Li, durante muito tempo, crônicas de Paulo de Castro Silveira (1915-1985), publicadas em jornais de Alagoas. Também li um ou dois livros de contos de sua autoria. Historiador, professor, jornalista, cronista, advogado, ex-procurador da Fazenda Nacional e membro da Academia Alagoana de Letras.
Sobre ele, disse Romeu de Avelar, nome literário de Luís de Araújo Morais (1893-1972): “Um cronista com todos os fogos acesos, queimando o carvão de uma crônica quase diária na imprensa e apresentando-se ainda como pensador e biógrafo, somos obrigados a louvar o idealista e teimoso sonhador.”
Acabo de ler o livro Tavares Bastos – Um Titã das Alagoas (Sergasa, Maceió, 1976), ensaio biográfico de autoria de Paulo de Castro Silveira, festejado intelectual alagoano do passado, do qual disse o jornalista Arnoldo Jambo: “Magnífico e sensível narrador.”
Eu já havia lido o brilhante prefácio do livro O Barão do Penedo – A Missão da Palavra, no qual dissera Medeiros Neto: “Sobre o tripé Visconde de Sinimbu, Barão de Penedo e Tavares Bastos, sustentou-se, com grandeza, o Império.”
Em 1839, o presidente da província de Alagoas Agostinho da Silva Neves, atendendo a determinação imperial, transferiu da cidade de Alagoas (hoje, Marechal Deodoro) para a capital Maceió o Tesouro da Fazenda.
O fato gerou violenta revolta na cidade de Alagoas, liderada pelo Dr. José Tavares Bastos, líder político e brilhante orador, movimento que rapidamente se estendeu até Maceió. Verdadeira guerra que levou os mais exaltados a ameaçar invadir o palácio do governo. Luta política que resultou na deposição do presidente da província. Com o palácio cercado, sentindo-se inseguro, Dr. Agostinho da Silva Neves renunciou o cargo e retirou-se de Maceió.
Os ânimos foram serenados com a enérgica intervenção do Dr. João Lins Vieira Cansanção de Sinimbu que assumiu o governo na qualidade de 1º vice-presidente, assegurando a Dr. Agostinho da Silva Neves o retorno ao cargo de presidente da província.
Efetuou-se, afinal, a transferência do Tesouro da Fazenda para Maceió, nova capital da província.
Nesse clima de ódio e violência, de lutas políticas, nasceu na cidade de Alagoas, em 20 de abril de 1839, o menino Aureliano Cândido Tavares Bastos, filho do Dr. José Tavares Bastos e de Dona Rosa Cândida Tavares Bastos.
Nascia o estadista. Seus primeiros estudos ocorreram no velho convento de Marechal Deodoro, antiga cidade de Alagoas.
A luta política continuou por muito tempo. De um lado, Dr. José Tavares Bastos. Do outro, Cansanção de Sinimbu, detentor do poder político. Ambos haviam sido colegas na Faculdade de Direito de Olinda.
Apesar da vida política, Dr. José Tavares Bastos cuidava da educação do filho Aureliano, ensinando-lhe latim e filosofia. Daí para a Faculdade de Direito de Olinda saiu o jovem Aureliano. Depois, já aos dezessete anos de idade, Aureliano ingressa na Faculdade de Direito em São Paulo, tornando-se bacharel aos vinte anos, já se inscrevendo para defender, com sucesso, tese de doutorado.
Estudioso, em busca do saber, Aureliano Cândido Tavares Bastos não abandona seus livros por um só instante. Tem a sede do saber, lendo clássicos da literatura universal. Com pouca idade já era jurista, sociólogo, filósofo, antropologista. Afinal, um idealista, realista, pensador, reformador, abolicionista.
Escreveu as seguintes obras, depois de sua tese de doutorado: Cartas do Solitário, Província, Os Males do Presente e as Esperanças do Futuro, o Vale do Amazonas e Observações à Nossa Legislação Criminal Sobre Escravos. O assunto escravos, como abolicionista, fascinara-o sobremodo.
Segundo o autor do ensaio biográfico: “Pobre, aceitou um emprego público, que absolutamente não correspondia aos seus dotes intelectuais, à sua vasta cultura, ao seu currículo. Tornou-se, assim, oficial de secretaria do Ministério da Marinha.”
Eleito deputado-Geral em 1861, 1864 e 1867 (três mandatos consecutivos), tornou-se brilhante e respeitado parlamentar. Não obstante muito jovem, seus discursos eram ouvidos em silêncio.
Disse Paulo Silveira: “O Parlamento iria conhecer um revolucionário no bom sentido. Jovem deputado que levaria ao Parlamento novas idéias, que fariam corar legisladores retrógrados, com cadeiras cativas, e que viviam a balançar a cabeça como vacas de presépio.” Um jovem parlamentar no meio de feras.
Tavares Bastos era um visionário. Desbravou a Amazônia. Sua maior obra teria sido O Vale do Amazonas, em defesa do território, da floresta grandiosa, dos seus povos indígenas, das riquezas, das mesas de rendas e da navegação. Parece que adivinhava o que se passaria com esse patrimônio nacional nos dias de hoje, vítima do irresponsável desmatamento, das queimadas, dos garimpeiros, grileiros e dos incêndios ditos de ação criminosa.
Foi demitido em 1861 do emprego no Ministério da Marinha, logo no início do seu primeiro mandato como deputado-geral, sob a alegação de incompetente para o serviço público. Certa vez, já parlamentar, respondeu pessoalmente ao ministro da Marinha: “Não se assuste S. Exa. a respeito de sua vida privada. Morreria de pejo se imaginasse imitá-lo. (...) Voltou S. Exa. do Rio da Prata para a Corte, embrulhado em uma folha de papel, na qual estava escrita, a modo de rótulo, a palavra – cobarde. E a mão que esculpiu semelhante legenda era a do próprio chefe das forças navais.”
Embora de pequena estatura, Aureliano era um gigante com a palavra, como orador, com suas idéias reformistas. Mas a doença perseguia-o, conspirava contra sua saúde. Era um homem doente. À procura de médicos na Europa para tratar-se, morreu na cidade de Nice, na França, em 3/12/1875, aos 36 anos de idade.
Sobre sua morte prematura, disse o jornalista Ferreira de Menezes, em crônica no Jornal do Comércio: “Aí está a chegar o cadáver de Tavares Bastos, o porta-estandarte das ideias democráticas do seu tempo! Os pensadores desaparecem, mas não morrem.”
Aureliano Cândido Tavares Bastos é patrono da Assembleia Legislativa de Alagoas. Há um grupo escolar em Maceió com o seu nome.
Maceió, outubro de 2020.
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