VIZINHOS E VIZINHAS Lúcia Nobre
Moradores da Rua dos Machados em Santana do Ipanema em Alagoas. Anos cinquenta, do que ficou na memória. Seu Antenor era sapateiro e Dona Olindina, dona de casa. Lembro de dois filhos. Nilza, jovem e trabalhando na casa de Seu Adeildo e Dona Rosalva, na Rua Coronel Lucena; e Celso ainda criança. Seu Antenor consertava os sapatos, os chinelos e as botas de todos os moradores de Santana que moravam dali, ao monumento. Naquela época existiam sapateiros. Em cada bairro havia um. Hoje é difícil encontrar esse profissional. Seu Antenor não cobrava pelos serviços que prestava ao pessoal lá de casa, certamente, porque éramos vizinhos. E toda vez que terminava o serviço dizia: “é um conto e uma besta”. Não sei se era ranzinza o tempo todo, sempre estava reclamando de uns clientes que levavam botas sujas para serem consertadas.
Seu Aloísio e Dona Santinha. Seu Aloísio trabalhava na Prefeitura, Dona Santinha, costureira, e não saia de casa. Ausentava-se da máquina quando ajudava Petrúcio na preparação de seus teatros. Ai, a mãe se esmerava na confecção de palco, cortina, auditório, onde aconteciam as representações do artista. Todas as crianças da rua participavam como expectadoras daquelas encenações. Ninguém assistia de graça. As entradas valiam notas de cigarro. Era de costume, colecionar notas de cigarro, as crianças as valorizavam de acordo com o preço do cigarro, tal qual, como colecionar figurinhas. Petrúcio exibia caixas de sapatos lotadas. Sabia como ganhá-las.
Seu Valdemar e Dona Marieta. Seu Valdemar trabalhava na Empresa responsável pela energia elétrica da cidade. Dona Marieta fazia parte da LBA. Legião Brasileira de Assistência. Era uma mulher muito bonita e dinâmica. Amiga e comadre de mamãe. Sempre solicita a ajudá-la com as costuras em tempos de festas.
Seu Manuel Alves Freire e Dona Maria (Seu Manuel barbeiro e Dona Maroca), meus avós de coração. Meus pais casaram e foram morar na Rua dos Machados. Mamãe era muito jovem e o casal a adotou como filha. Vó e suas filhas sempre estavam presentes, ajudando Dona Helena a cuidar dos filhos. Eles nos amavam como se fôssemos da família.
Dona Alcina. Chamávamos de Cina, carinhosamente. Não conheci seu marido. Seus filhos, Expedita, Quitéria, Ivaldo (Vau), eram tão educados como a mãe. Também era costureira. Tinha sempre um belo sorriso quando eu chegava pra conversar besteira. Não se importava. Ali na máquina, dialogava com as visitas. Quando tinha cinco anos, escondia-me em sua rede para não tomar injeção. Mas o tirano encontrava-me. Sempre que vou a Santana, encontro meu amigo Vau.
Os vizinhos faziam parte da família. Nas horas alegres e nas horas tristes estavam ali. Alegraram-se e choraram. Serviram de parteiras, ofereceram chás, olharam os filhos das comadres quando careciam às mães. Dona Hilda e Seu Isaías; Dona Marinhinha e seu Marinheiro eram considerados vizinhos, mesmo morando na Rua Coronel Lucena. Dona Marinhinha era uma mulher elegante. Sempre estava lendo. Dona Hilda, todas às tardes conversava com mamãe. Mandava a garotada pegar pão doce em sua padaria. Quando se aproximava a hora de mamãe ter mais um filho, toda meninada da rua ia até as Lagoas buscar vovó. Enfrentava sol, chuva e até lama na estrada para as Lagoas do João Gomes. Quando a criança nascia, todos queriam ser madrinhas e padrinhos.
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