POMBAL E NHEENGATU

Djalma Carvalho

Djalma de Melo Carvalho
Membro efetivo da Academia Maceioense de Letras

Quem tiver a oportunidade de caminhar pelo centro vital de Lisboa, a partir do Rossio e da Praça dos Restauradores, vai encontrar no alto da Avenida da Liberdade a Praça Marquês de Pombal. No centro dessa praça há a famosa Rotunda (rotatória), na qual foi construído o grandioso monumento em homenagem ao autoritário estadista que controlou o poder em Portugal, de 1750 a 1777, como principal ministro do rei Dom José I.
Sabe-se que, a par da trágica história de Portugal, o devastador terremoto de 1º de novembro de 1755 destruiu mais da metade de Lisboa. Tudo ali virou escombro. Dizem os historiadores que 15 mil pessoas, aproximadamente, morreram vítimas desse terrível fenômeno sísmico, que também atingiu boa parte do sul de Portugal.
Coube a Sebastião José de Carvalho Melo (1699-1782), Marquês de Pombal, a gigantesca tarefa de reconstruir a capital portuguesa, dando à região destruída, hoje conhecida como Baixa Pombalina, linhas arquitetônicas totalmente com características nacionais.
Marquês de Pombal, durante o exercício de secretário de Estado do reino, acabou com a escravatura em Portugal continental em 1761, com os autos de fé e com a discriminação dos cristãos-novos, embora a Inquisição portuguesa somente tivesse sido extinta 1821. Tentou, também, impulsionar Portugal para a era do Iluminismo, filosofia que se caracteriza pela confiança na razão e no progresso e, principalmente, pelo incentivo à liberdade de pensamente, à liberdade de expressão.
Pombal ainda introduziu, a partir de 1759, importantes reformas no ensino em Portugal e, especialmente, na colônia (Brasil), como se verá adiante. Também extinguiu o regime de capitanias hereditárias no Brasil. Transferiu, em 1763, a sede do governo-geral da colônia, então em Salvador, para o Rio de Janeiro.
Quanto à reforma do ensino no Brasil, em particular o uso obrigatório do idioma português, surgiu-me o estranho vocábulo Nheengatu, que completa o título destas notas.
Pois bem. Em mãos tenho, com dedicatória de William Figueiredo, intelectual de Campina Grande, o primeiro volume do primoroso compêndio A Paraíba nos 500 Anos do Brasil (Editora A União, João Pessoa, 2000), publicado sob os auspícios do governo da Paraíba. Nele encontro, para demorada leitura, importantes depoimentos de consagrados jornalistas, escritores, historiadores e intelectuais, não só da Paraíba como do Brasil afora.
Detive-me na leitura do fascinante texto assinado por Arnaldo Niskier, jornalista, escritor e Doutor em Educação, tratando do instigante tema educação e as inúmeras reformas do ensino no Brasil, a partir do período colonial até nossos dias. Refere-se, inicialmente, o articulista à objetiva e curta frase do paraibano João Lyra Filho, educador e filósofo, que disse: “A educação é a arma de cabeceira da democracia.”
Disse Arnaldo Niskier: “Apesar das várias reformas do ensino implantadas no período imperial, tais como as de 1827, 1854 e 1879, o Brasil não contava com uma única universidade na data da Proclamação da República. O ensino superior estava restrito a duas faculdades de Direito, duas de Medicina e uma de Engenharia (...) e a estabelecimentos destinados à formação de oficiais do Exército e da Marinha.” Até então estudantes, filhos de famílias economicamente bem-dotadas, estudavam ou prosseguiam seus estudos na Europa, especialmente em Coimbra, Lisboa e em faculdades francesas.
Seguiram-se outras reformas: 1832, 1882, 1883, 1890, 1900, 1901, 1911, 1931, 1954 e 1961, esta última denominada Lei de Diretrizes e Bases.
“Nas últimas décadas – ainda com a palavra Arnaldo Nislkier – particularmente nos anos 60, a grande afluência de autores internacionais descaracterizou completamente o nosso ensino.” Por essa época, a proporção era de 80% de autores estrangeiros e de apenas 20% de autores nacionais, com temas destinados à formação do nosso magistério (pedagogia). “... E assim continuaram as eternas reformas educacionais do Brasil, de olhos abertos para modelos estrangeiros, mas de olhos fechados para a realidade educacional do país”, no dizer do historiador José Antônio Tobias (citado por Arnaldo Niskier). Países que exerceram papel preponderante na educação brasileira: França, Estados Unidos, Inglaterra, Suíça e Alemanha. Agora, certamente, a Colômbia...
Voltemos ao Marquês de Pombal. Em 1759, usando de sua autoridade de super ministro, Pombal expulsou os jesuítas de Portugal e da colônia. A instrução no Brasil estava a cargo dos padres jesuítas e de outras ordens religiosas. A preocupação era “ensinar Latim e Retórica e alguns elementos de Grego a quem mal sabia ler e escrever em Português”, conforme assinalou o autor no ensaio referido.
No mesmo decreto, foi proibida, no Brasil, a utilização do Nheengatu, língua tronco do Tupi (mistura das línguas nativas com o português) falada por vários povos indígenas e por bandeirantes no litoral brasileiro. Tornou-se, então, obrigatório o uso do idioma português no Brasil. Com a providência de Marquês de Pombal, o Brasil deixou de ser um país bilíngue. O português passou, afinal, a ser a língua da unidade nacional, oficial, falada em todo o território brasileiro.
Estava decretada a primeira reforma do ensino no Brasil.

Maceió, dezembro de 2018.

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