FAZER CHARME COM "CHARM"

Djalma Carvalho

Diz-se que cigarro se compara a um tição, tendo de um lado uma tocha e de outro um idiota. Mas não é tanto assim. Quem fuma tem suas razões para fazê-lo, sem preocupar-se com os males que o tabagismo poderá causar à saúde, hoje ou amanhã. O fumante passivo, ao inalar a fumaça do cigarro, também corre o mesmo risco.
O cigarro pode ser fonte de inspiração para o poeta apaixonado, romântico, sonhador. Certamente de linimento para dor-de-cotovelo. O vício de fumar servirá, no mínimo, de espécie de fuga psicológica, remédio para dissipar ansiedades e inquietações da vida.
Como sinal alarmante, o tabagismo causa câncer de pulmão – doença que mais faz vítima no mundo –, infertilidade e impotência sexual masculinas, derrame cerebral, problemas respiratórios, doenças cardíacas, etc. É um vício terrível.
Já tratei desse cruciante problema de saúde em crônica, intitulada “Tragadas e Baforadas”, que foi inserida no meu livro Caminhada (1994).
Deixar de fumar, afinal, será uma questão de conscientização, de coragem, de força de vontade, de determinação, de firmeza de propósito, afinal.
A história do tabaco tem origem nos índios americanos, cultivado antes mesmo que os europeus chegassem à América do Norte. A primeira safra cultivada, para fins comerciais, remonta a 1612, na Virgínia.
A luta contra o tabagismo tem alcançado resultados positivos no Brasil. Em 1987, um ano após a edição da Lei Federal 7.488/86, existiam 33 milhões de fumantes. Em 2008, a população de ex-fumantes era de 25 milhões, contra 21 milhões de fumantes em 2013, segundo dados estatísticos do Instituto Nacional do Câncer (Inca) e da Fundação Osvaldo Cruz.
O cinema americano, nos anos após a Segunda Grande Guerra, mostrava atores e atrizes fumando, certamente incentivando o vício do tabagismo. Moda que fazia parte, então, do glamour, do charme, do encanto pessoal, sobretudo repercutindo na frágil população jovem, Brasil afora. O adolescente, por exemplo, desejava portar-se como rapaz, como adulto. Para tal, exibia-se em praça pública igualmente fumando como assim faziam as garotas que ali circulavam no chamado “quem-me-quer”. Para o jovem, a moda de fumar parecia afirmação pessoal.
Quando comecei a trabalhar entre fumantes no Banco do Brasil, iniciei-me também no vício de fumar. Dele somente me livrei em 1978, em 29 de agosto, Dia Nacional de Combate ao Fumo. Foram, mais ou menos, 17 anos fumando desesperadamente.
No início de 1970, surgiu o cigarro chamado “charm”, suave, não irritante. A partir daí, tornou-se cigarro da minha preferência. O novo produto da Empresa Souza Cru veio acompanhado do sugestivo e sedutor slogan: “O importante é ter charme.” Mas, em 2015, o cigarro “charm” deixou de ser fabricado.
O vício de fumar causou-me ligeiro abuso em noite de muita emoção, no festivo lançamento do meu livro de estreia como escritor.
Em 1977, lancei o livro de crônicas “Festas de Santana” em solenidade realizada no Tênis Clube Santanense. Horas antes, tivera eu a péssima ideia de levar comigo para a festa um maço de cigarros “charm”. Deixara-o ao meu lado, sobre a mesa de trabalho, para minhas charmosas tragadas, enquanto autografava muitos livros.
Esse desejo de fazer charme com “charm” causou-me prejuízo naquela inesquecível noite, rodeado de amigos, conterrâneos e convidados. Surrupiaram-me o maço de “charm” em plena festa.
Não sei, até hoje, o nome do meliante – também viciado – autor da façanha.

Maceió, fevereiro de 2019.

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