DIGNO, SIMPLES, MODESTO

Djalma Carvalho

Para começar a conversa de hoje, tive que recorrer a Haroldo Lobo e a Niltinho, autores de Tristeza, samba que fez sucesso no carnaval de 1966, cuja letra tem o seguinte início: “Tristeza, por favor, vá embora, a minha alma que chora...”
Sempre relutei em escrever sobre tristeza, sofrimento e dor, por saber que o ciclo nascimento, vida e morte se completa, inevitavelmente, de forma dolorosa, deixando saudade no coração dos que por aqui ficam. Minha seara sempre foi outra, enquanto cronista. A do bom humor, da alegria, nada de tristeza.
No dia a dia da vida, nem sempre a gente faz o que quer ou experimenta o de que gosta. Hoje, tocado pelo sentimento de perda, minha alma também chora ao fazer o registro do falecimento do tio Manoel Constantino Melo, ocorrido no dia 11 deste mês de junho. Certa feita, disse o jornalista José Machado Mota Neto, lamentando a morte de um amigo: “Tombando sem causa ou com causa conhecida, lá se vão todos os amigos.” Lá se vão, em verdade, os amigos e os entes queridos.
Assisti, há pouco, à missa do sétimo dia do falecimento desse tio querido, irmão de minha mãe, também falecida. Durante a celebração, pude recordar, silenciosamente, o cuidado, o carinho por ele dispensado a mim e aos meus irmãos, todos eles, então, crianças e adolescentes, mostrando-nos os caminhos da vida, da luta, do trabalho honrado. Entendo que gratidão é sentimento forte, que não se desfaz com o tempo.
Solteiros, os tios José e Manoel Constantino moravam com minha avó Maria Rocha Melo, viúva, numa casa estreita, na antiga Rua Siqueira Campos, 41, hoje Rua Coronel Lucena, no centro de Santana do Ipanema. Tio José, que carregava hábitos da caserna, era homem mais fechado, cerimonioso, servira ao Exército durante a Segunda Guerra Mundial. Tio Manoel era mais flexível, brincalhão, comunicativo. Bondosos, fizeram-nos mais do que sobrinhos, consideravam-nos filhos. Determinada, autoritária, era minha avó, que soubera impor a meus pais a ida dos netos, já em número de dez, para a cidade. Em 5 de fevereiro de 1952, sentido e choroso fui o primeiro a deixar o Sítio Gravatá. Os demais foram chegando à cidade depois, um a um. A todos acolheu a casa de vovó Bilia, como assim ela era carinhosamente chamada.
Estudar e trabalhar, eis a meta que nos foi dada. Matriculado em escola particular, eu fazia as duas coisas: estudava e trabalhava. Na loja de tecidos, onde tio Manoel era gerente, ganhei o primeiro emprego: aprendiz de balconista.
Estudamos e trabalhamos, todos. Vieram daí os concursos públicos, os empregos. O tempo passou depressa, e ganhamos o prêmio da aposentadoria.
De balconistas, ambos os tios fizeram-se, tempos depois, comerciantes na cidade. Nessa condição, aposentaram-se. Tio José ficou em casa a balançar-se em cadeira perto da calçada, a receber e retribuir, ali, cumprimentos dos amigos. Faleceu faz alguns anos. Tio Manoel preferiu transferir-se para o Recife, para acompanhar os filhos que lá estudavam, onde faleceu.
Que três almas bondosas! Com certeza, ganharam merecido lugar no Céu.
Tio Manoel era homem simples, de vida modesta, digno e honrado, como afinal bem o disse a mensagem distribuída após a missa: “Ele deixou uma herança inestimável na forma de legado rico de ensinamentos, valores e exemplos de vida que continuarão a nortear os caminhos dos filhos e netos.”

Maceió, junho de 2012.

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