SERTÃO DE BEIRADEIRO

Crônicas

Carlito Lima

A VIAGEM

No último fim de semana viajei com o amigo Abynadá e nossas respectivas ao Recife para o lançamento do livro “Sertão de Beiradeiro” do irreverente e querido paraibano Zelito Nunes. Ônibus confortável, de primeira linha, moderno, nem na Europa viajei num igual. A Real Alagoas de parabéns, os novos executivos são luxuosos, ar condicionado, banheiro; sentei-me numa poltrona reclinável estratégica, em frente à telinha de cinema, fui obrigado a assistir dois filmes, Rock VIII e Avatar, tudo bem, nada é perfeito.

A FESTA

Num bem organizado salão da AABB nos Aflitos, Zelito alegre, feliz, recebia os amigos. Gente vinda da Paraíba, Ceará, das Alagoas. Encheram o enorme salão. A fila de autógrafos durou 4 horas e 37 minutos, arrodeou o quarteirão. Segundo o Papa Berto I, em certo momento ele mandou um sacerdote xeleléu contar as pessoas na fila, tinham 897. A festa rolou, muita poesia, música de primeira qualidade, uma mostra viva da forte cultura nordestina, brasileira. Foram bons momentos, revi amigos e colegas da Igreja. Cardeais, bispos, padres e madres da ICAS puxavam o saco do sacrossanto Papa Berto I. Por sorte e esperteza sentei-se à mesa papal onde rolava muita cachaça, uísque e bom tira-gosto. Tudo por conta do aniversariante Bispo Júnior do Bode, jovem talentoso, poeta dos bons, nos presenteou com mesa farta. Tenho vaga lembrança, o Papa Berto me fez falar ao celular com a musa do Jornal da Besta Fubana, a Madre Superiora Hellen Quirino, cronista de alta cepa, textos bem humorados, cheios de erotismo, tornou-se a fantasia dos leitores do JBF. Pena, a amnésia alcoólica fez esquecer a conversa com essa mulher fabulosa, moradora de minha imaginação libidinosa. Mas um dia há de chegar, tenho certeza, a verei ao vivo e a cores, como nos meus sonhos lascivos.

O LIVRO

Para a massa ignara e preguiçosa que não tem dicionário, beiradeiro, segundo o Aurélio, é uma pessoa rústica que mora nas vilas sertanejas ou pequeno comerciante às margens das estradas. Zelito é, e se intitula beiradeiro, adjetivo mais adequado não existe para esse advogado de Monteiro – Paraíba, morador na capital, nesse Recife amado por toda nação nordestina, centro da resistência cultural de nosso povo que antes de tudo é um forte, como diria o Euclides. De uma escrita límpida, sem arrodeio, Zelito sabe contar uma história como poucos. Seus livros ficam em minha biblioteca da mesinha de cabeceira, antes de dormir gosto de ler texto alegre, sonhar tranqüilo faz bem a saúde, os livros de Zelito são terapêuticos, suas histórias de sertanejos autênticos pertencem ao Brasil real como diz Suassuna. “Sertão de Beiradeiro” é livro de cabeceira. Além das autênticas histórias, a edição tem o primor, o capricho das Edições Bagaço de Arnaldo Ferreira. Capa bem elaborada, original, arretada! Na contra capa, uma frase de Jessier Quirino faz inveja aos mais sofisticados frasistas da literatura brasileira: “Quem tá montado em razão não carece de espora”.

UMA HISTORINHA DO BEIRADEIRO

Não posso deixar de contar uma história tirada do livro, essa deixou minha mulher às gargalhadas no ônibus de retorno. Faz entortar a cabeça de qualquer sociólogo tentando compreender a alma das personagens reais de Zelito, nem Gilberto Freire seria capaz.

“Luzia, morando na capital paraibana, tinha uma paixão especial pelo astro mundial do “pop rock”, o ex-negro Michael Jackson. Sabendo pela televisão da sua vinda ao Brasil, telefonou ao filho Totonho (morando no Rio), pra lhe fazer um pedido especial: queria que ele fosse ver o Michael Jackson, na favela da Rocinha.

Totonho um militante ativo da causa negra, indignado diante das atitudes alienadas do ídolo americano, não poderia jamais atender aos reclamos da sua honrada e querida mãe.

- Totonho, meu filho, veja quanto custa o ingresso, se for preciso, eu sou capaz de mandar o dinheiro! Vá ver Michael Jackson por mim, já que eu não posso ir aí!

- A senhora me desculpe, mas eu não vou não, mãe, aquilo é um negro safado que quer ficar branco! Aquilo é um traidor do nosso movimento e eu não vou, não!

Luzia do outro lado da linha, não se conteve:

- Também, Totonho, só quem gosta de ser negro és tu! “

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