Antonio Machado
A bênção “padim” Frei Fernando, eu ando com uma “lesêra” muito grande na cabeça, e minha mãe, meu santo, anda com uma “percundia” muito grande adispois que o frio mais veio dela morreu de “andaço”, então eu queria que o senhor me ensinasse um remédio, mode elas ficarem boa. Enquanto isto o bondoso missionário, aclimatado a ouvir essas “escorrenças”, apenas olha em silencio o infinito, ou o teto carmomido da velha capela, como a procurar uma resposta aquelas consultas inusitadas, e traçando um sinal da cruz na fronte do penitente, com sua mão cava de tantos solavancos da vida, conclui: “minha romeira, tome chá de laranjeira, e reze três Ave Maria pela santificação de Frei Damião, porque eu não sou doutor”.
E assim começa o diálogo de Frei Fernando com o povo de Deus, os romeiros de Frei Damião, que hoje, por herança lhe são seus, em suas missões sertão afora, assim tem sido nos lugares por onde ele chega é sempre assim, cuja prática missionária, vem das épocas medievais, trazida para o Brasil pelos primeiros religiosos, e para o Nordeste pelos missionários capuchinhos, sediados no Recife, que, infelizmente, esta prática tão benfazeja religião católica, a própria igreja, tende a todo custo acabar, impondo ao povo a diletante missão popular que não deixa quase nada de religiosidade. Frei Fernando Rossi é uma prova viva das missões do passado, hoje nonagenário, porém lúcido e atualizado, sendo o Evangelho vivo de Jesus. Onde ele chega atrai o povo, arrasta gente, é carismático, como é bonito caro leitor, nas tardes sertanejas, quando o sol caindo no poente, os romeiros, em torno capelinha, vão se aglomerado vindos de carros não muitos confortáveis, motos, a pé, enfim todos vêem, cantando os hinos das missões que o eco, parece se perder no vazio do firmamento para chegar a balaustrada celeste aos pés de Virgem Maria, como verdadeiras preces brotadas da alma sertaneja, onde a maldade humana ainda não fumega, e o religioso de microfone em punho recebe a todos com seu amor paterno, como um verdadeiro sinal entre Jesus e o povo.
Ah! Meus leitores, esse quadro tão bonito quanto belo, sobretudo quando visto pelos olhos da alma, que vê mais longe e vê melhor, como dizia o Príncipe dos poetas brasileiros, Olavo Bilac. E o missionário vai discorrendo sua prática, sem metáforas nem metomímias ou mesmo onamatopéia nas intergeições, mas com exemplos edificantes da vida dos santos, como êmulos da igreja católica, tudo dentro de um linguajar que o povo entende e se emociona ao longo das prédicas do religioso. Porém existe, caro leitor, um grande impasse em tudo isto, são os padres nas paróquias, que se julgam “donos”, e enquanto o bispo, D. Dulcênio, permite que Frei Fernando visite as paróquias pregando seus sermões, mesmo à antiga, determinados padres proíbem essa prática, o que é uma tristeza, e quem perde com isto é o povo que carece e gosta das missões de Frei Fernando. Mas por que tudo isto? Não estou abrindo polêmica, mas apenas mostrando um fato real dentro da historicidade da igreja, que precisa ser repensado.
No século passado tivemos a caso do Pe. Cícero Romão Batista, no Juazeiro do Norte, que foi até suspenso de ordem, morreu e não teve suas ordenas restabelecidas, tudo feito por sua própria igreja católica, e ele dizia “um dia minha igreja fará minha defeza”, e hoje vê-se querendo canonizá-lo, enquanto na Diocese de Palmeira dos Índios, o pe. Sizino Teles, que arrebanha multidões, em Mata Grande, está suspenso de ordem, mas seu santuário é uma verdadeira romaria. E agora quem está certo? As missões à antiga, ou as populares? Pe. Cícero deixou no sertão/ duas palmeiras plantadas/ o terço a boca a noite/ e o Ofício de madrugada”. Frei Damião e Frei Fernando Rossi seguiram a risca esse método tão salutar dentro da religiosidade do povo, hoje mais de cem anos depois, o missionário Frei Fernando com mais de noventa anos, continua fazendo a mesma coisa e atraindo os romeiros que cada dia aumenta mais, coisas de Deus que a ciência não explica.
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