Rua da Poeira, onde viveu maior parte de sua vida, em Santana do Ipanema, como “O Caveirinha”. Já deu muita surra em cabra ruim e quenga desobediente. Acabou com jogo do bicho em Santana e ordenou o fechamento do cabaré, às 22 horas, e aí daquele que desobedecesse as suas ordens. Certa vez em um forró na Cajarana, nas imediações das “Tocaias”, o samba comia no centro. A cachaça já havia invadido os juízos dos “sambeiros”, e vez por outra reiniciavam as desavenças com a peixeira denunciando os atos. Por três vezes o pé-de-bode interrompeu a dança. Haja o chega pra lá. Compadre tome mais uma para se acalmar, vamos dançar, as muié tão querendo. Mas, não ouve acerto que apagasse os desentendimentos, e mais uma vez o pau quebrou. Acontece que nesse interim chegou o Caveirinha montado em seu animal reserva, a jeguinha pocotó. Amarrou o bicho no tronco do juazeiro e entrou no salão da dança. Pediu uma cachaça, bebeu, cuspiu no pé do balcão e solicitou outra enquanto traçava o seu pagoga na palma da mão. Dois caboclos que não tinham tomado conhecimento da chagada do caveirinha, se desentenderam outra vez, sendo controlado pelo magrinho valente. Olhe aqui seu dois “fio de rapariga”, hoje aqui ninguém briga mais. Aquele que se atrever vai se ver comigo, vão dançar os dois, “ homi cum homi” e não quero ver saliência. Em seguida o Narciso Fudécio foi convidado pelo promotor da festa para tomar um quinado com tira goto de galinha e guiné na cozinha da casa. Assim o samba foi até de madruga naquela tranquilidade.
Uma das ações mais corajosa e atrevida do Caveirinha foi no dia em que desarmou um bando do cangaço. Este episódio ocorreu num dia de sábado de Zé Pereira por volta do meio dia no Bar Mundo Errado, no final da Rua da Poeira. Caveirinha estava num recanto do bar tomando suas cachacinhas com tira gosto de piaba, rosto melado de maizena e um chapéu de couro que o tornara irreconhecível. Já havia tomado duas garrafas de Galo Negro com guaraná Globo, quando inesperadamente cinco jagunços entram no recinto se fazendo passar por foliões fantasiados de cangaceiro. Vão direto ao balcão, pedem uma garrafa de cachaça, no instante em que batem com coronha do rifle na sacada do bar. Um deles já mostrando alteração pelo efeito da bebida, diz em alta voz: “Ói aqui magote de peste, num corre ninguém. Hoje quem manda nessa budega é nóis, e bate mais uma vez com o rifle no balcão”. Lá no canto do bar Caveirinha observava a cena bufando valentia. Levantou-se da mesa, tomou mais uma, cuspiu no chão como de costume, limpou os beiços com as costas da mão e se dirigiu aos anarquistas. Aproximou-se e disse: “algum pobrema aqui? Num tô gostando do zunido de vocês, tão atrapaiando a banda”. Nesse instante um deles, o Pena Branca, tentou sacar o punhal, mas, o Caveirinha foi mais rápido, escorou os cinco facínoras com os dois revolveres Rossi calibre 22. Em seguida, falou com aquela sua voz grave: “mãos pra riba, joguem os rifle e os punhá no chão e fiquem de costa”. Após recolher as armas, deu um bicudo na bunda de um deles e disse corram se não quiserem levar bala. E os cinco desarmados se mandaram gritando, calma seu Cacá, passaram pelo açude de Dona Conconha a 100 por hora. Depois o Caveirinha, por garantia, quebrou os rifles do bando, somente os punhais ele colocou na cintura. Hoje muitos anos depois, somente as histórias contadas nos bancos das praças e nas mesas de bares, conferem as virtudes e a coragem do justiceiro da Rua da Poeira, Narciso Fudécio, o legendário Caveirinha. Recentemente ele foi visto na companhia do coronel do sertão João do Mato no Bar de João do Lixo, relembrando os bons tempos.
Aracaju/SE, 26/12/2013.
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