O CAFEZINHO DO GERENTE

Djalma Carvalho

Mal praticadas e em horas indevidas, certas gentilezas tornam-se inconvenientes, abusivas. Deixam de ser ação fidalga, amável e de boa educação.
Vez por outra, Nelsinho Almeida, amigo e colega aposentado do Banco do Brasil, conta-me histórias engraçadas, pitorescas, que ele guarda em sua prodigiosa memória, muitas das quais de fatos que aconteceram de verdade ou que lhe foram contados no ambiente de trabalho.
Em meus livros de crônicas, contei várias delas, reais, também recolhidas ao longo dos meus trinta anos dedicados ao Banco do Brasil, tendo como excelente filão colegas do quadro de portaria, nossos sempre lembrados e queridos contínuos.
Devo registrar que no livro Nosso Banco do Brasil Era Assim... (Gráfica Sul & Editora, Natal (RN), 2019, 1ª Edição), de autoria de Francisco (Ciduca) Barros, de saudosa memória, há inúmeros casos e causos pitorescos que ele registrou como funcionário do Banco do Brasil, recolhidas em diversas agências por onde andou. Infelizmente, a Covid-19 levou-o ao túmulo, também a esposa. Talentoso escritor que o público leitor perdeu durante a pandemia do coronavírus.
Entre outras histórias que o inditoso colega Ciduca contou em seu livro, recordo-me da que trata do exigente fiscal do Banco, que, indo à propriedade do mutuário, que era deficiente visual, dele exigiu que lhe mostrasse o animal adquirido com o financiamento. Daí, o diálogo:
– O senhor diz ter comprado o boi reprodutor e afirma que não viu?
Resposta do mutuário:
– Eu sou cego, seu fiscal!
Retornando ao assunto inicial, de há muitos anos o Banco do Brasil tinha sua agência de Maceió instalada no bairro de Jaraguá, local bem próximo do porto marítimo, por onde Alagoas exportava sua produção de açúcar.
Quando cheguei a Maceió para morar, em 1975, o BB já havia transferido em meados da década de 1960, sua agência de Jaraguá para a Rua Senador Mendonça, no centro da capital alagoana, deixando para trás o belo prédio de esquina da Praça Dois Leões.
Encontrei na nova agência, de moderno prédio de muitos andares, como gerente geral o senhor Manoel de Almeida, funcionário antigo, respeitável cidadão, que todos os meus colegas de trabalho lhe davam o tratamento de “seu” Manoel.
Lá na antiga agência de Jaraguá, de vez em quando “seu” Manoel deixava a gerência indo visitar um ou dois escritórios de usineiros, clientes em potencial dos negócios do Banco do Brasil em Alagoas. De volta, ele não dispensava o saboroso cafezinho tomado numa lanchonete da referida Praça Dois Leões ou das imediações dali.
No quadro de portaria da agência, havia um continuo escolhido para trabalho externo. Logo cedo, após a assinatura do ponto, ele punha numa pasta de couro documentos diversos, correspondências, avisos de cobrança, etc., e se largava pela Maceió afora a fazer suas entregas, somente retornando ao trabalho quando já se findava o expediente.
O contínuo Ambrósio – parece-me que era esse seu nome – fazia esse trabalho diariamente. Claro que, nas horas vagas e de descanso, Ambrósio, como bancário, também apreciava uma boa cerveja.
Um dia desses, Ambrósio, descuidado, sentado a uma mesa da dita lanchonete, tomava sua cerveja. De repente, adentra “seu” Manoel para tomar seu habitual cafezinho. Ambrósio estremeceu, mas continuou a tomar sua cerveja.
Ao pagar o cafezinho, “seu” Manoel foi surpreendido com a “gentileza” do contínuo que ordenava ao caixa da lanchonete, em voz alta:
– Bote esse cafezinho na minha conta!
No dia seguinte, outro colega contínuo recebeu a pasta de couro, para o trabalho externo.

Maceió, abril de 2022.

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