As vacinas são muito importantes. Isto é uma verdade factual. Elas, de alguma maneira, aumentaram a expectativa de vida dos seres humanos, deram a sua contribuição para esse fato social. Claro que ninguém deve ser obrigado, à força, a se vacinar, até porque tal obrigatoriedade não deve ser formalmente absoluta em um Estado democrático de direitos, pois teria implicações sérias do ponto de vista humano, jurídico e médico-sanitário. Todavia, quando se diz que todos(as) devem ser obrigados a ser vacinados, está-se a exigir, de modo humanitário e consciente, um certo tipo de solidariedade preventivo, um tipo de solidariedade que visa proteger também o Outro, a comunidade, a sociedade, isto é, um tipo de solidariedade que, ainda que o ato seja personalíssimo e preso à esfera da liberdade, tem como objetivo mor também a proteção da vida de um ser que não seja só a da própria pessoa vacinada, numa tentativa civilizatória, conjunta, solidária, de tentar anular as possibilidades de replicações do agente causador de uma doença transmissível, contagiosa, com potencial epidêmico e pandêmico, seja um vírus ou uma bactéria.
É sabido, desde os gregos antigos, que uma doença infecciosa pode não trazer imunidade para a pessoa, daí também uma outra importância da vacinação. Basta ver o relato, feito por Tucídides, de uma epidemia que se alastrou sobre Atenas, no segundo ano da Guerra do Peloponeso. A dúvida, o questionamento, a observação, a solidariedade e a preocupação humanitária possivelmente fizeram com que, no fim do século XVIII, o médico Edward Jenner descobrisse algo plausível e demais importante: uma doença leve em vacas, "vacina", parecia-se com a varíola. Ele percebeu que as mulheres rurais, em contato constante, diário, com o vírus da “vacina”, por causa de sua profissão, não contraíam a varíola durante as epidemias. Jenner então infectou uma pessoa com a “vacina”, por meio de pequenas incisões na pele. Em seguida, tentou infectá-la com a varíola, sem sucesso. O que houve? Ela não desenvolveu a doença! Isso deu origem às vastas campanhas de vacinação contra a varíola. Depois, já no século XIX, foi Louis Pasteur quem primeiro criou uma vacina atenuada, cunhando o termo "vaccin" em homenagem a Jenner. Assim. em 1881, Pasteur enunciava o princípio da vacinação: inocular “des virus affaiblis ayant le caractère de ne jamais tuer, de donner une maladie bénigne qui préserve de la maladie mortelle”.
Portanto, nenhuma vacina até hoje foi feita de maneira estereotipada. Mesmo a vacina da tuberculose, que tinha eficácia supervariável de proteção, que variava mesmo de O a mais de 80%, foi posta para uso justamente porque o interesse maior era a proteção contra formas graves. Isto é, evitar mortes. Quanto ao tempo de feitura das vacinas, as disposições técnicas, protocolos, conhecimentos, materiais eram outros porque eram outras épocas e não se tinha sequer o aparato científico que se tem hoje para fazer as coisas andarem.
Atualmente, existem comitês de ética mundiais e revistas técnicas e científicas especializadas para validar ou não os estudos. Dizer isso não quer dizer que tais entidades, órgãos não sofram pressões políticas. As vacinas evoluem, não são estáticas. Nenhuma vacina precisa pegar todos os tipos de cepa, e nunca foi assim. Até porque pode haver imunidade cruzada ou reformulações de vacinas, com o acréscimo de novas cepas à formulação, se necessário.
A falta de conhecimento técnico-científico nessas questões pode fazer com que a paixão às ideologias, sejam partidárias ou não, impere. Infelizmente, assim como em épocas sombrias, não nos espanta o fato de gente culta defender o indefensável. Muitas vezes, tal defesa se traveste de "dúvida", "questionamento", o que poderia ser salutar, se as premissas e os argumentos não fossem sofismáticos, para apenas satisfazer ou dar condições de satisfação a uma Wille zur Macht, ou mesmo ter viés de séquito de uma religião política. Pois, de algum modo, a dúvida e o questionamento têm engendrado o mundo dito civilizado, tem posto em movimento a civilização. Não se deve confundir civilização com progresso, sabemos bem dessa questão.
Quando tiver dúvidas sobre a vacinação, lembre-se das milhares de pessoas mortas na pandemia de Covid-19 que poderiam ter sido salvas, lembre-se de quantos profissionais de saúde morreram tentando salvar vidas de pessoas infectadas. Continue usando máscaras, tendo cuidados de isolamento e higiene e... Vacine-se! A humanidade agradece. A vida agradece. A razão agradece.
Adriano Nunes
Comentários