O PINGUÇO FLEX NA FARMÁCIA DE XOGOIÓ

Crônicas

por Remi Bastos

Desde os tempos remotos que a bebida alcoólica se apresentou como um líquido indispensável em qualquer situação fosse ela festiva ou passional. No entanto, há pouco mais de um século que a saideira passou a fazer parte das mesas de bar e dos botecos espalhados por este Brasil a fora. Em Santana, por exemplo, os dias sempre se mostraram favoráveis às delícias de uma cachacinha nas suas diversas formas ou mesmo da famosa loira suada, a cerveja. Conheci aí anos atrás o Chicó, um biriteiro típico de pé de balcão. O Chicó era uma figura de média estatura, quase mulato, analfabeto, fumante de cigarro de palha ou do famoso lasca peito e que trabalhava de botador de água em ancoretas sobre o lombo de jumentos para um proprietário de uma bodega muito conhecida na cidade naquela época, a Bodega de Seu Oséias”, situada no Bairro do Monumento, nas adjacências da Pracinha, atualmente Praça Dr. Adelson Isaac de Miranda. Pois bem, o Chicó costumava todas as tardes tomar umas pingas na Bodega de Seu Oséias. Chegava de mansinho e anunciava: “bote uma cachaça pra eu”. A princípio o Seu Oséias fingia não ter ouvido, mas o Chicó repetia tantas vezes fosse necessário. Finalmente o copo era posto ao balcão, enquanto o bodegueiro apanhava um litro da rinchona e despejava no copo. Chicó entornava o líquido, depois se curvava com umas das mãos sobre o balcão e jogava a sobra no chão acompanhada de uma cuspida típica, em seguida dizia, bote outra. Após ingerir três ou quatro doses seguindo o mesmo ritual falava, junte com as de “ontonte” e se mandava.
Atualmente, em pleno janeiro de 2014, as manobras na arte de biritar continuam a mesmas, apenas mudou o linguajar. O patrulheiro rodoviário aposentado, Xogoió, não tendo como gastar as economias que juntou durante a sua vida profissional no Carié, decidiu se transferir para Maceió, onde resolveu montar uma farmácia nas proximidades do Mercado Central, justamente aí onde predominam muitas bodegas e pinguços. Vez por outra aparece um na “Farmácia do Xoga” para comprar sonrisal. Certa vez um baixinho tipo Chicó entrou na farmácia num pé aqui outro acolá levando na mão um copo contendo uns quatro dedos da cachaça Galo Negro. Colocou o copo sobre o balcão enquanto anunciava em meio aos arrotos, “bote aqui no copo dois sonrisal e dois ingovi”. O Xoga o atendeu ignorando aquela mistura. Delicadamente falou ao pinguço: meu amigo o senhor vai misturar cachaça com sonrisal e engove? Ao que o bebum respondeu: tem nada não meu chefe, eu sou flex.

Aracaju, 02/01/2014

Comentários