Sem saber falar a língua italiana, com apenas noções de espanhol, acompanhado de um padre idoso da diocese de Umuarama, pelo menos foi isso que ele me disse, vi-me na Estação Central Termini, em Roma, Itália. Olhei para um grande relógio que havia próximo ao outro padre e eu, e constatei que era 8h45. O destino que nós iriamos tomar era uma pequena cidade, Leggiuno, situada na região norte italiana. Pelo mapa que tinha em mãos, deveria pegar o trem até Milão. Lá chegando teria que embarcar em outro trem, este com destino a Varesi. Deveria contar sete estações a partir da Estação Central de Milão. A sétima seria a Estação de Gallarati, onde deveria descer e telefonar para um número anotado no mesmo mapa, para que alguém viesse nos apanhar. Exatamente as 9h, seguimos nossa viagem.
Minha companhia disse-me falar e compreender bem a língua italiana, mas no percurso, percebi que a familiaridade com a língua por parte dele era tão sofrível quanto a minha. Pensando no meu espírito aventureiro, numa tensão sem limites pelo fato do desconhecido (língua, cultura, geografia, pessoas...), resolvi não pedir ajuda a ninguém. Queria ver no que ia dar essa aventura!
Após tantas paradas, embarques e desembarques de passageiros, chegamos a Milão entre 15h e 15h30. Pedi ao meu “amigo” para comprar a minha passagem e a dele para o percurso seguinte de nossa viagem. Ao ouvir ele se comunicar no guichê de compra, me arrependi. Talvez se eu, mesmo sem falar nada italiano; tivesse pedido para o funcionário falar em espanhol comigo, fosse mais confiável. Mas tudo bem!
Às 16h quando embarcamos no outro trem. Já estava um pouco irritado com meu acompanhante, pois ele, acho que para me impressionar ao conversar comigo, misturava o português com o italiano e complicava ainda mais.
Iniciei a contagem das estações. Aos poucos, notei que estávamos no trem errado. No mapa que tinha em mãos, o Lago Maggiore teria que estar à minha esquerda e ele estava aparecendo à direita. Pensei: “meu Deus, será que estou ariado (desorientado, perdido)?” Passamos da sétima Estação e esta não era de Gallarati.
Extremamente tenso, pois o tempo estava passando, e ter perdido a conta das estações que ficaram para trás, além de irritado com meu amigo, vi que ele, igualmente ficou perturbado.
Uma senhora idosa, que viajava conosco, uma poltrona atrás, percebendo que estávamos no trem errado, fez-nos, em inglês, uma pergunta. Como não entendesse o que ela disse, respondi com umas das poucas frases completas que decorei: “I do not speak English”, complementando com outra frase decorada, só que em espanhol: “yo entiendo español”
Ela, começou a se comunicar comigo, na língua espanhola. Perguntou se nós estávamos no trem errado. Eu afirmei que, infelizmente, por desconhecimento da língua, cometemos esse deslise. Deveríamos estar em um trem que estivesse nos levando a Leggiuno. Ela, então falou: “¡No! ¡No! ¡La siguiente estación es Suiza!”
Agradeci a informação e logo que cruzamos a fronteira, chegando à estação, todos tiveram que descer para apresentar o passaporte aos soldados suíços. Chegada nossa vez, falei com o que se dirigiu a nós, conforme tinha feito com aquela senhora no trem: “I do not speak English”, “yo entiendo español”. O soldado chamou outro guarda que veio até nós, olhou nosso passaporte e sorriu dizendo, em espanhol: “Brasil... amigos!”
Conversei em português e ele em espanhol. Ele foi bem gentil. Expliquei nossa situação e, meu amigo e eu, fomos orientados a pegar o próximo trem que estivesse saindo da Suíça em direção a Milão, e descesse na estação Gallarati, região de Varese. Esse trajeto seria uma cortesia, e foi!
Dando um último voto de confiança ao meu amigo que disse falar a língua italiana, deixei a responsabilidade dele observar os nomes das estações, a fim de não corrermos o risco de outro erro. Mais uma vez me arrependi da decisão. Ele se confundiu todo e acabamos descendo na estação da cidade de Varese.
Nesses desencontros todos, já passava das 20h. Resolvi, então, telefonar para o número que estava no roteiro. Um sacerdote atendeu, e pelo fato de já ter passado o horário da compra de passagens e não podermos retornar a Gallarati, ele se prontificou a vir nos buscar em Varese mesmo.
Uma viagem que deveria terminar, no máximo as 17h, se estendeu até 23h. Foi nessa hora que chegamos ao local determinado.
Após o jantar que terminou bem próximo às 00h, meu amigo retirou-se para seus aposentos e eu para o meu.
Dei-me conta da tensa, mas importante aventura que vivi tendo em vista que precisamos enfrentar desafios, as vezes até provocá-los, como foi o meu caso, para que possamos crescer como pessoa, descobrir nossas potencialidades...
E não foi um sonho realista como tantos que já tive! Foi realidade mesmo. Aconteceu na minha primeira viagem à Itália, ano de 1999, por ocasião do Curso Internacional para Formadores de Seminários Diocesanos, que fui participar.
Enigmas da vida!!!
[Pe. José Neto de França]
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