Confesso que escrever sobre tristeza, sofrimento e dor não faz parte de minhas cogitações literárias. Disse algumas vezes que minha seara sempre foi e será outra, enquanto cronista provinciano: a do bom humor, da alegria, do pitoresco.
Agora, no início deste mês de outubro, observava eu, silenciosamente, a maneira carinhosa dos filhos de Dona Helena Oliveira Chagas em torno do seu caixão no Parque das Flores, aqui em Maceió. Naquela tarde sombria, velava-se o corpo de minha professora do curso primário, falecida aos 94 anos de idade.
Em meio a algumas reflexões, empreendia longa viagem no tempo, retornando, absorto, aos anos de 1952 e 1953, em Santana do Ipanema.
O desejo para que eu residisse, definitivamente, na cidade passou a ser exigência ou ordem de minha avó Bilia aos meus pais. De tanto exigir e de tanto argumentar, um dia cheguei à cidade para ficar. Era então o ano de 1952, exatamente 5 de fevereiro, data de divisor de águas em minha vida. Com muita saudade e com o choro contido no peito adolescente, havia deixado para trás o Sítio Gravatá. Lá deixara meus pais, meus irmãos em número de nove, meus amigos de infância e o amplo e verde campo de minhas brincadeiras e andanças. Tempos depois, aberto o caminho, meus irmãos foram chegando, um a um, a Santana do Ipanema.
Com l3 anos de idade, eu já havia frequentado todas as escolas em torno do Sítio Gravatá, onde eu morava. Esgotara-se, também, a leitura dos livros utilizados nessas pequenas e humildes escolares particulares. Como reforço, ainda tivera eu aulas de Matemática ministradas pelo professor Adauto, homem gordo e sonolento, que me parecia ressacado de algum porre tomado no dia anterior.
Por aquela época, eu já sabia contar, ler e escrever, apesar de não possuir nenhum certificado de conclusão de ano letivo nessas escolas primárias.
Na cidade, conforme desejo de minha avó, terminei matriculado no 3º ano primário na Escola Imaculada Conceição, pertencente à Dona Helena Oliveira Chagas; escola que funcionava em sua própria residência, situada na calçada alta da Rua Barão do Rio Branco, antiga Rua do Funil, no centro de Santana do Ipanema. Excelente fonte de saber da juventude santanense, o conceituado educandário funcionou por muito tempo nesse endereço. A escola e Dona Helena foram orgulhosamente lembradas em minhas crônicas, todas elas inseridas nos nove livros que publiquei.
Nessa modelar escola primária de minha cidade, concluí meu sonhado curso em 1953, preparado para enfrentar, com sucesso, a prova de admissão ao ginásio. Depois daí vieram o curso de contabilidade, o concurso do Banco do Brasil, o curso de Direito, aposentadoria, academias de letras e muita história para contar.
Da eficiente e competente mestra e da escola primária tenho boas e gratas recordações, apesar de não mais me lembrar do nome de colegas de turma, salvo alguns deles, como Dimas Menezes, Sinésio Prazeres e José Marques de Melo, bons profissionais espalhados pelo Brasil afora.
Que Dona Helena, inesquecível professora da minha adolescência, tenha o merecido descanso eterno.
Maceió, outubro de 2014.
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