No “vai-e-vem” do quotidiano humano, é comum alguém “afirmar” conhecer outro alguém, um determinado objeto, situação ou o que quer que seja somente pelo “ouvir dizer”. Viu na televisão, leu no jornal, em uma revista; está escrito em algum lugar, alguém falou... Já afirma conhecer!
Outro dia, dando uma palestra para um grupo de adolescentes, lancei o seguinte questionamento:
- Meus filhos! Digam o nome de um cantor que vocês conhecem! “- Cantor “a”, “b”, “c”...” Vários nomes foram apontados. Logicamente aqueles que, no momento, estavam nos primeiros lugares das “paradas de sucesso”.
Perguntei de novo: - Agora quero o nome de um jogador que, também, vocês conhecem!
Coincidentemente citaram somente um. Isso porque um grupo considerável deles falaram ao mesmo tempo o nome do mesmo jogador e os outros seguiram-nos na mesma direção: “- Jogador “x”!”
O jogador citado era jovem e também, no momento, estava “em alta” na sua carreira de esportista. Continuei questionando-os!
- Mas e os jogadores “y” e “z”, vocês não conhecem? Falei, de propósito, o nome de um jogador que encerrara recentemente sua carreira e de outro que estava se aproximando do fim, ambos de renome internacional. Eles responderem: “- Ah! Esses já foram bons, esse agora é melhor!”
Percebi que os adolescentes chegaram ao ponto que eu queria. Lancei, então, a outra pergunta. Agora para fazê-los questionar a si próprios.
- E se eu afirmar que vocês não conhecem nem os cantores “a”, “b”, “c” ... e também não conhecem o jogador “x”?
Aconteceu exatamente o que eu esperava. Os adolescentes que até aquele momento estavam bem descontraídos, interagindo comigo, emudeceram. Esperei uns dez segundos e os fustiguei novamente:
- E então? O que vocês têm a me dizer?
Um deles se levantou, ergueu um dos braços e me devolveu a questão: “- Como pode, padre? Eu conheço! Eu sei quem eles são!”
Repliquei: - Muito bem. Quem são eles?
A resposta já era a esperada. Apenas referências as músicas que tais cantores cantavam e ao time que tal jogador pertencia etc...
Para despertar mais ainda o interesse deles, fustiguei-os ainda mais: - Será que esses cantores e esse jogador conhece vocês? Será que eles sabem que vocês existem?
Nada responderam!
Foi aí que comecei a explicar a diferença entre “saber da existência” e “conhecer”.
Saber da existência de alguém não é tão difícil. A leitura superficial, os meios de comunicação social nos seus mais diversos modos, o ouvir dizer... tudo nos dá uma certa noção de quem quer que seja. Logicamente que quanto mais nos aprofundamos sobre alguém, mas chegaremos perto de quem este seja...
Já conhecer, de fato, exige interatividade, cumplicidade, amizade... quanto mais nos tornamos amigos de alguém, mas esse alguém vai se revelando para nós, uma vez que as barreiras antes impostas pelo distanciamento vão sendo removidas.
Vamos a um exemplo claro: Mesmo que você saiba de alguém que resida numa determinada cidade, rua; saiba seu nome, um pouco de seus hábitos, mas não faz amizade, não tem nenhum vínculo com ele, você não pode dizer que o conhece, de fato. A prova disso é que se você, caso precise de algum favor exclusivamente dele, não terá intimidade para se aproximar, a não ser através de alguém que você já “conheça” ...
Uma pesquisa crítica, embasada num raciocínio lógico, certamente que, também, faz você ter uma noção bem substancial de alguém. Mas não podemos desconsiderar, por exemplo, que quem viveu em outra época, cultura... falou, ou escreveu dentro de um contexto histórico diferenciado. Tanto é que vários estudiosos podem ter visões diferentes do que foi vivido, falado ou escrito por esse alguém. E, mesmo quando se falaram sobre esse alguém, as ideias estão impregnadas da linha de raciocínio dos falantes... Nesse caso específico, para você chegar mais perto, do ponto de vista do conhecer, de uma pessoa que viveu anos antes de você, deve mergulhar o máximo possível no que ela disse, escreveu, ou literalmente fez.
Vale lembrar, enfim, que ninguém se dá totalmente a conhecer, como também ninguém tem capacidade inteligível suficiente para conhecer totalmente a alguém. Tanto porquê, por mais inteligente que o homem possa parecer, ele naturalmente tem seus limites.
Dessa forma, conhecer a Deus vai além do ouvir dizer, do ler, do afirmar sua existência... É preciso ser amigo. E para ser amigo, se faz necessário busca-lo, particularmente no outro, independentemente de quem seja esse outro... Ver o outro como uma extensão de si mesmo é um excelente meio para se achegar e permanecer com Deus. Isso porque se uma pessoa é verdadeiramente saudável, jamais desejará a outra o que não quer para si mesma...
À medida que formos estreitando os laços de amizade, não somente pela razão, mas sobretudo pela vivência da fé, entre nós e Deus, vamos aumentando tanto a certeza da existência, como também o nosso conhecimento e confiança em relação a Ele...
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