hoje é o aniversário do meu Pai
e é por isso que subitamente
cessaram todos os violinos
para dar lugar aos sinos
que trovejam dentro de mim
pois ainda sou aquele mesmo menino
traquino, vivenciando agora
a infância quase senil
que te não deixaram viver, meu Pai
sou ainda aquele mesmo menino
a quem deste o cavalo bambino
e o leão chamado bongô.
sou ainda aquele mesmo menino
que tomaste pela mão
e levaste para conhecer
navios e golfinhos
no cais do porto de Maceió.
em mim não morreu a infância.
nela me foste fiel até o fim.
nem o dia terrível de ácido, óxido e fel
em que te mataram, Pai!
continuamos vivos todos, inclusive eu e tu
pois nem cessa a dor nem caminham
os ponteiros no meu relógio interior
hoje é o dia do aniversário
de quem mais eu quis no mundo
- e de quem eu mais preciso no mundo, Pai: Tu
e é por isso que tanjo as hienas
que no teu funeral sorriram
e amaldiçôo chacais e maldigo corvos e urubus.
bastar-nos-á, a nós dois, o coral das mães-da-lua
que hoje cantará ao luar do sertão
no pátio da ancestral casa dos coqueiros
na capela do cemitério de Santa Sofia
na camoxinga, nas camongas, no cachimbo eterno
e nas ladeiras todas da nossa,
sempre e para sempre nossa Santana do Ipanema,
com o contraponto do meu choro em dó maior.
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