TRIBO DE MARIMBONDOS
(Clerisvaldo B. Chagas. 21.4.2010)
Faz certo tempo, uma revista famosa do Brasil enviou um repórter para ampla matéria em Alagoas. A reportagem seria a respeito da máfia política que dominava o estado. Aproveitando a evidência da revista, o governador fez convite ao jornalista para um jantar festivo que iria haver no Palácio dos Martírios. Na hora aprazada, muitos senhores elegantes vestindo branco, compareceram. Tudo correu como o previsto no interior do palácio alagoano. Já perto do encerramento ─ narrado pelo próprio repórter na revista publicada ─ o governador o conduziu até a varanda para conversar. Disse que o jornalista havia chegado de longe para saber como o governo estadual iria exterminar a máfia. Depois teria rebatido o diálogo mais ou menos assim: “Como acabar com a máfia! O senhor mesmo acaba de jantar com ela”.
A ocorrência acima faz lembrar situação vivida por mim, semelhante a do jornalista nos Martírios. O tempo desse caso deve girar em torno de dez anos. Convidado por um amigo interessado em comprar terras em outros estados, longe de Alagoas, fomos obter informações de certo fazendeiro perigoso da região. Era ele o encarregado das vendas. Ao chegar àquela cidade, procuramos encontrá-lo em um bar onde o fazendeiro batia ponto. O dono do estabelecimento esclareceu que o homem já havia passado por ali em direção à fazenda. Caso quiséssemos aguardar, logo, logo, ele estaria de volta. Enquanto aguardávamos, o amigo bebia cerveja. Pedi um Campari, porém, o dono da espelunca falou que só havia um litro do produto, mas estava reservado no freezer. Disse ele ainda que o outro apreciador da bebida teria ido fazer um servicinho e chegaria logo para beber a tintura. Nesse caso eu poderia pedir um pouco a ele, que o Campari estava difícil na cidade. Aguardei impacientemente. Trinta minutos depois chegou um rapaz simpático, novo, forte e sem camisa. O rosto mostrava totalmente gotas de suor. O caso foi repassado pelo dono do bar e, com a maior gentileza do mundo, o recém-chegado mandou retirar o tubão do gelo. Pediu que eu ficasse bem à vontade “que esse negócio é para a gente beber mesmo”. Devo ter ingerido duas ou três doses daquele líquido vermelho e cismei em não querer mais. O amigo achou que o fazendeiro estava demorando e chamou para irmos embora. Pagamos a conta e retornamos a Santana do Ipanema. O dono do Campari continuou bebendo, rindo e suando.
Enquanto o automóvel rodava, o meu amigo perguntou se eu conhecia a fama sinistra do fazendeiro. Respondi que sim, pois ele era marca registrada em Alagoas. Indagou também se eu não suspeitei do bebedor de Campari. Claro que não, respondi. Pois ele é pau-mandado do fazendeiro e acabava de chegar de mais uma encomenda. “Você acaba de comemorar sem saber, mais um crime de mando em Alagoas”.
Já faz tanto tempo que nem lembro mais qual foi a minha reação. Talvez tenha sido a mesma do jornalista no palácio. Mas o sangue vermelho da bebida italiana nunca mais entrou em minha boca. Não se gasta nada em rezar pai-nosso e ave-maria para não cair gratuitamente em TRIBO DE MARIMBONDOS.
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