Nota:
Considerando a importancia do assunto para a nossa capital e a espontaneidade da forma como o foi descrito, peço permissão para apresentá-lo. maas
Sonhos de uma maceioense para sua cidade.
Rosa Cecília Wanderley Silva de Azevedo - Jornalista, Mestra em Comunicação pela Universidade de Grenoble (França) e pela Universidade de Londres (Inglaterra).
Em 2008 quando, depois de dois anos, voltei a morar em Maceió, li ou ouvi em algum meio de comunicação, que Maceió ganharia um bonde. O projeto prevê 36 quilômetros de linhas, dos quais 32 substituirão a atual linha de trem que faz o percurso Rio Largo-Maceió. Fiquei extremamente feliz com a notícia.
Pensar um bonde em Maceió sempre foi para mim um exercício de imaginação que remetia ao passado. Mais do que isso, um sonho. Lembrava de fotos antigas de Maceió que havia visto por ocasião de trabalhos escolares. As fotos geralmente traziam prédios antigos que não existem mais refletidos no rio Salgadinho. Nesse cenário eu imaginava cavalheiros de chapéu e senhoras de vestido caminhando pelas ruas e passeando de bonde numa tarde tranquila.
Os bondes foram extintos de Maceió na década de 50, muito antes de eu pensar em nascer. O Salgadinho, eu, uma maceioense nascida em 1982, infelizmente não tive o privilégio de conhecer sem os atuais cheiro e aparência repugnantes. Assim, na minha mente, Salgadinho cristalino e bonde eram dois aspectos de uma Maceió que parecia irreal.
Ver o Salgadinho limpo era um sonho que eu pensei que teria realizado em breve. Em 1996 uma candidata à prefeitura da cidade prometeu que nele se banharia ao final de seu mandato e eu, do alto da ingenuidade dos meus 13 anos de idade, acreditei…
Quanto a me locomover de bonde em minha cidade, achava que era um sonho impossível. Pensava que a possibilidade do renascimento dos bondes nas cidades brasileiras era inexistente. Apenas um sonho alimentado por um sentimento de nostalgia. No meu caso, uma idealização de um passado que não cheguei a viver.
Foi só no ano de 2004 que a idéia do bonde saiu do rol das minhas coisas imaginárias para entrar no das palpáveis. Nesse ano fiz um intercâmbio de um ano na França e morei dois meses na cidade de Lille, no norte daquele país. Lá, eu andei de bonde pela primeira vez e o fazia todos os dias! Não se tratava de um bonde destinado apenas ao turismo. Em Lille, e em muitas cidades francesas, como descobri posteriormente, o bonde compõe junto com o metrô e ônibus, as opções de transporte público.
Tratava-se de um bonde muito diferente da imagem que eu fazia. Era normal que fosse assim. Afinal, como eu já disse, bonde para mim era algo que infelizmente pertencia apenas ao passado. E os bondes franceses são a imagem do futuro. Além da aparência tão moderna que lembra uma nave espacial, segundo as brincadeiras dos intercambistas estrangeiros, eles possuem características às quais, infelizmente, o maceioense não está acostumado, pelo menos quando se trata de transporte público. São amplos, limpos, pontuais, confortáveis, com velocidade estável, acessíveis a pessoas em cadeiras de rodas, silenciosos.
Em 2006 voltei à França e vivi mais de um ano na cidade de Grenoble. Grenoble e Maceió têm algo em comum. Ambas possuem paisagens belíssimas, embora extremamente diferentes.
Enquanto a nossa Maceió tem seu mar turquesa, suas lagoas e coqueiros encantadores, Grenoble se encontra cercada pelos Alpes Franceses. De qualquer uma das largas avenidas decoradas por belos prédios, alguns anteriores à Revolução Francesa, que se iniciou nos arredores da cidade, pode-se avistar as montanhas.
Grenoble possui quatro linhas de bonde que somam 34,2 quilômetros. Apesar do serviço de ônibus também ser muito eficiente e as paradas estarem geralmente conectadas às do bonde, eu sempre preferia pegar o bonde. Muito além da eficiência, o bonde oferecia uma sensação única de conexão com a cidade. Um modo diferente de contemplá-la. Os bondes eram climatizados mas possuíam grandes vidros, como enormes vitrines, que permitiam ao passageiro vislumbrar a cidade enquanto desfilava por ela.
Todo o entusiasmo que senti no ano passado ao saber do projeto da prefeitura e da CBTU _Companhia Brasileira de Trens Urbanos_ de implantação de um VLT (Veículo Leve sobre Trilhos, outro nome para bonde) em Maceió se transformou em preocupação quando descobri que tal iniciativa corre risco se a administração da cidade não conseguir desapropriar as áreas pelas quais deve passar o bonde. O prazo para desocupação do local onde hoje funciona a Feira do Rato, no centro, era até o dia 28 de fevereiro de 2009.
A prefeitura pretende realocar os comerciantes da famosa feira e de locais próximos a ela nos mercados de artesanato e da produção e na antiga Ceasa. Mas a maioria dessas pessoas tem se mostrado resistente. É triste constatar a capacidade que o ser humano tem de se habituar e de se apegar a tudo, até mesmo a condições degradantes como as da Feira do Rato. Aparentemente, a população, que será a grande beneficiada, está sendo também a grande dificultadora da instalação do bonde. Torço para que a implantação do VLT de Maceió seja bem sucedida. E que a limpeza do Salgadinho seja a próxima meta. Continuarei a sonhar.
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