GONÇALVES DIAS

Crônicas

Lúcia Nobre

A obra de Gonçalves Dias teve duas fases distintas. A primeira, entre 1846 e1851, reúne textos líricos, que falam de amor e saudade – inclui os livros Primeiros cantos (1846), Leonor de Mendonça (1847), Segundos cantos e Sextilhas de Frei Antão (ambos de 1848) e Últimos cantos (1851).
A segunda, da qual fazem parte os poemas “I-Juca Pirama” e “Os Timbiras”, caracteriza a incursão do autor pelo estilo indianista, buscando uma escrita mais nacional, com termos da fala brasileira, inclusive de línguas indígenas. Inclui as obras Cantos (1857); Os Timbiras (1857) e o Dicionário da língua tupi (1858) – esta uma obra de pesquisa.
Alternando a narração em terceira e primeira pessoas, e dividindo em dez cantos, “I-Juca Pirama” narra a história de um índio tupi de mesmo nome que, após uma batalha contra os Timbiras, é aprisionado, e seu destino é a morte, para ser devorado. Antes de ser morto, é exigido que ele entoe o seu canto de morte, cantando seus feitos, sua bravura e suas aventuras, pois os timbiras acreditavam que sua coragem de guerreiro e a sua honra passariam para todos que, depois do rito de morte, comessem as partes do seu corpo.
“I-Juca-Pirama” conta sua história, fala de sua bravura, das tribos inimigas, das suas andanças, de lutas contra os aimorés, mas, pensando no pai cego e doente, velho e faminto, pedem que o deixem viver. Seu ato é interpretado como covardia, e o chefe dos timbiras ordena que o soltem.
Quando ele volta, o pai fica desapontado com sua atitude e o leva de volta à tribo dos timbiras, para cumprir seu destino com honra. O filho reage e resolve mostrar que não é covarde. Ao chegar à tribo dos timbiras, grita “Alarma! Alarma!”, seu grito de guerra, e luta bravamente, golpeando inimigos e destruindo a tribo timbira até que o chefe lhe ordena “Basta!”. A honra de herói é recuperada. Anos mais tarde, o chefe timbira conta aos jovens a história do valente inimigo.
Em tupi, I-Juca-Pirama significa “o que há de ser morto”. O texto sintetiza o indianismo de Gonçalves Dias, marcado pela concepção épico-dramática da bravura e da generosidade dos índios e pelo jogo de ritmos, alternando diferentes métricas no poema, conforme as diferentes situações narradas. Gonçalves Dias canta o índio como valente, honrado e belo. Não deixa de ser um olhar idealizado sobre o índio, moldado pela veia romântica. Ainda assim, como ocorre também com José de Alencar, se comparada a outros autores da época, é uma visão mais próxima à realidade, ligada aos seus costumes.
Já o poema “Os timbiras” é uma narração, dividida em introdução e quatro cantos. Era um projeto ambicioso: uma epopeia indianista em que os índios substituiriam os heróis gregos, numa espécie de Ilíada brasileira, com abundantes descrições da flora e da fauna nacionais.
O eixo da obra consiste na formação e dispersão do povo timbira. Nos poemas, narram-se os feitos de guerreiros timbira, principalmente do chefe Itajubá e do jovem Jatir, que, idealizados, representam o valor, a coragem e a honra. A civilização luso-brasileira, por sua vez, se apresenta como usurpadora da terra dos índios.
O falecimento de Gonçalves Dias, num naufrágio em 1864, impediu-o de concluir a obra. Trechos dela afundaram com o poeta. Ainda assim, os trechos que se fizeram conhecidos foram publicados.

Dias, Gonçalves, 1823-1864. I-Juca Pirama e os Timbiras / Gonçalves Dias. São Paulo: Escala Educacional, 2008.

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