Crônica enviada por Albani Vieira da Rocha e está publicada em http://7enconasa.wordpress.com/2010/03/30/cronica-de-uma-agua-abencoada
Eis-me aqui às margens do São Francisco, no lugar onde nasceu a beleza, segundo cantava o Velho Lua. Estou com um pé em Juazeiro e outro em Petrolina, duas coisas que eu acho lindas, num gostoso vai e vem, com o Rei do Baião no meu pé de ouvido.
Ao contrário do que podem pensar meus amigos de copo e de cruz, uns cabras que gostam de comer água e beber com farinha, não vim aqui necessariamente para comer água nem beber água que passarinho não bebe. Estou aqui trabalhando, escrevendo, reportando.
Pro seu governo, talvez você não saiba, mas para se produzir um quilo de carne são utilizados, em média, de treze a quinze mil litros de água. Então, a bem da verdade, essa verdade límpida e cristalina, a água não é bebida, mas sim comida. Nós a comemos.
Bem, cá estou como um dos jornalistas convidados pela Articulação no Semi-Árido Brasileiro, a ASA, para um evento que ajunta uns quatrocentos brasileiros, homens e mulheres do campo, pequenos produtores que, quietinhos, quietinhos, estão fazendo uma revolução invisível.
Eles estão aqui, às margens do Velho Chico, para falar de terra, água, vida, comida, produção. E para mostrar sua cultura, fazer suas artes, pão e poesia, pois ninguém quer só comida, todo mundo quer comida, diversão e arte, e também quer encontrar saída para qualquer parte.
A ASA é uma rede social que abraça umas oitocentas e tantas entidades e que, juntinhos e quietinhos que nem formiguinhas, vão espalhando cisternas e mais cisternas pelas veredas dos grandes sertões, para aproveitar cada pingo da chuva, pois chuva nessa região, como se sabe, é difícil.
Como na música de Caetano, feita por aqui, tanta gente canta, tanta gente cala, tantas almas esticadas no curtume, sobre toda ponte, sobre toda sala. Juazeiro nem se lembra desta tarde, Petrolina nem chegou a perceber. Mas eu ouvi um pequeno produtor proclamar aqui às margens do Velho Chico, como se fosse o brado às margens de um Ipiranga:
“Quem tem ASA não tem sede”, ele disse, cantando como um passarinho.
Não é mais uma andorinha só. Já são quatrocentas formiguinhas que, quietinhas e invisíveis, mas com ASA, fazem uma pequena grande revolução. Pois é verdade mesmo – “quem tem ASA não tem sede”.
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