INFÂNCIA NORDESTINA

José Malta Fontes Neto

Hoje cedo revendo nossos livros e revistas encontrei um material que recebi na Bienal do Livro de Alagoas em 2007. Trata-se de peças literárias do artista baiano Ademir Santana Silva (Demis).

Demis chegava ao Centro de Convenções Ruth Cardoso em Maceió, local da Bienal, todo paramentado de matuto. Calça salta riacho de brim marrom, camisa xadrez, chapéu de couro e um borná.

Com textos na ponta da língua Dêmis encenava poemas de forma tão brilhante que as pessoas paravam para vê-lo em sua desenvoltura.

O velho adágio está certo “OS ÚLTIMOS SERÃO OS PRIMEIROS”. Nosso estande ficou no final da feira e dele pudemos ver todas as apresentações ao artista Demis, como também de diversos cordelistas que ali também liam seus materiais na busca da divulgação.

Certa feita Dêmis iniciou o seu dia dizendo assim:

Você quer saber o que tem na noite
Pois quando ela vem,
me enche a lembrança.
Quer entender o que tem essa terra,
Porque cada dia do amo mais esse lugar.
É que eu sou nordestino
Porque o destino assim o quis
Sou de Juazeiro, sou da Bahia aqui vivo feliz.

Lembro dos meninos, meninas da infância
Nas rodas de noite brincando de anel
Que desafiando contrair verrugas
Contavam estrelas apontavam o céu.
Cruzando as batalhas roubar bandeirinhas
Correndo descalços com os pés no chão,
Tantas alegrias no frio de junho
Buscapés correndo, estouro de rojão.
É que sou nordestino...
Amigos e amigas se compradinhando
Pulavam fogueiras em noites de São João
Nas manhãs montavam escondidos os lombos
Dos jegues que pastavam no imenso sertão.
Navegar gangorra e voar nos balanços
Inventando o mar e tocando o céu
Ouvindo histórias sobre malassombro
De homens lobisomens e mulheres de véu.
É que sou nordestino...
Quase não se vê mais os piões girando
Ou os guris soltando arraias no ar
E no mês de maio as moças rezando
Novenas, ladainhas ante o altar.
Os rapazes de hoje já não se interessam
Em correr argolinha e congos danças
Em ir com os parentes para os cemitérios
Em enfrentar mistérios e o Judas Malhar.
É que eu sou nordestino
porque o destino assim o quis
Sou de Maceió, sou de Alagoas aqui vivo feliz.


Quando Demis terminou de recitar esse poema, fui até ele e pedi uma cópia para publicar no Portal Maltanet. Nesse poema identifiquei várias passagem na minha infância. O poeta abriu o borná e me deu uma obra. Material xerocado de um Projeto denominado “ARTE EDUCANDO A PARTIR DO MEIO AMBIENTE – APRESENTAÇÕES POÉTICAS”. Mas como a obra não tinha capa dura ou bela encadernação, guardei na bagagem e somente agora quando estava um pouco triste é que localizei.

Hoje percebi o que um irmão do Circulo de Companheiros fala sobre o valor dos escritos. Muitos recebemos, colocamos nas gavetas e esquecemos.

Ainda bem que achei as “APRESENTAÇÕES POÉTICAS” do Demis. Nelas pude ver e lembrar dos amigos Remi Bastos, João do Mato, Fábio Campos, Djalma Carvalho, Zé Carvalho, Zeneto, Capiá, Clerisvaldo B. Chagas, José Pereira Monteiro e tantos outros que retratam o nosso sertão de forma poética.

Por isso plagiando o Demis posso dizer
Sou de Santana, sou do sertão aqui vivo feliz

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