DOUTOR E VAIDADE

Djalma Carvalho

Djalma de Melo Carvalho
Membro da Academia Santanense de Letras, Ciências e Artes.

Tornar-se vaidoso será a mesma coisa que se sentir importante no meio social, em sociedade, em qualquer lugar. O sentir-se importante terá semelhança com orgulhoso, conceito de si próprio dosado de certo exagero. Empáfia mesmo.
A escritora, pensadora e advogada, Larissa Foresto disse: “Vaidade é uma máscara, um véu sobre o vazio. A vaidade física esconde rugas, a intelectual, as inseguranças.”
O autor de Eclesiastes, Qohélet, o pregador, ou rei Salomão, filho de Davi, criticava bens, como a sabedoria, riqueza, fama, longa vida, e mostrava que, como fonte de felicidade, cada uma dessas coisas era vaidade, isto é, ilusão, aflição de espírito. Dizia, portanto, que “Vaidade de vaidades, tudo é vaidade”.
Voltando ao título desta conversa, encontro no mestre Houaiss o seguinte texto sobre o vocábulo “doutor”: “Título que, por cortesia (sic), se costuma dar àquele que é diplomado em curso superior, especialmente em medicina.”
Em regra, como dito acima, todo aquele graduado em curso superior poderá ser chamado de doutor, mas ressalte-se: por cortesia.
Entretanto, segundo o mesmo dicionarista, doutor, de verdade, será o título de quem, numa universidade, terá sido “promovido ao mais alto grau depois de haver defendido tese em alguma disciplina literária, artística ou científica (doutor em direito, em música, em medicina)”. Assim é definitivamente correto dar-se o título de doutor somente àquele que completou o doutorado, após o mestrado, com conclusão condicionada à apresentação de tese. Claro, aí se incluem os magistrados.
No mais, será sempre título dado por cortesia.
Lembro-me de que, no início do meu curso de direito em 1976, logo nas primeiras aulas, os professores chamavam a todos nós, alunos, de doutores, apelidos que cada um deveria carregar por toda a vida profissional. Uns, por vaidade; outros, porque chegariam ao doutorado ou exerceriam a função de magistrado.
A propósito destas digressões, recordo-me do rápido diálogo que tive, há algum tempo, com um jovem médico no corredor de uma clínica, aqui em Maceió, ao pedir-lhe certa informação.
Não havia lido, com clareza, seu nome gravado no jaleco branco. Perguntei-lhe: “Rapaz, dê-me, por gentileza, uma informação...” Antes que eu completasse o pedido, advertia-me ele: “Rapaz, não. Meu nome é Dr. Fulano!” Não me lembro mais do seu verdadeiro nome, porque já faz algum tempo.
Não me ocorreu, naquela oportunidade, responder-lhe, grosseiramente, dando-lhe o devido retorno. Até poderia lembrar-lhe que eu possuía graduação universitária, podendo ser, cortesmente, também tratado de doutor, como nos ensinara o mestre Houaiss.
Fiquei a pensar: esse jovem, coitado, mostra-se tão vaidoso, talvez nem tenha concluído a obrigatória residência médica pós-graduação, tampouco o doutorado em medicina. Nem tenha ouvido falar de Eclesiastes. Quem sabe?
Mas, durante sua carreira profissional, poderá curar muita gente.
Que Deus o ilumine.

Maceió, outubro de 2017.


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