HOJE O QUE SÃO

Crônicas

Lúcia Nobre

Elas moravam no interior daquela cidade, ainda cheia de preconceitos. Digo ainda, mas, infelizmente hoje existe tanta injustiça neste mundo que tanto cresceu, evoluiu. Não entendo e nunca entendi a razão de certas pessoas acharem ser melhores que as outras. Classificar pessoas por raça, religião, profissão ou até pela aparência física. Elas sofreram discriminação pela profissão do pai. Era um pequeno agricultor e foi para a cidade tentar sustentar sua família, trabalhando como autônomo? Não possuía sua própria casa, alugou o seu espaço, e cumpria muito bem sua tarefa. Foi até considerado mestre, pelos colegas da profissão. As filhas maiores trabalhavam no comércio. Tinham o propósito de colocar as irmãs menores na escola, ajudando, assim, aos pais. Seu Antonio e dona Maria, bem que queriam que todas as filhas frequentassem a escola. Ficou acertado que as mais velhas trabalhariam. Assim era o dia a dia da família. Encontravam dificuldades com amizades e na escola. Às vezes, até as professoras eram desagradáveis, no que se refere ao tratamento com algumas alunas. Não davam importância, ou melhor, desprezavam as ruas que certas alunas moravam, as profissões dos pais e, sobretudo, a certas limitações que as crianças poderiam ter. Muitas vezes, as irmãs mais velhas saíam do trabalho para a escola, tomar satisfações com certas professoras abusadas que maltratavam suas irmãs. Duas das irmãs casaram e saíram da cidade. Outra, que ficou, continuou a custear o estudo e a sobrevivência de irmãs menores e sobrinhos que estavam sob sua responsabilidade. Laura namorou, noivou, mas não conseguiu concretizar seu sonho de construir o seu próprio lar. Continuou com a responsabilidade com os familiares.
Seu Antonio, depois de alguns anos de trabalho, construiu uma casa para a família. Até que um dia, um parente colocou os olhos na casa que acolhia aquela família. Moravam ali, as irmãs mais novas e os sobrinhos que dependiam da única tia que continuava responsável. Eles cresceram e emanciparam-se. Mas, Laura assumiu responsabilidade com os pais, já estavam velhos. Laura trabalhava para o bem estar de todos. Por incentivo de um parente ambicioso, a filha convenceu o pai a vender a casa e morar em Maceió. Lá, comprariam uma casa com o dinheiro da que fosse vendida. Seu Antonio vendeu seu único bem material ao parente e nunca recebeu o valor acordado. Perderam a residência, saíram da cidade, e Laura continuava trabalhando. Nunca mais compraram outro lugar para morar. Laura pagava o aluguel e todas as despesas. Certo dia, Laura e uma irmã que ficou viúva compraram uma casa. Um dia, um sobrinho precisava de uma quantia para completar a compra de uma bela casa em um lugar privilegiado. Pediu que as tias vendessem a casa que lhes pertencia e lhe emprestassem o dinheiro. Assim fizeram. Ficariam todos juntos, a bela casa oferecia conforto para toda família. As duas ganhariam um quarto confortável, mas ficavam estabelecidas certas restrições, para que morassem ali. Nova vida para elas e para os habitantes dali, a família do sobrinho. Até que durou algum tempo a convivência. Com o tempo, ninguém mais se entendia. Cansaram da vida em comum. Jovens querendo espaço e liberdade e velhas incomodadas e incomodando. No tribunal familiar, ganham os donos da casa. E agora, qual o destino das idosas que se dedicaram aos mais novos? Não possuem sua própria casa e a do sobrinho não poderá mais acolhê-las. Idosas e com salário mínimo da aposentadoria, que nem supre suas necessidades básicas, remédios, alimentação e outras.

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