O Ferreiro do Cachimbo Eterno

Crônicas

Remi Bastos

Ali na encosta da Serra do Cruzeiro o pequeno povoado fugia da monotonia através das batidas moldando o ferro, pelo ferreiro Zé Vicente. O fole ou forja atiçava o fogo transformando o carvão em brasas ardentes, emitindo um ronco próprio cada vez que o cabo ou suporte era acionado.
Vez por outra o Zé Vicente descia a ladeira do Cachimbo Eterno para adquirir pedaços de ferro nas oficinas mecânicas da cidade, fontes da matéria prima responsável pela cinética do seu ofício. O seu ateliê estava sempre sortido com peças trabalhadas, tais como foice, machado, martelo, estrovenga, peças de arado de aiveca, cadeados com diferentes timbres, etc. No interior da humilde casa de taipa retalhada no barro, podia-se observar uma gaiola sustentada por uma corrente presa ao esteio, que acomodava um ferreiro ou araponga cujo canto soava como um martelo de ferreiro batendo numa bigorna e que se fazia ouvir a distância.
Nas minhas caçadas com o amigo Benedito, margeando o “Panema” na falda da Serra do Cruzeiro era comum ouvir o ferreiro de Zé Vicente ecoando o seu canto entre as catingueiras situadas às margens das areias ardentes do velho rio. Hoje não existe mais aquela pequena fundição, o Cachimbo Eterno recebeu a denominação de Bairro Domingos Acácio em homenagem a um cidadão de mesmo nome que residiu e faleceu no antigo povoado ali na encosta da serra; a forja já não sopra com a mesma vontade de ativar o fogo; morreu Zé Vicente e com ele a batida no ferro e o canto do ferreiro.

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