Caminhar ouvindo Djavan, eis um prazer que descobri há pouco tempo. O leitor não imagina o quanto umas voltas matinais, sem compromisso, ao som de uma boa música pode fazer por uma pessoa. Talvez a música não lhe agrade, então pode fazer outra escolha, uma que mexa com seus sentidos, que aguce sua sensibilidade.
Por falar em sensibilidade, acho que esse foi um dos efeitos benéficos que a caminhada me trouxe. Assim, numa manhã eu compunha uma poesia, filosofava, noutra, esboçava mentalmente uma crônica enquanto fazia autoanálise e observava o mundo a minha volta. E foi num desses instantes de contemplação da natureza, ou melhor, do caos em que se torna tudo que o homem toca, que vi uma sobrevivente, uma flor silvestre em meio a um amontoado de restos de construção e principalmente areia, uma linda flor amarela. Não resisti e subi nos entulhos para registrar aquela sobrevivente, porque me enxerguei nela.
Eu, sobrevivente de um relacionamento caótico, entulhado de dores constantes, de falta de companheirismo e excesso de solidão, tal qual aquela flor perdida na areia, eu, que apesar de tudo, estava ali, caminhando, desfrutando da minha boa companhia, me deliciando com uma música, apreciando a vida na sua simplicidade, conseguindo sentir as possibilidades além da dor, da tristeza que me corroía a cada dia.
Aquela flor tão simples, tão humilde, não apenas sobrevivia, mas vivia em sua plenitude de cor e beleza, a despeito do caos a sua volta. Superou as barreiras de um solo arenoso, de um lugar insalubre pro seu crescimento e desabrochou pra vida, aprendi muito com aquela flor a olhar a vida em suas possibilidades, a superar os obstáculos a ir além do sobreviver.
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