SAGA DO 44º ESPADA D'ÁGUA

Djalma Carvalho

Recebi, faz alguns dias, do amigo Ademir Brandão, como gentileza, o livro Saga do 44º Espada D’Água (Edições EBGE, Recife, 2005), de autoria de Aldemar Paiva (1925-2014), alagoano, radialista, poeta, jornalista, compositor, publicitário, escritor e contador de histórias.
Há uma frase primorosa de Ariano Suassuna, infelizmente já falecido, dita em seleto auditório em suas andanças pelo Brasil afora contando causos: “Gosto muito do autor que me faz rir.”
Ri muito ao ler o livro de Aldemar Paiva, que era irmão de Alberto Paiva, também falecido, colega do Banco do Brasil que residiu em Santana do Ipanema em meados da década de 1950, tendo sido fundador da AABB local, inaugurada em 8/7/1957. Em dezembro desse mesmo ano, foi realizado elegante e badalado baile de réveillon nos salões do novo clube social da cidade.
O livro de Aldemar Paiva, em sua primeira parte, trata de um grupo de debochados amigos da elite social alagoana, que viveram na década de 1940, por aí, apreciadores de bebidas alcoólicas e que resolveram criar um batalhão ou grupamento militar de araque em Maceió. Cada componente recebeu patente de tenente, capitão, major e coronel. As reuniões do grupamento eram sempre realizadas em bares e botecos escolhidos a dedo, para preparação do devido combate etílico. Uma gozação capaz de levar o leitor às gargalhadas com as peripécias do grupamento.
Sobre o livro, disse o pernambucano Marcelo Alcoforado, jornalista e escritor, autor das orelhas: “Sucesso cinematográfico, ‘o Exército de Brancaleone’ é uma bem-humorada sátira da cavalaria medieval italiana, em que a figura central, Brancaleone, é um cavaleiro trapalhão a liderar um minúsculo exército de esfarrapados em busca de um feudo.” Acrescentou ainda o referido jornalista: os combatentes do 44º Espada D’Água, diferentemente, eram “defensores intransigentes dos prazeres das libações alcoólicas”.
Na segunda parte do livro, Aldemar Paiva conta “causos e mais causos” por ele anotados durante sua vida artística de animador de programas de rádio e de televisão, no Recife.
Certo dia, Aldemar recebeu em sua sala o palhaço Treme-Treme, que na vida real se chamava Pacheco. Nos shows de auditório, Treme-Treme fazia dupla animada com Corrupita, sua mulher. Davam-se bem nos espetáculos, mas no lar viviam às turras, brigando. Disse a Aldemar que sua vida virara um inferno, a ponto de pensar em suicidar-se. Corrupita, sua mulher, toda semana lhe pedia mil reais. Ele, Treme-Treme, dizia-se cuidadoso no lar, fazia feira, pagava aluguel, colégio dos meninos, etc.
Pergunta-lhe Aldemar: “Pra que Corrupita, sua mulher, quer mil reais toda semana?”
Resposta de Treme-Treme: “Sei não, seu Paiva. Ela pede, mas eu nunca lhe dei!”
Há outro causo contado à página 85 do livro. O alagoano Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, dicionarista, era primo de Aldemar Paiva. Certo dia vestiu seu fardão para ir de táxi a uma festiva reunião na Academia Brasileira de Letras.
Como se sabe, o fardão de acadêmico é impecável: bordado a ouro, colar, platinas, espadim e chapéu de dois bicos. O taxista, português recentemente chegado ao Brasil, espantou-se com aquela estranha e impoluta figura. Por algumas vezes, tentou vencer a curiosidade. Somente o fazendo ao final da corrida, perguntando a mestre Aurélio:
– Excelência, sois rei?

Maceió, maio de 2023.

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