RIMAS QUEBRADAS

Cicero de Souza Sobrinho (Prof. Juca)

I
Admiro o poeta que tão bem descreve a dor
Admiro cada rima que é enfeitada com fulgor
Com estilo e cadência, e sem sofreguidão
Mas desdenho da ignorância de quem na arrogância só escreve sem “paixão”.
Ilustrando “folhas secas” – e a vida? ilusão.
Mui distante de seus “riscos” e da grande multidão.

Nem todo mundo sabe ler, nem tampouco escrever,
os motivos são diversos, basta olhar pra poder ver
nem todo mundo foi à escola, nem todo mundo estudou,
nem todo mundo é pessoa, esse DIREITO ainda não chegou,
Que poema merece o povo? Devo escrever em forma de acalanto,
talvez use Cervantes: um suspiro em meio ao pranto!

A grande horda bem vestida é culpada de tal barbárie
de negar aos pequeninos essa tão grande oportunidade,
pra cursar uma escola e fugir do esmolar, mas pra que ter pobre com estudo
se assim o for, quem os doutores vão explorar?
Ser pobre é ruim, doloroso e não dá rima,
quem escreve sobre fome, jamais passou por essa sina.

Nos espólios da política, no sudeste ou no sertão
sempre há quem se deleite com cadáveres espichados pelo chão,
são juízes, delegados, edis e promotores, tem prefeito e deputado
que se alimentam só de dores!
Mas são as dores da Maria, do Manoel e do José,
são as dores desse meu povo que mesmo sofrendo tanto, insiste em ficar de pé.

II
Como pode haver quem fique de sonho em sonho escrevendo
sem querer saber que do seu lado tanta gente está morrendo?
Tal lascívia literária se compraz nos meandros das mentes inculcadas,
sobejadas de favores, geralmente dos senhores, promotores dos horrores.
Os vitimados são os mesmos, e as causas também são,
Só mudam os bajuladores, os capachos pelo chão.

Não vou falar de flores, de festas ou amores,
não vou falar da lua, se o que me importa é a rua!
Vou falar de uma menina que trocou a honra por um pão,
morava lá no lixeiro, aquele perto do cerqueiro, sem glamour e sem dinheiro
sem palanque e sem comício, era mais que uma pocilga
Na verdade era um mosqueiro.

Mas que culpa tem uma menina, se nasceu com a triste sina de não ter onde morar,
de ter pais analfabetos, descendentes de escravos?
O futuro era o “tronco” como forma de salário.
Vendeu tudo que foi possível só pra não morrer de fome
Vendeu a honra de menina
só faltou vender o nome!

Todos sofrem com o descaso das ditas autoridades
São politiqueiros de carteirinha que vivem só pra maldades
Cheiram pó, se embriagam, prevaricam, causam dor, compram voto e são desonra
Pra quem é TRABALHADOR
Eu não voto em ladrão, nem tampouco em estuprador
Eu não voto em assassino que vitima trabalhador.

III
Pode ser que minha rima não agrade a senhoria
Pode ser que não entendam o que realmente eu pretendia
Minha rima é quebrada, mas a consciência não o é
Não escrevo para mim, não escrevo pra ninguém
Eu escrevo por aqueles que “esperam algo de alguém”!

Esse alguém é o poder, que se acha soberano,
tem poderes de divino com feições de desumano.
Decreta e faz cumprir, legisla sem um pudor, furta dos mendigos e infringe dor.
Em suas mãos estão as almas dos fracos e dementes,
aduladores na verdade,
que não usam a própria mente.

Quantos mais hão de morrer na terra do sabiá?
Quantas meninas mais a honra vão leiloar?
Quantas pedras serão fumadas, quantos gererês ainda acenderão?
Quantas carreirinhas mais serão cheiradas no mausoléu,
até que a justiça ACONTEÇA?
Será preciso vir do CEU?

O que vejo são horrores de homens sem alma, e sem temores
são tolos e inquietos, filhos da mesma escuridão.
Se completam na sangria dos da plebe em profusão,
pra vestir os ternos caros da injustiça e maldição.
É vasta e é vazia, não importa, se é noite ou dia
o que querem e vão manter é a velha exploração!

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