Paulo Freire dedicou sua vida à batalha contra o mutismo do homem brasileiro, tentando construir metodologias capazes de libertar os oprimidos dos grilhões que os perpetuam na ignorância, inibindo o exercício pleno da cidadania.
Céticos quanto à possibilidade de universalizar o acesso à escola de boa qualidade, pela miopia dos nossos governantes, dois intelectuais nordestinos ? Audálio Dantas e Luitgarde Cavalcanti Barros - se converteram em paladinos dos silenciados. Por isso mesmo serão homenageados durante a V Bienal Internacional do Livro, agendada pela Editora da Universidade Federal de Alagoas, para a semana de 22 a 29 de outubro de 2011, no Centro de Convenções de Maceió.
Audálio é o patrono desta edição da Bienal alagoana. Radicado em São Paulo, desde a mocidade, fez carreira como jornalista e escritor. Ganhou projeção nacional quando, há 50 anos, deu voz aos favelados, publicando o diário de Carolina Maria de Jesus, a catadora de papel que enganava a fome anotando em toscos cadernos suas agruras cotidianas. Agora, o timoneiro dos jornalistas, batalha para eclodir o ?grito parado no ar? simbolizado pela tortura que martirizou Vladimir Herzog nos porões da ditadura. Sua morte ainda permanece enigmática, em vista das barreiras interpostas pelos guardiões da memória nacional, dificultando o acesso aos autos processuais.
Luitgarde, antropóloga de formação, mas historiadora nutrida pela paixão, terá sua história de vida e sua obra analisadas por uma plêiade de intelectuais que busca evidências da sua luta para dar vez e voz aos romeiros do Padre Cícero e outros santos não-canônicos. Mas também aos militantes políticos ou culturais, como Octavio Brandão, Josué de Castro ou Nise da Silveira, considerados politicamente incorretos pela vanguarda da elite que se diz pensante.
A sertaneja que se refugiou no Rio de Janeiro para sobreviver às perseguições políticas que dizimaram parte de sua família, em Alagoas, adquiriu notoriedade pela desmistificação da saga dos cangaceiros. Valendo-se da história oral recompôs a verdadeira face do bando de Lampião, que atemorizou o polígono das secas na primeira metade do século passado. Violar mulheres indefesas e torturar homens valentes constituía a rotina dos cabras de Virgulino Ferreira.
Reconhecer os méritos de pessoas destemidas como Audalio e Luitgarde pode funcionar como mecanismo capaz de neutralizar o imobilismo das lideranças nacionais frente à questão educacional, elegendo a educação de base como prioridade de Estado. Só desta maneira pode-se combater o mutismo que tanto preocupou Paulo Freire e vem sensibilizando intelectuais como Audálio e Luitgarde.
Texto publicado:
Revista Imprensa. N. 272. p. 75 / 2011. Outubro
Coluna: Campus
Alagoanos na V Bienal - Mutismo e inibição cidadã
Culturapor José Marques de Melo- www.marquesdemelo.pro.br 22/10/2011 - 16h 00min Ilustração

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