TAXI GIRL

Crônicas

por Carlito Lima

Há quatro anos eu fazia parte do CEPRAM, Conselho Estadual de Proteção Ambiental. Nas reuniões mensais apareciam cerca de 30 a 40 processos, pedidos de licenças de vários empreendimentos para debates, análises e pareceres. A reunião só acabava bem tarde, muitas vezes com brigas e bons combates. A sociedade organizada é contemplada com alguns membros no CEPRAM, embora as vagas governamentais sejam maioria. Certa vez apareceu um projeto, edifício de apartamento, mais de 20 andares defronte à praia no litoral norte de Maceió. O projeto estava qualificado tecnicamente e legalmente, com aprovação do IMA. Não gostei do nome do empreendimento, “Paradise Beach”. Dei meu voto com restrição, estava dentro da lei, entretanto, registrei meu protesto contra o nome do prédio.
Vejo agora na majestosa Ilha de Santa Rita, um dos ecossistemas mais bonitos do Brasil, área de proteção ambiental, a maior ilha lacustre nacional, uma loja instalada à beira da Lagoa, venda de “Jet Sky”, aquele brinquedinho assassino, nome da loja, “Top Jet”. Sacanagem!
Eu moro no Edifício San Diego (Califórnia), vizinho ao Edifício Ibiza (Espanha), outros prédios da cidade têm nome em homenagem a cidades, a lugares estrangeiros, Belize, Tenerife, Lisboa, enquanto temos nomes bem mais bonitos, só nas cidades nas Alagoas: Jaramataia, Olho D’água das Flores, Belo Monte, Penedo, Santa Maria Madalena da Alagoa do Sul, entre outras. Edifícios homenageiam figuras ilustres estrangeiras, Beetowen, Pirandello, Jaques Lacan. Uma salva de palmas para um conjunto de apartamentos em construção, Praça dos Poetas, três edifícios batizados com nomes de grandes poetas alagoanos, Ledo Ivo, Jorge de Lima e Arriete Vilela.
Edifícios comerciais adoram nome inglês, escolhidos pelo “marketing” da empresa, “Ocean Tower”, “Trade Center”, “Avenue Center” (na Avenida da Paz). São tantas as babaquices que entristece. É típico de o colonizado enaltecer o colonizador, coisa parecida com a Síndrome de Estocolmo, estado psicológico em que pessoas são vítimas de sequestro, elas desenvolvem sentimentos de lealdade, obediência e puxa-saquismo para com o sequestrador, apesar da situação vexatória de violência e perigo de vida em que os bandidos colocaram a vítima.
A língua inglesa é uma necessidade para nos comunicarmos com o planeta, falar com outros países, língua universal do século XXI, entretanto por conta dos marqueteiros comerciais nos deixamos levar pelo besteirol.
Meus óculos só eram feitos na Ótica Fluminense, mudou o nome para “Flu Look”, apesar de tricolor doente, deixei a freguesia. Cortava meu cabelo perto de casa, por comodidade e pela eficiente da cabeleireira; ao perceber o nome da casa, “Deyse, Profecional Hair”, mudei. Confesso, tenho essa reação, perto da obcecação de Policarpo Quaresma e Ariano Suassuna.
Sou invocado com o nome “coffe-break”, outro dia coloquei numa programação de um seminário: “10 horas: intervalo com merenda.” um dos organizadores reclamou, queria impor o “coffe-break”, eu venci, usei a hierarquia.
Lojas em liquidação no “Shopping” (invenção de judeu americano), anunciam, “40% Off”, quer dizer desconto de 40%. Pendurado num pequeno edifício na praia do Francês alugando apartamentos, uma placa, “Apartaments for sale”.
Quando menino eu adorava confeito, fiquei alucinado quando conheci a Confeitaria Colombo no Rio, beleza de confeitaria. Hoje não existem confeitarias, trocaram o nome, “delicatessen”.
Um caso kafkaniano: a palavra latina “media”, plural de “médium” (meio), se tornou “mídia” em português porque os americanos assim pronunciam esse termo latino. Em inglês se usa corretamente no plural, e nós latinos usamos “mídia”, imitando a pronúncia americana.
Restaurante é “self service”, painéis ninguém conhece se não for “outdoor”, os que trabalham em turismo são do “trade”, entrega à domicílio é “delivery”. Numa barraca na bela praia de Barra de São Miguel está o nome brilhando, “Life Beer”, jamais tomarei uma cerveja nesse boteco.
Até as raparigas. Abrindo o jornal na coluna de serviço de acompanhantes, oferecem os serviços prestados de “escort girl” e “taxi-girl”. “Is The End”, como terminavam os bons filmes de minha juventude.

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