NATAL E O PASTORIL DE DONA JACIRA

Crônicas

José de Melo Carvalho

O Natal é comemorado universalmente. É festa que envolve o espírito humano em toda parte do planeta. Uma das mais coloridas celebrações da humanidade. É a maior festa da cristandade. Por tratar-se de importação norte-americana de simbolismos, como a neve, o trenó e as renas, além da roupa vermelha tradicional, alguns a contestam. Nos anos 30 a coca-cola lançou uma campanha publicitária com o papai Noel vindo do Pólo Norte. Abraços, tapinhas nas costas, beijos, troca de presentes, presentinhos para as crianças (ricas...), confraternizações, encontros, e assim por diante.
Certa vez li na internet uma cartinha endereçada a Papai Noel, cuja autoria atribuíam a Osama Bin-Laden. Somente a gozação imperava e era divertido o texto, que a meu ver boa parte dele se aproveitava.
Esse negócio de Papai Noel, em minha opinião, nada mais é que estratégia de marketing para incentivar o consumismo. A Igreja Católica defende, e com razão absoluta, que a figura central do Natal é o menino Jesus de Nazaré. Nada a ver com o velhinho do HO-HO-HO das lojas e supermercados que o usam para vender seus produtos. A grande maioria das casas das cidades e dos campos enfeita a sua árvore de natal com bolinhas, estrelinha de Belém, luzes e pisca-piscas, além da manjedoura e a Sagrada Família. Na origem, as comemorações festivas do ciclo natalino vêm da distante Idade Média, quando a Igreja Católica introduziu o Natal, em substituição a uma festa mais antiga do Império Romano, a festa do deus Mitra, que anunciava a volta do Sol em pleno inverno do Hemisfério Norte. A adoração à Mitra, divindade persa que se aliou ao sol para obter calor e luz em benefício das plantas, foi introduzida em Roma no último século antes de Cristo, tornando-se uma das religiões mais populares do Império. A data conhecida pelos primeiros cristãos foi fixada pelo Papa Júlio I para o nascimento de Jesus Cristo como forma de atrair o interesse da população. O resto todo o mundo sabe.
Santana do Ipanema também comemora a festa. Só que em nosso tempo era diferente. Não havia roda gigante, patinhas, barcos, nem os sofisticados parques de diversões atruais, somente o Curre ou Estrivolim e a Onda que tomava um espaço e tanto defronte a casa J. T. de Aquino, além das barracas que vendiam de tudo, inclusive garrafinhas com algo parecido com fanta muito apreciado pelos meninos da época.
E o Pastoril? Quase esqueço! Mas a figura de Dona Jacira não podia deixar de ser lembrada. Era ela quem comandava tudo. Outro dia li no livro escrito por vários conterrâneos – À Sombra do Umbuzeiro – o que Remi Bastos contou do pastoril organizado por Dona Jacira, senhora muito querida na cidade.
Mas o nosso caso é diferente. Num final de ano, Dona Jacira armou o pastoril em frente à venda de tio Manoel, no centro do comércio. Tudo organizado, bandeirinhas, bolas de sopro de várias cores penduradas, pastorinhas bonitas, azul, encarnado, borboleta, Mestra e Contramestra, a Diana e o Pastor. “Que chapéu bonito, que trago na mão, ofereço a Paulo Ferreira e Elenice, que eles são do meu cordão”. Uma nota de 50. “Ofereço a Zé Cristino”, outra nota de 50. “Ofereço a Zé Constantino e Deo”, mais uma nota. “Contramestra em cena!” Seu Manezinho Chagas e Dona Helena pregam no vestido da pastorinha outra nota de 50. E assim por diante, até altas horas da noite. Tudo animado. De vez em quando uma bola é estourada. Outra bola. Mais outra. “Como pode? Não está ventando!”, reclamava a organizadora.
No dia seguinte, logo cedo, Dona Jacira mostra a Tio Manoel uma bola de sabão do tamanho de uma bola de gude, com vários alfinetes. “Seu Mané, veja o que fazem para me atrapalhar! Isso é coisa de macumba, de pessoa que não gosta de mim. Não encontrei galinha preta nem garrafa de cachaça, mas tenho certeza que isso é um despacho.”
Nada a ver. A molecada queria somente estourar as bolas do palanque. Ficamos calados diante da conversa. Não era despacho não. Era molecagem mesmo.

Maceió, dezembro de 2006.

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