O dia 18 de janeiro de 1965 teve uma importância fundamental na história da minha vida. Ingressei no Banco do Brasil. Realizei um sonho que acalentava grande parte dos jovens interioranos de então, principalmente aqueles de origem de família humilde, como era o meu caso. Aproximadamente às 11:00 horas daquele dia encontrava-me no meu emprego na Casa Ideal, de propriedade de Seu Marinheiro, quando meu inesquecível amigo João Farias Filho – funcionário do referido Banco – me transmitiu a notícia de que havia chegada a ordem para minha posse e que eu deveria assumir meu novo emprego às 13:00 daquele mesmo dia. De imediato, comuniquei o fato ao meu patrão, o qual externou sua alegria pela minha vitória e, ao mesmo tempo, lamentou a perda de um empregado de mais de 05 anos de labuta no seu estabelecimento comercial.
Como não dispunha da indumentária necessária para a apresentação, desloquei-me até as Lojas Paulistas para adquirir uma camisa social e uma gravata, para compor o vestuário exigido para o exercício de minhas novas funções.
Para consolidar minha assunção naquele estabelecimento bancário, fui recebido pelo funcionário Djalma de Melo Carvalho que, cumprindo o ritual, providenciou a minha apresentação aos novos colegas os quais, numa forma fraternal, desejaram à minha pessoa votos de boas vindas. Naquele momento tive uma sensação de surpresa e orgulho, quando o Djalma colocou à minha disposição, além do birô e da cadeira para minha acomodação, concedeu, também, uma máquina de escrever Remington, uma máquina de somar Burrough’s e uma calculadora de manivela. Ditos equipamentos considerados uns verdadeiros dinossauros, nos dias atuais.
Para não fugir à regra, não consegui escapar do famoso “trote”, que era dado nos calouros recém empossados. Alvacyr Rodrigues de Lima – o Careca – me fez chamar no saguão da agência, em voz alta, um cliente fictício, de nome Jacinto Ferro Aquino Rego. Para meu escabreio, foi uma algazarra geral.
Naquela época, quando o Banco do Brasil funcionava como fomentador da atividade agropecuária, voltada para pequenos produtores, houve um incremento muito grande de funcionários. Além dos aprovados do lugar (eu, Cloves Damasceno, Hélcio Gabriel, Jarbas Carvalho, Manoel Cirilo, Narciso Alécio e Paulo Silva), outros vieram de vários municípios de Alagoas, principalmente de Maceió. A princípio notavam-se certos conflitos de postura e de costumes entre os nativos e os “forasteiros”, principalmente por parte daqueles de origem cosmopolita. Entretanto essas “discórdias” tinham mais um propósito de gozação do que de deboche. As dissensões se acentuavam quando o assunto era a preferência pelas iguarias consumidas como tira-gosto, nas ocasiões em que os grupos se juntavam para celebrar o culto ao vício da embriaguez. Enquanto os matutos cultuavam a buchada de bode, a carne do sol, o guisado de carneiro, a galinha guisada ou ao molho pardo, a rabada de boi e de porco, os pracianos defendiam o consumo do marisco, do camarão, da lagosta, do sururu, do caranguejo, do siri, e de outros sofisticados manjares que eram trazidos por eles, semanalmente, da capital.
O colega Ulisses Braga – o Clarinete – era um mestre em “inventar” guloseimas, para acirrar cada vez mais o “conflito” entre as partes. Em uma determinada ocasião ele trouxe, de Maceió, um queijo gorgonzola, para ser degustado no final de semana, acompanhado de “louras suadas” e outras similares. Falou “mundos e fundos” do novo produto. No dia certo da degustação, Ulisses, ao abrir a geladeira da república, deu por falta do “badalado” petisco. Imediatamente interpelou Dona Zefa, a serviçal:
– Dona Zefa, cadê aquele queijo que eu trouxe domingo, de Maceió?
– Ah, Seu Uliço, ele tava mofado e eu botei no lixo.
recife-abril/2010
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