FALECEU NADINHO DAS ALAGOAS

Djalma Carvalho

Soube, com muita tristeza, do falecimento de Reginaldo José Raymundo, funcionário do quadro de portaria do Banco do Brasil, agência de Santana do Ipanema. Estava aposentado desde o ano 2000. Com a esposa, filhos e netos, ele residia em Santana do Ipanema, sua cidade natal, onde faleceu.
Sobre o falecido, em abril de 1978 publiquei a crônica intitulada Nadinho das Alagoas, inserida no meu livro Chuviscos de Prata (Gráfica e Editora da Ufal, Maceió, pp.103/104, 2000).
Antes de transcrever o texto da crônica, agora novamente publicada em homenagem póstuma ao pranteado ex-colega de trabalho, cumpre-me fazer um sentido depoimento. Em setembro de 1990, nomeado gerente-geral da agência do BB em Santana do Ipanema, deparou-se-me, logo nos primeiros dias ou meses de trabalho, um problema administrativo bastante sério. O Banco acabara de reduzir o quadro de pessoal da agência, removendo os funcionários excedentes, aí incluído o pessoal de portaria.
Nessa esteira, encontrava-se Reginaldo José Raymundo, humilde servidor, cuja modestíssima origem eu conhecia. Pai de cinco ou seis criaturas, com filhas já adolescentes, o que seria desse inocente pessoal, que nunca deixara a cidade natal, para passar a morar na periferia de uma capital? Sem traquejo e sem conhecimento da vida nos grandes centros urbanos, seria fatalmente um desastre para aquela pobre e humilde família.
Imediatamente, expus a situação dessa família ao superintendente regional, que, também sensibilizado, tornou sem efeito a iminente transferência do servidor.
Eis a crônica.
“Nadinho é o apelido de eficiente auxiliar de portaria da agência do Banco do Brasil em Santana Fo Ipanema. Tipo modesto, alto, forte. Deve estar na faixa de 25 a 30 anos se idade. Filho de antigo gari da prefeitura municipal. Aprendeu a ser humilde desde cedo. Solícito, sem ser subserviente. Por ser o mais antigo funcionário do quadro de portaria da agência, é o encarregado de abrir e fechar as portas do prédio. É quando aproveita para fiscalizar o pessoal encarregado da limpeza e do asseio da agência.
Antes de entrar para o quadro de pessoal do Banco, fazia biscates. Hoje, dedica-se apenas ao trabalho bancário. Mas ao seu tempo na agência é preciso acrescentar o tempo de serviço na “república dos bancários”. Ali fez amigos e futuros colegas. Vem dessa época a fama de seus “métodos” de trabalhar. Com ele, o serviço sai em dia, sem atropelo. Todo o pessoal da agência o admira. Motivos para isso não faltam. Nunca faz cara feia para quem lhe pede favor. De uma coisa, porém, não gosta: dos “elogios” feitos pelos colegas, que dizem ser o Nadinho o “fazedor” do melhor café ruim da agência.
Um de seus hábitos bastante salutar: caçadas nos fins de semana. Então, põe roupas grossas, botinas 44, chapéu à cowboy”, bornal a tiracolo, espingarda aprumada – e lá se vai ele pelas caatingas a dentro. O resultado é como “pé de cobra”: ninguém nunca viu. Como se não bastasse tanta coragem, ainda pratica judô. Nas horas vagas faz “bico” como eletricista.
Pouco vai à AABB. É que, para ele, só existe uma festa pra valer: o carnaval – “folia do povão”. Aí, sim. Prepara fantasia de zorro, de bandido, colete preto, óculos escuros e o mesmo chapéu à “cowboy” das habituais caçadas. Volta ao Banco somente na quarta-feira de Cinzas. É lá que se destaca a sua versatilidade.
Trabalha em várias “Carteiras”. Algumas têm nomenclatura esquisita, inventadas no cotidiano de trabalho e imaginação.
Cópia de balancete: trabalho limpo, cuidadoso e de muita responsabilidade. Com um só cochilo, a “vaca pode ir pro brejo”. Reclama todo dia da má qualidade das gelatinas. Que Carteira é essa, Nadinho?
– Copiação!
Colabora com o pessoal da Tesouraria no empacotamento de dinheiro. Os melhores “amarrados” da agência saem de suas mãos. Serviço estafante em época de muito movimento. Guarda em seus arquivos a estatística com a quantidade de dinheiro que ele já amarrou até hoje. E essa Carteira?
– Amarração!
Também está encarregado da personalização de talonários de cheques, partidas e ficha gráficas. Trabalho executado diariamente na máquina “Adressograph”. E essa Carteira, Nadinho?
– Batição!
Finalmente, quando falta algum funcionário do serviço de limpeza, não deixa a agência suja e empoeirada. Mãos à obra. Toma a iniciativa de espanar os balcões, limpar mesas e cadeiras, passar a vassoura nas escadas e no assoalho. E o nome dessa Carteira?
– Oxente, só podia ser Varrição!”

Maceió, abril de 1978.

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