Uma das coisas mais preciosas que valorizamos é retratarmos o nosso tempo, e a vivencia das coisas, dos fatos e acontecimentos guardados como memórias inexploradas, pois como diria a minha “vó bê”, “na cabeça da gente tem um filme longo meu filho...”. Essa ideia me levou aos mais diversos cenários durante toda a minha existência. Certo dia em uma conversa com o meu pai, o Velho Valter Oliveira, acerca de alguns fundadores da Comunidade em que moramos que abrange as ruas Professor Enéas Araújo, São Paulo e Rua da Praia. Essa conversa me remeteu a minha infância, quando me tornei ajudante de um ilustre morador daquela localidade, tratava-se de José Euclides dos Santos “Seu Ocrido”, como era carinhosamente conhecido pelos moradores. Euclides foi o construtor da Rua da Praia, pois ali possuía um sítio com mangueiras, bananais e outras árvores frutíferas, foi com ele que observei os primeiros passos de empreendedorismo, que me serviu como norte isso, apenas com os meus 12 anos de idade. Construir era preciso! O seu Euclides, com o seu espírito de liderança, arregimentava jovens e adultos na empreitada de construir as primeiras habitações de taipa, na qual utilizávamos o barro vermelho e varas de madeira para erguer as casas, todos os fins de semana. Durante esse período fui nomeado assessor do empreendedor, tipo Chefe da Turma, com a missão de observar quem estava dando mole no serviço, e de acordo com o trabalho dos demais as moedas seriam distribuídas, lembro que foi nesse período que também recebi a alcunha de “Seu Vartinho”, dado a investidura do cargo; dizia o meu chefe: “Chefe que se preza, tem que ser chamado de Senhor...” Isso me acompanhou até os dias de hoje.
Um fato interessante também foi lembrado pelos meus pais, as minhas traquinagens de fugir de casa para mergulhar nas águas vividas na época do Rio Ipanema, a contragosto da minha genitora Maria Helena (Dona Nirinha), que vivia a nos repreender pelo perigo das cheias e alertava “vocês sabem que o panema quando enche vem buscar um...” mas isso, nem me convencia mesmo com as ameaças de uma boa surra. Um dia desses, resolvi dar uma fugidinha, e teimoso atravessei o rio para o outro lado da margem, e a Dona Nirinha, a me convidar a voltar com uma correia de coro cru na margem oposta. A estratégia foi vencê-la pelo cansaço, e logo isso se deu. Como ainda era pela manhã, a questão era como chegar a casa, sem ter que levar umas boas palmadas, coisa que nunca aconteceu nem a mim nem aos meus irmãos. Resolvi pensar e passar o dia por lá mesmo, pegando piaba e improvisando meu almoço. Já à tardinha, resolvi pegar um cochilo nos vasos de zinco de propriedade do seu Euclides, recipiente utilizado para o armazenamento de sementes de feijão, que ficavam espalhados pela rua. Como plantador de feijão, a festa era grande nas batas de feijão que me lembro vagamente das canções engraçadas, entoadas pelos batedores de feijão. Mas, e o vaso? Bem, a voz da minha mãe a essa altura já estava rouca de me chamar pelas redondezas, e de perna cansada de me procurar. Nem me dei conta, mas já estava à anoitecer e havia caído no sono, ao acordar me deparei com um sapo cururu, frio que ficou ao meu lado o tempo todo, dei um grito estarrecedor fui notado pela minha mãe, e além da bronca tive que conviver com o deboche dos irmãos e primos “literalmente tomei no zinco” do seu Euclides.
A crônica relata de forma carinhosa e respeitosa e tem finalidade de ressaltar a importâncias das pessoas que ajudaram na construção dos saberes adquiridos e acumulados ao longo do tempo.
Santana do Ipanema-AL, 19 de julho 2012.
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