Lê-se no livro de crônicas – Fruta de Palma –, 2ª edição, às páginas 112/113, o que escreveu Oscar Silva sobre o encontro que tivera ele com Tadeu Rocha, também escritor santanense, seu contemporâneo e grande amigo. Disse Oscar Silva com sua brilhante pena de consagrado cronista: “Corria o mês de maio de 52, quando, por uma coincidência, ele de férias e eu a serviço de meu emprego, me encontrei com Tadeu Rocha em Santana do Ipanema. Abraçamo-nos, batemos um bom papo e ele me convidou para um passeio a Poço das Trincheiras aonde ia rever parentes e amigos.”
Tratava-se de viagem sentimental a Santana do Ipanema e a Poço das Trincheiras que Tadeu Rocha fazia naquela oportunidade. Durante a viagem, dos assuntos tratados pelos dois conterrâneos, que residiam fora do chão nativo, ressaltava a descrição geográfica a cargo de Tadeu Rocha da paisagem sertaneja, das serras em particular e dos “elos da cadeia ou do sistema Borborema”. De parte de Oscar, havia a preocupação com o Ipanema que lhe “parecia mais estreito”, à medida que o automóvel avançava na estrada e parecia margear o curso do rio.
Desde 1952, quando me entendi por gente, não me lembro de ter visto Tadeu Rocha em visita a Santana do Ipanema, salvo em uma única ocasião, quando Dr. Hélio Rocha Cabral de Vasconcelos era prefeito da cidade, no período de 1956 a 1960. De passagem por Santana do Ipanema, e comandando uma caravana de estudantes universitários pernambucanos, seus alunos, Tadeu Rocha foi recebido pelo ilustre prefeito, seu sobrinho. À noite, realizou-se nos salões do Tênis Clube Santanense animado encontro dançante, oferecido aos jovens visitantes.
Orgulhoso e respirando felicidade, Tadeu Rocha subiu ao palco e pronunciou um belo discurso, saudando sua terra natal de gratas recordações e a juventude santanense, que ali se divertia a valer, principalmente as mocinhas da sociedade local que não davam trégua aos rapazes universitários. Lá estive a ver de perto aquele senhor corado, loquaz, o festejado intelectual santanense.
Nasceu Tadeu Rocha em 1916, no sobrado da Praça da Matriz, no centro de Santana do Ipanema, recém-construído por seu pai, coronel Manoel Rodrigues da Rocha, grande empreendedor, próspero comerciante e líder na cidade e no sertão alagoano, casado com Maria Izabel Gonçalves Rocha, conhecida por Sinhá Rodrigues. Mantinha boa relação de amizade com os coronéis José Rodrigues de Lima (Piranhas), Ulysses Vieira de Araújo Luna (Água Branca) e Delmiro Augusto da Cruz Gouveia (Pedra). No bem-mobiliado e decorado sobrado, o coronel Manoel Rodrigues da Rocha acolhia comitivas, governadores, intelectuais e outras autoridades, de passagem por Santana do Ipanema. Segundo Dr. Hélio Cabral, “o dito sobrado era um verdadeiro “parador” da região”.
O coronel faleceu em 5 maio de 1920.
Em seu livreto Coronéis do Sertão e Sertão do São Francisco Alagoano (Maceió, 2005), disse Dr. Hélio Cabral: “Manoel Rodrigues da Rocha manteve-se distante da política partidária em Santana, entregue ao senador Enéas Augusto Rodrigues de Araújo ou ao padre Capitulino Carvalho, com quem se indispôs por questões pessoais, porém este, aos domingos, só iniciava o Santo Sacrifício da Missa, quando o coronel chegava à igreja.”
Esta última informação de Dr. Hélio Cabral fez-me lembrar de que minha avó Maria Rocha Melo, prima do coronel e também procedente de Águas Belas, conterrâneos, então, certo domingo, muito cedo chegara à igreja, como de costume, para assistir à missa, e sentara-se na primeira banca. Incontinente, padre Capitulino, grosseiramente, mandou que ela procurasse outra banca, porque aquela estava reservada para a família do coronel Manoel Rodrigues da Rocha. Minha avó, sentindo-se humilhada, retirou-se. Depois desse incidente, nunca mais ela visitou a igreja matriz da cidade, salvo quando faleceu. Familiares levaram-na para a missa de corpo presente. Ilações poderiam ser feitas, há mais de um século, a propósito do incidente e da informação de Dr. Hélio Cabral, sobre a relação do coronel com o padre político – “com quem se indispôs por questões pessoais”. A dúvida. O incidente teria chegado aos ouvidos do coronel, uma vez que, em se tratando de cidade pequena, tudo se sabia?
Deixemos essas divagações de lado e voltemos a Tadeu Rocha que possuía os seguintes irmãos, também educados em bons colégios de Recife, Maceió e Aracaju: Pancrácio Rocha (residia em Santana, tocava violino), Maria de Lourdes (exímia musicista, casada com Dr. Manoel Xavier Accioly, juiz de direito, pais de Breno Accioly), Maria da Glória (casada com Dr. Otávio Cabral), Judite e Miriam, residiam em Aracaju.
Tadeu Rocha estudou no Recife. Formado em Direito, ficou por lá como advogado e professor docente de Geografia e História. Tornou-se pesquisador, historiador, jornalista e escritor. Como jornalista, atuou no Diário de Pernambuco, publicando matérias importantes, fruto de suas pesquisas históricas. Fundou a Faculdade de Filosofia do Recife. Vários santanenses foram seus alunos.
Muito atencioso, respondia tempestivamente a consultas sobre fatos históricos de Santana do Ipanema, formuladas por seus conterrâneos. De minha parte, atendeu prontamente a uma ou duas consultas que eu lhe fizera por cartas, cujos temas foram tratados por José Marques de Melo em seu livro Sertão Glocal (Ufal, 2010).
Disse José Marques de Melo: “Tadeu Gonçalves Rocha pertenceu ao segmento intelectual que ocupou o topo da pirâmide social santanense. Teve educação de elite, pautada pelo catolicismo tradicional.” (Obra citada, p 80). Teve prole numerosa. Dos três casamentos ele relacionou o nome dos seus 15 filhos no livro Modernismo & Regionalismo.
Problema de visão, resultante de glaucoma crônico e de outras complicações na retina de ambos os olhos, Tadeu Rocha interrompeu, penosamente, seus deveres de longos anos de redator de pesquisa do Diário de Pernambuco.
Publicou os seguintes livros: Caderno de Geografia Brasileira (1951), Modernismo & Regionalismo (1952), A Geografia Moderna em Pernambuco (1954), Delmiro Gouveia (1960), Roteiro do Recife, Olinda e Guararapes (1968) e A Primeira Escola de Pernambuco (1968).
Estudioso e talentoso intelectual.
Vejamos, afinal, o que disse José Marques de Melo (1943-2018): “Tadeu Rocha era uma espécie de príncipe dos intelectuais santanenses.”
Faleceu em 1994, no Recife.
Maceió, agosto de 2021.
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