VOCAÇÃO GOLPISTA HISTÓRICA

Djalma Carvalho

Djalma de Melo Carvalho
Membro da Academia Maceioense de Letras

Talvez o título acima venha causar estranheza aos que ainda não se debruçaram em pesquisa sobre os movimentos políticos ocorridos no Brasil republicano, a partir da década de 1920, sobretudo no que se refere aos golpes de estado efetivamente consumados e aos frustrados. E tudo se deu em período pré-eleitoral ou logo depois de conhecido o resultado das eleições, com exceção do golpe militar de 1964.
Vocação histórica é o que se deduz da frequência dos fatos políticos ocorridos no curto período de 42 anos, entre 1922 e 1964.
A propósito, acabo de ler importante artigo de autoria de Jandira Feghali, médica e deputada federal pelo PCdoB do Rio de Janeiro, intitulado Nada é Coincidência, publicado em 1º/04/2015 na imprensa nacional.
A ilustre política trata das manifestações de rua, no Brasil, sua motivação política, origens, fundamentos ideológicos, conhecidos financiadores e o envolvimento nelas dos perdedores na recente eleição para Presidente da República.
Na faculdade de Direito, conheci a expressão latina “Jus Sperniandi”, tida como gíria jurídica, que significa o direito de espernear, que é reservado aos que não logram êxito em contendas judiciais.
As recentes manifestações de rua, sendo democráticas, livres, legítimas, sem violência, sem censura, sem vândalos, claramente expressam o direito de espernear, também reservado aos derrotados nas urnas no primeiro e segundo turnos das eleições passadas.
Em seu artigo, a atuante deputada refere-se a “entidades que lideraram as recentes manifestações, como a do Movimento Brasil Livre, nascido há pouco mais de um ano, porém com objetivo nublado e de representantes nada convincentes. O caldo de ódio inflado por grupos como este, tidos “autênticos”, generalizando a política como corrupta e pregando a interrupção de um governo democraticamente eleito, é mais uma tentativa de retrocesso inaceitável”.
A vocação golpista, assim entendida no período pesquisado, remonta ao começo da década de 1920. A partir daí, são conhecidos seis golpes de estado no Brasil, dois dos quais frustrados, e duas intentonas (comunista, em 1935, e integralista, em 1938). Contabilizava-se, assim, mais ou menos uma crise política a cada cinco anos. Graças a Deus, as bruxas, nesse particular, esqueceram o Brasil.
O Movimento Tenentista, por exemplo, que contestava a política da República Velha, teria nascido em 1920. No episódio conhecido como 18 do Forte, tentou-se, em 1922, impedir a posse de Arthur Bernardes, eleito Presidente da República.
Mais tarde, na Revolução de 1930, o mesmo Movimento Tenentista apoiou Getúlio Vargas, que impediu a posse de Júlio Prestes, eleito Presidente da República, e depôs o então presidente Washington Luiz. O candidato derrotado nas eleições daquele ano Instalou-se no poder, ora maquiado de presidente constitucional, ora maquiado de ditador. Tenentes foram nomeados interventores em alguns estados da federação. Graciliano Ramos, por exemplo, foi vítima da ditadura Vargas.
Em 10 de novembro de 1937, às vésperas das eleições de janeiro de 1938, em que seria fatalmente derrotado e alegando suposto plano comunista, Getúlio desfecha outro golpe, criando o Estado Novo e permanecendo no poder como ditador até 1945. Nesse período ditatorial, como sempre acontece, suprimiu-se a liberdade de expressão e criou-se a implacável censura a rádios, jornais e revistas. Vieram, em seguida, prisões, repressão, tortura e perseguição aos contestadores do regime.
Com o final da 2ª Guerra Mundial e com a queda das Potências do Eixo, conhecidas como ditaduras facistas, revigorante sopro democrático espalhar-se-ia pelo mundo afora, que viveria histórica fase de reconstrução. Em 29 de outubro de 1945, o golpe de estado, comandado pelo general Pedro Aurélio de Góis Monteiro, derrubou Getúlio Vargas, sepultando o Estado Novo. O ministro do STF, José Linhares, assumiu a Presidência da República. Golpe branco, aliás, porque Vargas ficaria “exilado” em São Borja, sua terra natal, aguardado o próximo pleito eleitoral em que seria eleito senador com expressiva votação.
A Constituição de 1946, dita por Barbosa Lima Sobrinho como “a legítima”, trouxe, logo no início do seu texto, o seguinte princípio fundamental: “Todo poder emana do povo e em seu nome será exercido.” Mas essa garantia constitucional não impediu que novo golpe de estado fosse desenhado, após as eleições presidenciais de outubro de 1955, pelo grupo udenista e com possível apoio do presidente da Câmara dos Deputados, Carlos Luz. O general Lott, ministro da guerra, abortou o golpe e garantiu a posse de Juscelino Kubitschek, eleito Presidente da Republica.
Com a renúncia de Jânio Quadros em agosto de 1961, assumiu a Presidência da República João Goulart, o Jango, vice-presidente do renunciante, que veio a ser deposto pelo golpe militar de 1964, cuja ditadura durou até 1985, último espaço de obscurantismo vivido pelo povo brasileiro.
Agora, os perdedores da eleição passada, com todo aporte financeiro de capitalistas daqui e certamente de fora, insuflam o pacato e ordeiro povo brasileiro, empurrando-o ardilosamente para as manifestações de rua. Infelizmente, nessa avalanche de ódio e paixões também são levados, inconscientemente, os chamados inocentes úteis.
Afinal, disse, com acerto, a corajosa deputada Jandira Feghali: “Tudo não passa de um oportunismo destas forças que pouco se importam com a desestabilização do país e a consequente ruptura democrática.”

Maceió, abril de 2015.






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