Tonho Neguinho, ilustre morador de Senador Rui Palmeira, da época que eu morei lá. Uma figura distinta. Cheio de presepada, como em outras ocasiões tivemos oportunidade de aqui relatar. Casado com Dona Creuza. Tiveram seis filhos homens cabras machos. E Tonho fez questão de acrescentar em todos eles, parte de seu próprio nome. Ora indo, ora voltando. Explico: Se um se chama Antonio Carlos o outro Carlos Antonio; Antonio José um, o outro José Antonio e finalmente Antonio Marcos e Marcos Antonio.
Dona Creuza é dessas que a natureza não foi muito generosa no quesito beleza. Aliás, não foi nem um pouco prestimosa com essa criatura nesse item. A ponto de Tonho, ao chegar em casa, cheio da branquinha (ele sempre foi um grande apreciador do líquido precioso de Vitória de Santo Antão), muito manguaçado, pisando em rolimã, no popular “bêbo bosta”. Abre a geladeira e a única coisa que encontra é um maracujá murcho na gaveta, e berra:
-Creuza! Que peste tu tá fazendo aí dentro, tu quer morrer congelada bôbonica!
Mas, a esposa de Tonho Neguinho tinha lá suas qualidades. Tinha sim, era mulher trabalhadeira. E muito católica também, não perdia uma missa, nem santas missões, novenas, procissão então, e principalmente velório. Era ela a “puxadora” das Ladainhas, das rezas e dos cânticos nessas ocasiões. Era daquelas que as más línguas apelidavam de “coroca de igreja”. Quando soube da morte da sogra, começou cedo a ensaiar as rezas em casa:
“ Sede em meu favor Virgem Soberana
Livrai-me do inimigo com vosso valor
Egito Curador de Raquel nasceu
Pro mundo o Salvador Em pessoas três ”
E Tonho, foi providenciar os preparativos pro velório e pro funeral. A comoção era geral, a pobre da mãe de Tonho Neguinho morrera. Lamentava a vizinhança:
-Tão novinha ainda a bichinha!
-Cento e dois anos, na flor da idade!
Tonho arranjou umas três garrafas de Pitú, foi na roça e catou uns limões, uns umbus, matou uns preás. Tinha que ser um velório daqueles bem arretado. Dona Creuza deu uma geral na casa, pra receber a finada que ia chegar do hospital.
Mas faltava ainda o principal: O caixão de defunto. Tonho a única ocupação que tinha na época era de agricultor, renda nenhuma. Sem condições de comprar o envelope de madeira. Não via outro jeito, se não ir até o prefeito pedir um caixão pra enterrar sua mãezinha. Chegou à prefeitura, tinha uma ruma de matuto esperando pra falar com o gestor municipal. Pediu licença e passou na frente de todos, seu caso era mais urgente. Uma vez no gabinete da autoridade maior do município, que já sabia do acontecido, ocorreu ali o seguinte colóquio:
-Prefeito, o senhor pode liberar um caixão pra eu enterrar minha mãezinha?
-Não posso...
-Mas seu prefeito. Eu não tenho condições de comprar um!
- E eu já “estourei” o orçamento pra esse tipo de despesas! Pra esse mês não dá mais...
-Então só mês que vem?
-Isso mesmo...
-Pois então me dê um real.
-E o que peste você vai comprar com um real Tonho?
-Um quilo de sal pra salgar a véia. Mês que vem a gente enterra.
Fabio Campos 12/07/2010 É professor em S. do Ipanema – AL.
Contato: fabiosoacam@yahoo.com
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