Djalma de Melo carvalho
Membro da Academia Maceioense de Letras
Faz alguns anos que assisti a um interessante encontro de poetas populares e violeiros repentistas no Teatro Deodoro, aqui em Maceió. Não me recordo da data de sua realização. Talvez tenha sido há uns vinte ou trinta anos.
Muito apreciei a qualidade das poesias e dos poemas declamados. Brilhante o desempenho dos declamadores. Versificação não é minha preferência literária, mas como a poesia encanta o espírito e a alma, fiquei impressionado com tanta beleza das composições poéticas ditas naquele histórico espaço, todas elas produto criativo e inteligente dos que fazem versos e rimas, até mesmo de improviso.
Lembro-me, por exemplo, da poesia então declamada que tinha como núcleo inspirador a palavra cama, o móvel de reconhecida importância no lar, indispensável, em que se dorme ou repousa. A cama acompanha o ciclo vital da gente, da concepção à morte. Móvel em que se pensa primeiro antes do casamento, até com a intenção, as mais das vezes, de utilizá-lo antes do preliminar compromisso formal materializado na aquisição das alianças.
Segundo mestre Aurélio, o vocábulo cama possui vários sentidos figurativos. Por exemplo: “Ir para a cama com” pode significar ir para intercurso sexual. “Cair da cama” é ter desagradável surpresa. “Cair na cama” quer dizer dormir. “Fazer a cama de” seria acusar, denunciar alguém. Assim por diante.
Sobre a poesia declamada, passado tanto tempo da realização do referido festival, tive que recorrer aos préstimos de Jader Costa Tenório, colega aposentado do Banco do Brasil, poeta, declamador e emérito conhecedor do assunto poesia, violeiro e repentista. Feita a ligeira pesquisa, concluiu-se que poderia tratar-se do poema matuto, intitulado Eu, a Cama e Nobelina, de autoria de Zé Laurentino.
Vejamos o que escreveu o poeta paraibano sobre a cama, entre outras coisas: “Cama é invenção abençoada/ nunca causa acidente/ ninguém morre de queda de cama/ guarda segredo de amantes/ o rangido é a música que a cama toca/ e só sabe tocar de dois/ cura ressaca depois/ de um dia de porre/ cama é onde se ama, nasce e dorme/ onde se repousa, adoece, sofre e morre.”
Há cama silenciosa, macia, de couro, de esteira, de madeira, de lona, etc.
O travesseiro, por seu turno, está sempre presente na cama, sempre em dupla, como peça necessária, às vezes servindo de enfeite. Trata-se daquela almofada que nos acompanha durante o sono reparador, de repouso e conforto. Também maltratado, apanhado, machucado, o travesseiro nos acompanha nas noites de insônia e de pesadelos aterradores. É testemunha silenciosa das inquietudes da alma.
Bem possível que Freud e Jung tenham analisado o sono, o sonho e o comportamento de pacientes que atravessaram intermináveis noites de insônia, abraçados a sofridos travesseiros.
No silêncio da noite, afinal, o travesseiro torna-se companheiro mudo de confidências sobre amores platônicos e de amores perdidos na travessia abissal de coloridos e fantasiosos sonhos. Igualmente, sobre aventuras e fracassos no dia a dia da vida.
Maceió, março de 2015.
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